Folha de S. Paulo
Extremistas de centro ainda são reféns da
fantasia da dupla negação
Parece ter havido um misto de surpresa e decepção em certos ambientes diante da notícia de que "a agência de classificação de risco S&P Global Ratings melhorou nesta quarta (14) a perspectiva de longo prazo do Brasil de estável para positiva", repetindo as primeiras palavras da informação publicada nesta Folha. Não é que essas pessoas sejam más e gostem de ver o país encalacrado. Nunca especulo sobre a maldade humana porque campo muito vasto. Atenho-me ao mais restrito: o dos interesses. "Então torcem para que tudo dê errado?" Não. É que previsões e antevisões, também as pessimistas, têm preço. E há, ademais, cortes que são de natureza ideológica, quase invencíveis.
Já identifiquei aqui, certa feita, um
fenômeno tão nativo como nunca foi a jabuticaba (que existe mundo afora): o
"extremismo de centro". Grupos influentes da sociedade
brasileira, especialmente na imprensa, viraram reféns de um candidato-fantasma
que apelidei, já em 2020, de "nem-nem": nem Lula nem Bolsonaro.
E a sua feição seria então, constituída por uma dupla negação. Na origem, havia
a hipótese falsa —e, pois, sem teoria possível— da "polarização". O
polo oposto da extrema-direita, representada por Bolsonaro, só poderia ser um
candidato de extrema-esquerda, o que o petista, obviamente, não era.
E há, ainda hoje, quem conteste o choque
dos extremos com outra quimera: a dos opostos combinados num valor comum.
Assim, Bolsonaro encarnaria o populismo de direita, e Lula responderia com o de
esquerda. E, enquanto isso, a razão encarnada pelos extremistas de centro, que
reivindicam o ideário de um liberalismo sem contornos muito nítidos, ficaria à
míngua, na sarjeta, lamentado, como num poema de Camões, "o desconcerto do
mundo". E isso, claro!, tem implicações intelectuais, existenciais e até
morais e éticas. Se a grande maioria se perde nos labirintos de males "que
se estreitam num abraço insano", há o risco de o bem fugir para uma
caverna, e só uma seita de iniciados teria acesso à verdade. Assim nascem os
fanáticos.
Não é, como sabem, o meu ponto de vista.
Ainda que levando algumas cotoveladas, porque economista não sou, entendi
necessária a PEC
da Transição como precondição para enterrar a era do desastre e para
dar condições mínimas de gestão ao eleito nas urnas. Com menos instrumental
teórico do que alguns expertos (com "x"), entendi que o arcabouço
fiscal, ainda em votação, era o melhor plano dentro do possível. Não raro,
as críticas mais duras ao texto partiam do princípio de que o presidente era
outro, de que os eleitores eram outros, de que o Congresso era
outro. Queriam o bom plano do país que não há. Os extremistas de centro
cultivam, às vezes, um idealismo meio rancoroso.
Não sei se a S&P "fez o L",
mas intuo que não. É claro que ela pode estar errada sobre as virtudes do
arcabouço. Mas indago com gentileza: não seria mais prudente considerar a
hipótese de que seus analistas estão menos contaminados por "afetos de
tristeza", como escreveu o filósofo, e conseguem ver a realidade sem se
deixar enlear por aquela bolha da dupla negação, em que se criou a bobagem da
falsa polarização?
Voltou a circular por esses dias um vídeo
em que Beto Sicupira, um dos grandes acionistas das Americanas,
explica à audiência, num evento de 2014, como vê o país: "O Brasil é isso
aí. Se vocês tão achando que o Brasil é um negócio que vai virar os Estados
Unidos, vocês estão no lugar errado. (...) Porque o Brasil é o país do
coitadinho, é o país do direito sem obrigação, é o país da impunidade". A
cada diatribe do bilionário, a plateia de pobres basbaques ria com satisfação,
entendendo, por óbvio, que brasileiros são os outros. Era um riso de vira-latas
— e aqui, obviamente, faço alusão a Nelson Rodrigues. O
rombo nas Americanas chega a R$ 50 bilhões. Uma tramoia contra
coitados, urdida por pilantras — quantos deixaram de cumprir suas obrigações?
—, na certeza de que sairiam impunes.
Quem sabe um olhar estrangeiro contribua
para nos proteger de nós mesmos. Ou, ao menos, das fantasias do extremismo de
centro, que lembra, muitas vezes, os lamentos de Hardy, a hiena triste, ainda
que ela estivesse a serviço da própria melancolia apenas.
3 comentários:
Oh céus!
Esse cara, o Reinaldo Azevedo, jornalista ele não é!
O que Reinaldo Azevedo faz se enquadra mais no perfil de panfleto ; só no perfil, porque para o texto dele ser panfleto político teria que fazer a defesa seletiva e ideologizada de uma ideia com fidelidade e sempre, e não é assim que ele faz. Ele não faz por ideologismo e não tem fidelidade a ideias e opiniões. Fizesse ele panfletos e seria legítimo!
Esse cara, o Reinaldo Azevedo, já foi tucano e hoje ele é lulista.
Algumas almas cuspirão:: "Não é não! Ele não foi tucano e hoje não é petista!". Não quero dividir bola, mas jornalista ele não é!
Reinaldo Azevedo mudou o rumo de seus textos no mesmo rastro de sombras que marcam o caminho de mudança dos posicionamentos do ministro Gilmar Mendes:: Gilmar era um ministro do STF antipetista. E, vendo em uma escala, Gilmar era 1° um antipetista, depois Gilmar era tucano, e só então Gilmar era ministro do STF.
E Gilmar Mendes exercia o seu antipetismo com ódio!
Nós podemos ter diferenças inconciliaveis com o PT, mas não temos nenhum direito de exercer atividade pública, como as que exercem jornalistas e membros do judiciário, empesteada de ódio contra o PT como faziam Gilmar Mendes e Reinaldo Azevedo. Se for para combater, tem que ser com ideias fundamentadas e discordâncias reais, não por ódio! Do mesmo modo, textos de apoio devem manter conexão com os fatos e a realidade, para não incorrer em "desonestidade a favor".
Depois de alguns episódios ligados à Operação Lava Jato ---uma ação judicial que teve do melhor que o judiciário pode fazer para combater corrupção em um país e depois teve do pior que o uso polítiqueiro e pessoal pode fazer de uma missão pública--- Gilmar Mendes passou, sem nenhuma explicação, de defensor intransigente da Operação e seu principal apoiador no STF, que referendava com seus reconhecidos conhecimentos constitucionais TODAS as medidas decisórias, desde as medidas principais, incluindo as medidas punitivas, até as medidas acessórias, como as firulas rituais do processo, a acusador de TUDO o que foi feito pela Lava Jato; incluindo acusar o que ele mesmo, Gilmar, antes referendou.
Houve descumprimento de ritos processuais por parte do ex-juiz Sérgio Moro na condução da Operação, mas todos os erros de ritos cometidos seriam sanáveis!
Era preciso, nos casos de punidos pela Lava Jato, como Sérgio Cabral, Lula, Eduardo Cunha, Odebrecht's, Léo Pinheiro e todos os outros, manter o rigor dos ritos e fazer as condenações com ortodoxo cumprimento das prescrições legais, mesmo dos simples ritos ; porém, era preciso mais ainda fazer justiça com o Brasil, que teve bilhões de recursos desviados, o desvio devidamente provado, uma parte desse dinheiro até devolvido e as medidas do juiz inicial reafirmadas em todas as instâncias superiores que julgam provas, o TRF e o STJ. É inadimissível que aqueles que roubaram recursos publicos estejam impunes!
Reinaldo Azevedo pode continuar escrevendo por aí, criando adjetivos (ou substantivos) como "Petralha" só por ódio do PT, como ele tinha, e agora encher laudas com arrazoados que não correspondem a apuração jornalística profissional e qualificada para adular petistas? Claro que ele pode! Tod@s podem! Mas nada dessa incoerência é jornalismo!
Jornalista, Reinaldo Azevedo não é:: nem bom nem mal jornalista. Eu sou apenas leitor. Mas leitor profissional reconhece no "cheiro da tinta" quando lê um jornalista profissional. E reconhece melhor ainda quando lê escritores de panfletos escritos por ódio ou, em outra chave, quando o escritor escreve panfletos adulatórios.
O que Reinaldo Azevedo escreve são panfletos!
Por favor:: tenho diferenças seríssimas com o PT, mas não acho que o PT remunera Reinaldo Azevedo e nem acho que o PT sequer lhe encomende panfletos; não é isso. Penso que seus panfletos, inclusive, podem continuar circulando. É da democracia essa liberdade. Mas Reinaldo Azevedo, com suas mudança inexplicavel não desperta confiança nem daqueles aos quais estiver adulando eventualmente.
Agora, especificamente neste caso da reclassificação da nota do Brasil pela agência de risco S&P, qualquer apuração jornalística séria mostra que a reclassificação se deu por mudanças estruturais na política econômica brasileira. O atual mandato de Lula nada fez de estrutural na economia até aqui. A primeira medidade estrutural na economia deste mandato de Lula será a aprovação do arcabouço fiscal que está em discussão. Os efeitos do arcabouço, quando efetivamente for implantado, só virão com o tempo e não refletem hoje nenhuma mudança estrutural pelo fato simples de o arcabouço ainda sequer existir como âncora fiscal. E, no desenho que tem, o arcabouço não acarretará nenhuma mudança que justifique reclassificação de risco da economia brasileira e nós teremos que nos fiar, nos próximos anos, mais na condução da Politica Fiscal e execução do orçamento pelos ministros Haddad e Simone que pela âncora fiscal que está encomendada.
Não é questão de ser petista ou antipetista, mas esta reclassificação de risco da agência S&P nada tem a ver com medidas tomadas pelo governo Lula, mesmo porque até agora Lula não tomou nenhuma medida na economia. Na economia, este governo Lula ainda não começou!
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