O Estado de S. Paulo
É de enorme impacto para o Brasil a postura da big tech de Mark Zuckerberg
Mark Zuckerberg, o CEO da Meta, apenas expôs
um dilema político fundamental no Brasil quando anunciou que vai encerrar o
programa de checagem de fatos. A questão colocada para a sociedade brasileira
não é apenas como regular redes sociais. É quem tem a legitimidade para isso.
O dilema brasileiro talvez fique mais nítido por meio de comparação com outro regime democrático, o da Alemanha. No qual muito antes da existência da internet já havia um dispositivo na Constituição proibindo o uso ou divulgação de símbolos nacional-socialistas.
É óbvio o contexto histórico que levou um
país que preserva os direitos fundamentais a restringir a liberdade de
expressão, mas o ponto é outro. Na Alemanha ninguém contesta a legitimidade do
Supremo alemão para impor respeito a um preceito constitucional restritivo do
ponto de vista da liberdade de opinião.
Aqui está o principal desafio que enfrenta
hoje o STF ao julgar como regular as redes sociais. Não é só o da “norma
técnica”, o de como impedir de alguma maneira a selvageria da qual todo mundo
se queixa em relação ao mundo digital.
Seria essa uma atribuição do
Legislativo, mas até aqui o Congresso
brasileiro não conseguiu avançar na elaboração de normas além do Marco Civil da
Internet, que alguns especialistas consideram insuficiente para lidar com o
impacto dos algoritmos das grandes plataformas. Em boa parte, como reflexo da
polarização política.
E, já que o Legislativo não age, o STF
decidiu agir. A peça central é estabelecer a responsabilização das redes
sociais por conteúdos que ali trafegam, mas não é assim que uma enorme parcela
da sociedade brasileira percebe a ação do Supremo.
Perigo grave para nosso sistema político, o
STF não é visto como algum tipo de “árbitro” no óbvio jogo político em torno da
regulação das redes. É considerado parte interessada nesse mesmo embate, e como
“protetor” de um lado contra o outro. Consequência não intencional de
inquéritos do fim do mundo sem data para terminar.
Não há saída fácil para a situação
escancarada agora por
Zuckerberg, um notório oportunista político
cujo único princípio é o da saúde do próprio negócio. E não se trata apenas do
fato de que o STF estará às voltas com gigantesco poder econômico aliado e
submisso ao governo da ainda maior potência do planeta.
É grave ter de afirmar isso, mas uma parte
relevante das elites brasileiras perdeu a percepção de que o STF defenderia
apenas os preceitos constitucionais, zelaria pelo rigor das leis acima dos
interesses políticos e partidários. Ao contrário.
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