sexta-feira, 21 de fevereiro de 2025

As lágrimas do coronel - Bernardo Mello Franco

O Globo

A cena veio à tona ontem, dois dias depois da denúncia contra Jair Bolsonaro e seus comparsas. Em depoimento ao Supremo, o tenente-coronel Mauro Cid se desesperou e chorou. “Parece que a imprensa não me larga. Parece que qualquer coisinha minha eles querem vazar”, lamuriou-se.

O militar reclamava da revelação, pela revista Veja, de áudio em que investia contra os investigadores e o ministro Alexandre de Moraes. “Não sou só eu que estou sofrendo com isso. É eu (sic) e toda a minha família”, queixou-se. Ele tentou reduzir seus ataques à Justiça a um “desabafo num momento ruim”. “É um desserviço que essa porcaria da imprensa faz”, protestou.

Esse não foi o único choro de Cid. Em outra sequência de imagens liberada pelo Supremo, o oficial aparece atônito, leva as mãos à cabeça e se debulha em lágrimas ao saber que seria preso novamente. Ele desmaiou em seguida, mas a gravação já havia sido encerrada.

Treinado nas Forças Especiais do Exército, o militar foi preparado para saltar de paraquedas, enfrentar terroristas e combater na selva. É espantoso que não tenha conseguido se controlar num ambiente refrigerado, onde foi tratado com respeito e contou com a presença de seu advogado.

Durante quatro anos, Cid foi a sombra de Bolsonaro. Não desgrudou do presidente nem nas motociatas da campanha à reeleição. A simbiose transformou o militar num Forrest Gump de escândalos. Ele já confessou ter participado de múltiplos crimes, incluindo o contrabando de joias, a falsificação de certificados de vacina e o complô para solapar a democracia.

Além disso tudo, Cid confidenciou que também atuou como dublê de psicólogo. Quando o capitão se sentia abalado, ele deixava a família em casa para dormir no Palácio da Alvorada.

Com tanta intimidade, o kid preto não foi capaz de prever que seria abandonado quando delatasse o chefe. “O presidente Bolsonaro ganhou Pix, aquele negócio todo”, disse. “No meu caso, não. Eu perdi tudo. Estou vendo minha carreira desabar”, choramingou.

 

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