Folha de S. Paulo
Perda de mandato de Carla Zambelli é inevitável, se não já, em
março, por faltas
Deputados aproveitam imprecisão constitucional para antagonizar
STF
Lembram de Trump
e Kim Jong-un discutindo, em 2018, quem tinha o maior "botão nuclear"?
Os dois terminaram amiguinhos, mas o embate entre eles prenunciava o estilo
hiperbólico, com toques de 5ª série, que viria a dar o tom da política nos anos
2020.
A polêmica não cassação da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) se inscreve nessa tendência, facilitada pelo oceano de imprecisões e contradições que povoam nossa Constituição cidadã.
Em maio, quando o STF condenou a
parlamentar a dez anos de cadeia, determinou também que ela perdesse o mandato.
Não era uma invencionice dos ministros. O artigo 55, inciso VI da Carta é categórico
quando estabelece que o deputado ou senador que sofrer condenação penal
definitiva perderá o mandato.
Mas o que a Constituição faz no caput, ela desfaz no parágrafo. Os
§§ 2 e 3 do art. 55 distinguem condutas e eventos que implicam perda automática
de mandato (determinados pela Mesa) dos que requerem votação em plenário, por
maioria absoluta e assegurada ampla defesa.
A condenação pela Justiça, num desafio à lógica, foi colocada na
segunda categoria e não na primeira. Um deputado pode perfeitamente alegar que
não quebrou o decoro do cargo, uma apreciação subjetiva, aberta a
interpretações, mas não que não sofreu condenação penal, o que se verifica com
uma simples consulta ao Diário de Justiça.
E mesmo isso não deveria ser um problema. O fato de Zambelli estar
presa na Itália, como estaria no Brasil, a impede de comparecer a pelo
menos um terço das sessões da Câmara, o que também leva à perda do mandato, aí
de forma automática.
O espaço possível para dúvida é se ela deveria perder o mandato já ou em março,
quando a Câmara contabiliza as faltas. A ambiguidade constitucional, porém,
permitiu aos deputados compararem seu botão nuclear com o do STF.
Vivemos um período histriônico, no qual a política não se faz mais
buscando consensos, mas na base do grito, delimitando espaços instagramáveis
que podem ser exibidos como um troféu para os membros da tribo.
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