Veloz, solerte, letal. Cometido o delito, antes mesmo de esboçar uma estratégia de defesa, os denunciados e encurralados estão aprendendo a servir-se de um recurso mais moderno do que a velha máscara da inocência: acusam a imprensa.
Consideram mais eficaz desqualificar os meios de comunicação num mundo cada vez mais dependente deles do que rebater acusações. O bode expiatório anti-midiático está sendo utilizado neste momento em diferentes quadrantes e a mesma intensidade: no Brasil o agente viral é o senador José Sarney e seu dileto advogado de defesa, o presidente Lula, ambos empenhados em minimizar o turbilhão de escândalos que envolve há cinco meses a figura do ex-presidente da República e tri-presidente da Câmara Alta.
No Irã, são os aiatolás que não reconhecem a fraude a favor do seu candidato, Mahmud Ahmadinejad e culpam a imprensa internacional pela rebelião popular que tomou conta das ruas de Teerã. Na Itália, flagrado numa bacanal, o primeiro-ministro Silvio Berlusconi acusa a mídia européia de esquerdista e conspirar para derrubá-lo.
Desgastado pelo fracasso do socialismo bolivariano, o venezuelano Hugo Chávez tenta liquidar o que restou da imprensa livre no seu país, especialmente a emissora Globovisión. E na Argentina, assustada com um possível avanço da oposição nas eleições legislativas do próximo domingo, a dupla presidencial Kirchner ameaça enviar ao Congresso o projeto de uma nova lei de audiovisual.
Os afetados pela pandemia exibem sintomas comuns – abominam a alternância no poder, só gostam da democracia quando as urnas lhes são simpáticas, só lêem jornais que os elogiam. As diferenças não são apenas geográficas. Algumas vítimas do furor anti-mídia são eles próprios barões da mídia. Caso de Berlusconi, que além de controlar os canais estatais da Itália, é dono de um poderoso conglomerado multimídia que o torna virtual senhor da opinião pública.
Quando se sentiu obrigado a defender-se publicamente, Sarney foi à tribuna do Senado para atacar “grupos econômicos e a mídia radical”. A precária acusação não faz justiça ao notório saber do político maranhense. Grupos econômicos jamais se aliariam à mídia radical. Quem o fustiga, mais encarniçado, é o Estado de S. Paulo, seguido do Globo, ambos mais conservadores do que extremados. Mesmo a Folha de S.Paulo (onde o imortal romancista publica há duas décadas suas platitudes semanais), não cabe no figurino do irredentismo.
Sarney goza de um poderoso salvo-conduto midiático: quando envergou a faixa presidencial, depois da tragédia que se abateu sobre Tancredo Neves, tentou obsessivamente acrescentar mais um ano ao seu mandato. Para isso, encarregou o ministro das Comunicações, ACM (Antônio Carlos Magalhães) de fazer uma farta distribuição de mimos aos congressistas. Assim nasceu a aberração que desqualifica tanto o Congresso como nossa mídia eletrônica ao converter quase duas centenas de parlamentares em concessionários de canais de rádio e TV. Seriam eles os radicais que o atazanam?
Dono de um conglomerado de mídia no seu estado, além de colunista da Folha, Sarney já tentou usar o jornalismo para alavancar a carreira política. Em 1962, algum radical descobriu a manobra e demitiu-o do cargo de correspondente do Jornal do Brasil em São Luiz do Maranhão.
Imperioso reconhecer que a mídia contemporânea enfrenta em diferentes esferas sérios problemas existenciais que a fragilizam e a tornam vulnerável aos surtos viróticos. A pandemia anti-midiática não grassa em ambientes arejados, pluralistas, onde o jornalismo, além de profissão é também encarado como missão. Vacina infalível para qualquer pandemia autoritária.
» Alberto Dines é jornalista
Consideram mais eficaz desqualificar os meios de comunicação num mundo cada vez mais dependente deles do que rebater acusações. O bode expiatório anti-midiático está sendo utilizado neste momento em diferentes quadrantes e a mesma intensidade: no Brasil o agente viral é o senador José Sarney e seu dileto advogado de defesa, o presidente Lula, ambos empenhados em minimizar o turbilhão de escândalos que envolve há cinco meses a figura do ex-presidente da República e tri-presidente da Câmara Alta.
No Irã, são os aiatolás que não reconhecem a fraude a favor do seu candidato, Mahmud Ahmadinejad e culpam a imprensa internacional pela rebelião popular que tomou conta das ruas de Teerã. Na Itália, flagrado numa bacanal, o primeiro-ministro Silvio Berlusconi acusa a mídia européia de esquerdista e conspirar para derrubá-lo.
Desgastado pelo fracasso do socialismo bolivariano, o venezuelano Hugo Chávez tenta liquidar o que restou da imprensa livre no seu país, especialmente a emissora Globovisión. E na Argentina, assustada com um possível avanço da oposição nas eleições legislativas do próximo domingo, a dupla presidencial Kirchner ameaça enviar ao Congresso o projeto de uma nova lei de audiovisual.
Os afetados pela pandemia exibem sintomas comuns – abominam a alternância no poder, só gostam da democracia quando as urnas lhes são simpáticas, só lêem jornais que os elogiam. As diferenças não são apenas geográficas. Algumas vítimas do furor anti-mídia são eles próprios barões da mídia. Caso de Berlusconi, que além de controlar os canais estatais da Itália, é dono de um poderoso conglomerado multimídia que o torna virtual senhor da opinião pública.
Quando se sentiu obrigado a defender-se publicamente, Sarney foi à tribuna do Senado para atacar “grupos econômicos e a mídia radical”. A precária acusação não faz justiça ao notório saber do político maranhense. Grupos econômicos jamais se aliariam à mídia radical. Quem o fustiga, mais encarniçado, é o Estado de S. Paulo, seguido do Globo, ambos mais conservadores do que extremados. Mesmo a Folha de S.Paulo (onde o imortal romancista publica há duas décadas suas platitudes semanais), não cabe no figurino do irredentismo.
Sarney goza de um poderoso salvo-conduto midiático: quando envergou a faixa presidencial, depois da tragédia que se abateu sobre Tancredo Neves, tentou obsessivamente acrescentar mais um ano ao seu mandato. Para isso, encarregou o ministro das Comunicações, ACM (Antônio Carlos Magalhães) de fazer uma farta distribuição de mimos aos congressistas. Assim nasceu a aberração que desqualifica tanto o Congresso como nossa mídia eletrônica ao converter quase duas centenas de parlamentares em concessionários de canais de rádio e TV. Seriam eles os radicais que o atazanam?
Dono de um conglomerado de mídia no seu estado, além de colunista da Folha, Sarney já tentou usar o jornalismo para alavancar a carreira política. Em 1962, algum radical descobriu a manobra e demitiu-o do cargo de correspondente do Jornal do Brasil em São Luiz do Maranhão.
Imperioso reconhecer que a mídia contemporânea enfrenta em diferentes esferas sérios problemas existenciais que a fragilizam e a tornam vulnerável aos surtos viróticos. A pandemia anti-midiática não grassa em ambientes arejados, pluralistas, onde o jornalismo, além de profissão é também encarado como missão. Vacina infalível para qualquer pandemia autoritária.
» Alberto Dines é jornalista
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