domingo, 28 de junho de 2009

Gasto público em ritmo eleitoral

Vinicius Torres Freire
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


Lula começa a dar primeiros sinais de que governo faz contas públicas pensando nos votos da eleição de 2010

NA SEMANA que passou, Lula provou uma receita de corte de gastos, oferecida por seus ministros. Mandou voltar o prato, com críticas ao cozinheiro, aos ingredientes e ao serviço. O presidente indica, assim, que o gasto do governo entrou em ritmo de eleição. Lula não pretende rever ou adiar o aumento dos servidores públicos.

Por outro lado, não gostou de ouvir que pode ser difícil cumprir a meta já reduzida de superávit primário para este ano. Prefere, pois, cortes de varejo. Porém, deve prorrogar total ou parcialmente a redução de impostos que incentivam o consumo, como os concedidos para a compra de carros, materiais de construção, eletrodomésticos de cozinha e lavanderia ("linha branca") e alguma outra isenção menor, "surpresa".

De resto, as medidas de apoio à indústria de máquinas e equipamentos devem prever um subsídio do Tesouro, que compensaria assim a redução dos juros do BNDES para a compra de bens de capital. Não está claro se haverá algum benefício fiscal para o setor. Pode ser que a TJLP ("juros do BNDES") caia.

O problema não está aí, nesses incentivos. Caso confirmados, os aumentos do funcionalismo terão pleno impacto nas contas públicas de 2010. E, em 2010, há o zunzum de que Lula "não está convencido" de que a meta de superávit primário, reduzida neste ano, deva voltar ao nível de 2008. Se for o caso, até o Fundo Soberano pode entrar na roda a fim de cobrir insuficiências na receita de impostos e evitar, assim, cortes de despesas em ano eleitoral.

No acumulado em 12 meses, o superávit primário do governo federal em abril foi o mais baixo desde 1999. A dívida pública crescerá. Em novembro de 2008, baixara a 35% do PIB, o menor nível desde 1998. Em abril, foi a 38,4% do PIB e deve ter crescido desde então. A dívida crescerá mesmo com a queda da despesa com juros, que o Banco Central estima em 0,9% do PIB em 2009 e outro tanto em 2010, dada a baixa das taxas. Isto é, o governo gasta também a economia com juros. Faz despesas de composição ainda muito ruim (muito gasto corrente, investimento ainda baixo). Quase tudo bem, pois 2009 é um ano de crise. E 2010?

O BC estima que, em dezembro de 2009, a dívida pública terá subido três pontos percentuais. Regrediria no ano seguinte ao nível de 2008, com a volta do crescimento econômico e da receita, desde que, ressalte-se, seja mantida a meta divulgada de superávit fiscal primário, que parece estar em jogo. Mas nada sabemos do PIB e da arrecadação no segundo semestre, que dirá em 2010.

A não ser que o governo enlouqueça, o que é improvável, ou em caso de nova catástrofe econômica mundial, tal aumento da dívida não deve provocar problema crítico. Mas o endividamento extra dificulta outra vez a tarefa de melhorar o prazo/perfil da despesa pública (alongar a dívida e gastar menos com juros), de reduzir mais a taxa de juros ou, quase quimera, reduzir a carga de impostos (ou melhorar a sua distribuição, via reforma tributária). Seriam tarefas mais factíveis se a dívida baixasse à casa dos 30% do PIB.

Sim, parece um assunto tão velho. Que envelhecerá ainda mais, pois aparentemente será empurrado com a barriga, ad aeternum. Ou pelo menos até 2011, quase com certeza.

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