Se Dilma Rousseff, assessorada pelo notório Marco Aurélio Garcia, entende que a ida de uma comitiva de senadores brasileiros comandada por Aécio Neves (PSDB-MG) à Venezuela foi “uma provocação”, está absolutamente certa. Foi uma provocação que alcançou plenamente o duplo objetivo de expor o caráter antidemocrático e truculento do regime chavista e a tibieza cúmplice do governo brasileiro diante dos atentados à liberdade reiteradamente cometidos por Nicolás Maduro, presidente do país “aliado” que o lulopetismo ajudou a contrabandear para dentro do Mercosul.
Esquece-se a presidente que, por fazer parte da união aduaneira regida por uma cláusula democrática, o comportamento interno do governo venezuelano afeta diretamente os superiores interesses do Brasil.
A iniciativa do grupo de parlamentares oposicionistas surgiu no momento em que as atenções da comunidade internacional se voltam para a Venezuela, onde o governo tenta controlar por meio de repressão frequentemente violenta as manifestações de protesto da oposição institucional e da população em geral contra o caos econômico decorrente do delirante “bolivarianismo” imposto ao país pelo regime chavista. A intenção anunciada pelo grupo brasileiro era exatamente a de visitar opositores venezuelanos encarcerados por razões políticas.
Dias atrás esteve em Caracas o ex-primeiro-ministro espanhol, o socialista Felipe González, cuja posição serenamente crítica ao governo de Maduro teve ampla repercussão na mídia internacional. Nos próximos dias a Venezuela deve ser visitada por uma missão oficial da União Europeia. Por outro lado, à sombra do governo petista promoveu-se a ida a Caracas, simultaneamente à visita da comissão de senadores, de um grupo de brasileiros simpatizantes do “bolivarianismo”, liderado, à falta de alguém com maior expressão política, pelo escritor Fernando Morais. Esse grupo não esbarrou em nenhum tipo de dificuldade para cumprir sua missão chapa-branca.
O constrangimento do governo brasileiro diante da falta de cerimônia com que os parceiros de Caracas sabotaram a visita dos senadores – entre eles Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado – se refletiu na nota oficial em que o Itamaraty registrou protocolarmente lamentar “os incidentes”. Não restava alternativa à Chancelaria, uma vez que o grupo de senadores viajava em missão oficial. Assim, depois de relatar todas as providências de natureza diplomática adotadas em relação ao episódio, informa a nota: “À luz das tradicionais relações de amizade entre os dois países, o governo brasileiro solicitará ao governo venezuelano, pelos canais diplomáticos, os devidos esclarecimentos sobre o ocorrido”. Mas só no dia seguinte, diante da repercussão do episódio, o Itamaraty anunciou a decisão de convocar a embaixadora venezuelana em Brasília para explicações.
Na área política, a reação dos petistas, como o líder da bancada no Senado, Humberto Costa (PT-PE), foi de criticar a “atitude provocativa” de Aécio Neves.
Esse lamentável episódio coloca mais uma vez em evidência os problemas que o governo brasileiro terá enquanto teimar em alinhar sua política externa aos interesses dos regimes ditos “bolivarianos” empenhados em impor ao Continente o “socialismo do século 21” proclamado pelo caudilho Hugo Chávez. No momento em que, por ironia, o regime cubano, referência maior para o esquerdismo latino-americano, amplia os primeiros passos para a abertura de sua economia e sua reinserção no mercado globalizado, os governos “esquerdistas” sul-americanos insistem na crescente intervenção estatal na atividade econômica, delírio sepultado sob a utopia do socialismo real.
O pragmático Lula alinhou-se à esquerda latino-americana para dar algum sentido ideológico a seu populismo. Mas praticou a economia de mercado, que lhe rendeu bons frutos. Dilma, esquerdista de rico currículo, tentou uma guinada intervencionista e se deu mal, embora talvez ainda não tenha percebido exatamente por quê. Não há de ser bajulando regimes que estão caindo de maduro que ela vai sair da UTI.
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