terça-feira, 10 de janeiro de 2017

2017 - Yoshiaki Nakano

- Valor Econômico

• O Brasil precisa ser reinventado. É prisioneiro do passado. São velhas instituições, valores e ideias que nos acorrentam

Apesar de muita relutância é inevitável que na primeira coluna do ano comentemos sobre o que virá nos próximos doze meses. É uma tarefa ingrata, sempre demandada dos economistas, que deve ser enfrentada, ainda que com elevada probabilidade de termos previsões erradas num quadro de tamanha incerteza. A teoria econômica não nos permite prever o futuro, incerto por natureza, pois as proposições científicas se referem a fatos, mesmo que estes tenham sido verificados inúmeras vezes, nada garante que se repetirão no futuro. É o velho problema da indução. Podemos atribuir probabilidades, mas nunca a certeza. Outro tipo de proposição que os economistas utilizam são dedutivas, a priori verdadeiras, pois decorrem logicamente das premissas, isto é, tautológicas. Analiticamente permitem até deduzir proposições que se referem a fatos, mas aí voltamos ao primeiro tipo de proposições.

Em 2016, o terceiro ano de recessão, deverá ter o PIB contraído em pelo menos 3,5%, e transportará estatisticamente uma redução de -0,7% para o próximo. O longo ano de 2016 ainda não se encerrou. A crise política continua a se agravar, com o andamento da Lava-Jato e ausência total de lideranças políticas com credibilidade e capazes de conduzir o país para uma situação aceitável para a maioria da população. Os três poderes não se entendem e estão em conflito ou incomodados com as ações do Ministério Público e da Polícia Federal. A própria Presidência da República atravessa uma "pinguela", e sua sustentação depende de um outro poder. Incerteza total é a expressão que resume tudo.

A situação econômica não está nada melhor. A única certeza que podemos ter é que todos perdemos a esperança de que 2017 seria o ano da recuperação. Após a recuperação da confiança, com a mudança de governo, não tivemos correspondência na economia real. Já no terceiro trimestre a confiança começou a derreter, tanto a dos empresários como a dos consumidores, e tudo indica de temos um fato novo inusitado, um novo ciclo de contração da produção e aumento de desemprego, em função de novo ajuste de estoques, uma nova recessão dentro de uma recessão. O único sinal positivo vem do setor agrícola, que com a ajuda da meteorologia deverá expandir 4,2% em 2017.

As medidas de reforma econômica propostas pelo governo terão efeitos a longo prazo. Os efeitos, se forem realmente aplicados, terão resultados perceptíveis e palpáveis dentro de três ou quatro anos. E até lá, "no longo prazo estaremos todos mortos", como dizia Keynes.

A situação fiscal, particularmente o crescimento da dívida pública, deverá deteriorar-se nos próximos anos. Lembremos que foi ela que desencadeou a crise de confiança.

As medidas de estímulo econômico tomadas no final do ano poderão atenuar a crise, mas ninguém acredita que poderá promover a reversão do quadro com recuperação. São pífias e baseiam-se numa crença errada: acreditam que estamos simplesmente numa recessão cíclica, numa economia com tendência de crescimento de longo prazo. Assim, basta um empurrãozinho que a economia volta para sua trajetória de crescimento. Nada mais longe da realidade. Não há tendência de crescimento na economia brasileira, ela perdeu o dinamismo, está sem rumo, sem estratégia, sem planejamento de longo prazo.

A indústria, que vem sendo destruída há mais de dez anos, não só perdeu participação no PIB, mas tornou-se inviável num país que o custo médio do capital investido é três vezes maior do que o retorno sobre o mesmo, como mostra o estudo da Cemec, utilizando dados de balanços da empresas não-financeiras. Que setor ou setores poderão promover um novo surto de desenvolvimento, sem mudar radicalmente a política de juros, a política cambial, a tributação excessiva e outras reformas para reduzir o "custo Brasil"? A agricultura liderou o crescimento nas últimas décadas, dada a sua competitividade, mas sem uma política adequada para articulá-la com a indústria e o resto da economia, ampliando a geração de maior valor agregado domesticamente, promovemos uma regressão na estrutura produtiva do país.

O Brasil precisa ser reinventado. Hoje ele é prisioneiro do passado. São velhas instituições, valores, cultura, e ideias que nos acorrentam. Sem a chamada "destruição criadora", que Schumpeter desenvolveu, não vamos para lugar nenhum. É uma nau encalhada, enferrujando, enquanto o mundo avança. Torço para que eu esteja errado e alguém ou algum fato novo me convença do contrário.
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Yoshiaki Nakano, com mestrado e doutorado na Cornell University, é professor e diretor da Escola de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/EESP)

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