Instrumento-chave no combate à corrupção, o acordo de ‘contribuição premiada’ tem levantado dúvidas sobre critérios na sua aplicação pelo MP
O trabalho da força-tarefa baseada em Curitiba, constituída em março de 2014 pelo Ministério Público e Polícia Federal, atuando de forma articulada junto ao juiz Sérgio Moro, completa três anos como talvez a mais ampla e importante investigação sobre corrupção em andamento no mundo.
Comparada à Mãos Limpas, operação semelhante lançada na Itália no início dos anos 1990, a Lava-Jato tem conseguido superar a fonte inspiradora, porque, até agora, consegue, apoiada pela sociedade, resistir às tentativas de sabotagem das investigações armadas no Congresso, algo que não ocorreu na Itália. Lá, o Parlamento esvaziou as Mãos Limpas, por meio de leis sob medida para garantir a impunidade dos políticos.
A força-tarefa ostenta resultados alvissareiros: 120 condenações em primeira instância, a grande maioria confirmada pela segunda, o Tribunal de Justiça de Porto Alegre; penas lavradas que somam 1.257 anos de prisão; bens bloqueados no valor de R$ 3,2 bilhões; repatriação de R$ 756,9 milhões etc.
O principal eixo da Lava-Jato são os 79 acordos de delação premiada, assinados até dezembro, dos quais saem as informações que têm ajudado a desbaratar a quadrilha do petrolão — montada pelo PT, PMDB e PP, principalmente —, para nomear pessoas-chave na diretoria da Petrobras, a fim de drenar bilhões dos cofres da empresa por meio do superfaturamento de contratos da estatal com empreiteiras, com finalidades múltiplas — como campanhas eleitorais e benefícios privados.
Passados três anos, a Lava-Jato recebe os merecidos elogios e apoio, mas também não está imune a críticas. Um aspecto que costuma levantar dúvidas é a redução de penas dos autores das delações. Por exemplo, os critérios usados para fixar a pena de Marcelo Odebrecht, preso em regime fechado, em Curitiba, desde junho do ano passado. Ele permanecerá assim até dezembro e, depois, para completar ao todo dez anos, ficará em prisão semiaberta e domiciliar, usufruindo todo o conforto doméstico.
Há quem não entenda por que este tratamento ao mais proeminente empreiteiro do cartel que atuou na Petrobras e em outras estatais, além de montar esquemas semelhantes de corrupção em uma dúzia de países.
A “colaboração premiada” foi instituída pela lei 12.850, de agosto de 2013, que trata de organizações criminosas — sancionada, por ironia, pela presidente Dilma. Ela confere ao MP a responsabilidade de propor os acordos de delação ao juiz, cabendo a este a homologação formal dos depoimentos — se foram prestados livremente etc. Há, na lei, vários critérios para o juiz aceitar a proposta de atenuação de penas: a recuperação do dinheiro desviado, a revelação da estrutura hierárquica da quadrilha, a gravidade e repercussão social dos crimes, entre outros.
A aplicação desses parâmetros também será testada com o ex-governador Sérgio Cabral, caso ele concorde com a “colaboração premiada". Afinal, as investigações têm feito muitas descobertas sem ajuda do ex-governador. À medida que o tempo passa, ele tende a não ter muito com o que colaborar. E pela sensata lógica da lei, o direito ao abatimento de penas também diminui. Discussões desse tipo ajudam a aperfeiçoar a aplicação desse eficaz sistema de delação.
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