sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

Claudia Safatle: "Cumprimos nosso trabalho", diz Ilan


 

- Valor Econômico

Sempre haverá quem ache que o Copom errou na calibragem

O Banco Central encerra 2017 com dois recordes: a menor taxa de juros Selic da série histórica, de 7% ao ano, e a menor inflação do período do regime de metas, com IPCA de 2,8%, segundo projeção do BC usando premissas do mercado, abaixo do piso da meta de 3%. A economia, em recuperação, cresce 1%, o dobro do 0,5% antes estimado para este ano.

Há, no mercado e no próprio governo, quem aponte que o início da gestão de Ilan Goldfajn à frente do BC foi titubeante e o primeiro movimento de corte dos juros - de 0,25 ponto percentual ocorrido em outubro do ano passado - foi tardio, tímido e atrasou a retomada da economia em um quadro de grave recessão. A expectativa de inflação, acima de 7%, estava desancorada da meta de 4,5% e pouco antes da posse da nova diretoria do BC, em junho de 2016, discutia-se no mercado a conveniência de se usar do expediente da meta ajustada. Houve, ainda, economistas de bancos que se assustaram com a posterior ousadia do BC, de cortar os juros em 100 pontos-base por quatro movimentos seguidos, entre as reuniões de abril e setembro. Uma sequência de reduções dessa magnitude só é recomendável em circunstâncias excepcionais, segundo os estudiosos do regime de metas para a inflação.

Sobre a calibragem da política monetária, porém, é raro um consenso. Sempre há quem ache que o Copom foi duro demais ou muito suave.

Diferentemente de quando os juros caíram para 7,25% ao ano, durante a gestão de Dilma Rousseff, e que em seguida tiveram que subir para até 14,25% ao ano, desta vez o mercado vê o corte da Selic como sustentável. Não há pressão inflacionária à vista que demande reação do BC. O que há é uma expectativa de que os preços dos alimentos, que tiveram contração de 5,7% neste exercício, voltem a subir, devolvendo parte da queda. A projeção de inflação para 2018 é de 4,2%.

O mercado, porém, pode estar subestimando o tamanho das incertezas que atormentam a economia no próximo ano, a começar das tensões eleitorais que eventualmente surgirão com o leque de candidatos e o descompromisso com a urgência do ajuste fiscal.

Sob críticas intensas, o comando do BC definiu, em 2016, uma estratégia -- reafirmou a meta e dispensou a opção da meta ajustada. E só começou a cortar a Selic em outubro, dando prioridade à ancoragem das expectativas.

"A atuação do BC foi magistral", disse Eduardo Loyo, ex-diretor da instituição, em entrevista à "Folha de S. Paulo" esta semana. "Tiveram personalidade e perseveraram no caminho", completou o economista, que se incluiu entre os críticos da sequência de cortes de 100 pontos na Selic.

Por trás do receio de baixar rápido demais os juros estava o risco de o Copom ter que antecipar uma trajetória de alta bem às vésperas das eleições de 2018, criando um ruído desnecessário. Não se contava, alí, com o tamanho da surpresa do choque positivo dos alimentos que reduziu o IPCA em 2 pontos percentuais.

Ilan explicou a atuação do Copom diante do choque que derrubou o IPCA: "Ao invés de tentar inflacionar os demais preços para recolocar a inflação na meta, seguindo os bons princípios da política monetária deixamos o impacto primário do choque ocorrer. E reagimos no impacto secundário, reduzindo a taxa de juros de 14,25% ao ano para menos da metade, 7% ao ano, o mínimo histórico". Ele concluiu: " Acho que cumprimos nosso trabalho".

De certa forma, inflacionar a economia foi o que fez o então ministro da Fazenda, Guido Mantega, em 2007, quando o Conselho Monetário Nacional reuniu-se, em junho, para fixar a meta de inflação de 2009. O IPCA, que vinha de 3,14% em 2006 -- abaixo, portanto, da meta de 4,5% - era projetado pelo mercado em 3,6% para 2007 e 3,99% para 2008. Contra a posição do BC, que defendeu a redução da meta para 4% na ocasião, o CMN a fixou em 4,5% para 2009.

Com isso ele inflacionou o IPCA de 2007 e 2008, quando a inflação foi, respectivamente, de 4,46% e 5,90%

O relatório de inflação, divulgado ontem pelo BC, confirma que há riscos inflacionários nas duas direções. Ou seja, a inflação tanto pode ficar abaixo dos 4,2% estimados para 2018 quanto pode ficar acima. No primeiro caso, ela estaria ainda sob efeito da queda dos preços dos alimentos. No segundo, a frustração das reformas pode aumentar os prêmios de risco e elevar a inflação no horizonte relevante para a política monetária. Esse risco se agravaria no caso de reversão do cenário externo hoje bastante favorável às economias emergentes.

Embora o Copom atribua pesos iguais para as duas possibilidades, é útil fazer algumas ponderações. A inflação ficar mais baixa em 2018 é um risco para o "bem", como disse o presidente do BC em entrevista ao Valor, publicada na edição de ontem. Já uma frustração na aprovação da reforma da Previdência, turbulências nos mercados com alta volatilidade nos preços dos ativos financeiros, como decorrência da campanha eleitoral, e um ajuste mais rápido nos juros americanos são previsões muito prováveis de acontecer. Portanto, não são riscos simétricos. São riscos mais inflacionários do que desinflacionários.

Outra questão importante para a discussão é sobre o custo -em perda de PIB e de empregos -do conservadorismo inicial do Copom na administração da taxa de juros. Segundo dados divulgados pelo Ministério da Fazenda, a política monetária do BC teria subtraído 0,8% do crescimento deste ano. Por outro lado, há o argumento de que, ao optar por trabalhar na ancoragem das expectativas de inflação à meta, o BC teria obtido uma desinflação praticamente gratuita em termos de perda de produto interno. Uma evidência dessa segunda hipótese é que as projeções de crescimento melhoraram de 0,5% para 1% entre o início e o fim deste ano.

O desempenho do Banco Central deve ser avaliado pelo resultado da gestão desta diretoria, que vai até 2018. Ilan vai ter que escrever a primeira carta aberta ao ministro da Fazenda para explicar porque a inflação ficou abaixo do piso, de 3%. Até agora, porém, o BC mais acertou do que errou.

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