sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

'Fator Lula' vai definir o 2º turno

Por Raymundo Costa | Valor Econômico

BRASÍLIA - Há uma vaga em disputa para o segundo turno da eleição de 2018. Os tambores das pesquisas anunciam que a outra praticamente já tem dono: Luiz Inácio Lula da Silva. Restaria, portanto, uma vaga, cenário ideal para que mais candidatos possam arriscar a sorte - cairia o percentual necessário para chegar à rodada final. Um quadro parecido com o de 1989, quando Lula passou com 16,6% dos votos válidos. O PT traçou um plano de protelações judiciais para levar Lula até o horário eleitoral (em 31 agosto) e, no limite, elegê-lo sub judice. Um Plano B - um candidato apoiado por Lula - será acionado se o ex-presidente for impugnado antes de 17 de setembro.

Eleição de 2018 poderá ser "com Lula e sem Lula"
Há uma vaga em disputa no segundo turno da eleição presidencial de 2018. Os tambores das pesquisas anunciam que uma delas praticamente já tem dono: Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente mais popular da história do Brasil, pelo menos desde a redemocratização. Restaria, portanto, uma vaga em jogo. Mas o vento que sopra a favor do PT pode mudar de direção, se a candidatura do ex-presidente for impugnada pela Justiça Eleitoral antes da eleição, o que não é improvável, uma vez que o Judiciário acelerou a tramitação dos processos a que Lula responde na primeira instância.

Lula é o divisor de águas da eleição de 2018. Se a candidatura do ex-presidente for efetivamente impugnada, as duas vagas no segundo turno estarão em disputa. A eleição ganha ainda mais em incerteza e imprevisibilidade, pois a ausência de Lula deixará uma legião de eleitores sem referência imediata. É que o PT pretende levar Lula ao menos até o horário eleitoral gratuito, em setembro. Está pronta a moldura de um terceiro cenário, a eleição "com e sem Lula", ou seja, uma campanha feita por Lula para um outro nome assumir às vésperas da eleição, mas com a benção do ex-presidente. O PT não vai abrir mão de ter candidato.

Segundo o Datafolha, Lula tem hoje algo em torno dos 35% das intenções de voto. Mas seus eleitores ainda não decidiram pra onde correr, caso ele seja tirado da disputa. Neste caso, o contingente de votos brancos, nulos e de quem não sabe em quem votar sobe de 16% para 31%. No espectro político mais à esquerda, a ex-senadora Marina Silva (Rede Sustentabilidade) é quem mais ganha com a saída do ex-presidente - 6 pontos. Antítese de Lula da Silva, o ex-capitão e deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) ganha quatro pontos, o que só ressalta o caráter populista das duas candidaturas.


O crescimento de Lula nas pesquisas indica que o PT pode ter acertado ao se recusar a um Plano B à primeira dificuldade. Ao menos assim pensa a cúpula petista, que pretende a partir de agora dobrar a aposta, nas duas frentes: política e jurídica.

Politicamente a adoção de um Plano B significava o enfraquecimento de Lula. O PT passaria por um estresse que poderia ampliar a divisão interna, pois à saída do ex-presidente se seguiria a discussão sobre o novo candidato. Deveria ser alguém do PT ou de um partido aliado, como Ciro Gomes (PDT)? Com um agravante: outro nome do PT ou aliado poderia até defender o que Lula hoje prega nas ruas, mas sem a vantagem da popularidade, sem carisma e sem o legado do ex-presidente.

Se àquela altura, para a direção do PT, não fazia nenhum sentido cogitar uma eleição sem Lula, muito menos hoje, quando vislumbram a chance tê-lo como candidato quase até o fim da campanha. Os advogados do ex-presidente acham que o caso do triplex do Guarujá, o primeiro a ser julgado em segunda instância, é baseado somente em delação premiada. E a turma do TRF 4 que julgará Lula tem recusado condenações sustentadas apenas na palavra de delator. Ninguém ao redor de Lula guarda expectativa de absolvição. Pelo sim, pelo não, a ordem é manter a mobilização para que o ex-presidente, no mínimo, chegue ao eleitoral, e - no limite - dispute o primeiro turno sub-judice, amparado numa liminar judicial. Há precedentes.

Na eleição de 2016, mais de 100 prefeitos concorreram com liminar parecida, muito dos quais foram eleitos. Eles foram diplomados e conseguiram tomar posse. Tudo com medida jurídica, uma atrás da outra.
São duas as frentes jurídicas. Uma trata da questão penal; a outra, das medidas eleitorais. À primeira vista, a antecipação do julgamento do recurso de Lula para o dia 24 de janeiro, um período de férias, próximo ao Carnaval e quatro dias depois do recesso do Judiciário, além de dificultar a mobilização do PT e dos movimentos sociais, teria como objetivo despachar Lula o quanto antes. Mas há algo mais no ponto de vista do partido: o Supremo Tribunal Federal (STF) pode mudar, a qualquer momento, a orientação sobre a prisão após a condenação em segunda instância. O movimento de Porto Alegre, onde fica a sede do TRF 4, Seria uma espécie de pressão da segunda instância sobre o STF para que este entendimento não seja modificado.

O próprio juiz Sérgio Moro, autor da primeira condenação de Lula pela Justiça Federal de Curitiba, pediu para o presidente Michel Temer usar sua influência junto ao STF para que a orientação seja mantida. É provável que tenha sido uma ironia, de qualquer forma, uma interpelação inapropriada. Os dirigentes petistas não acreditam que Lula venha a ser preso, mas cautela e caldo de galinha não fazem mal a ninguém.

A estratégia petista foi traçada no último fim de semana. Até o julgamento do dia 24, serão criados "comitês em defesa da democracia e do direito de Lula ser candidato", uma reedição dos comitês para assegurar a posse de Juscelino Kubitschek, em 1956. À época, apesar da oposição feroz, JK conseguiu ser candidato e tomar posse, em meio a ameaças de golpe militar. O paralelo não é mera coincidência. Para o PT, tem gente que não gosta e não vota em Lula, mas acha que ele tem o direito de ser candidato, assim como acontecia com JK. Poderia ser um "Comitê Lula Presidente", mas ideia do comitê em defesa da democracia e do direito de Lula ser candidato é mais ampla.

Ao mesmo tempo, o PT e os partidos e movimentos alinhados serão convocados a realizar atos públicos em todo o país, mesmo nas menores praças. Um teste ocorreu na terça-feira 19, em Porto Alegre, com a realização de uma aula pública. O partido fará adesivos e cartilhas para dar argumento às pessoas. A Frente Brasil Popular planeja começar grandes manifestações nas capitais no domingo que antecede o dia do julgamento, em 24 de janeiro.

A estratégia jurídica depende do resultado do julgamento. Se a decisão pela condenação de Lula for unânime, ou seja, 3 X 0, a situação fica mais complicada, mas tem como ser contornada com recursos primeiro em Porto Alegre, em seguida no Superior Tribunal de Justiça, até o STF. Se a decisão não for unânime ou os juízes condenarem a penas diferentes, o PT entra com os chamados embargos infringentes. Vencida esta etapa, ainda na área do TRF-4, o partido pode apresentar os embargos de declaração. É protelação, admite-se, mas não importa, são os instrumentos jurídicos à disposição da defesa. O advogado tem o dever de levar às últimas consequências a defesa do cliente.

No STJ os advogados de Lula vão pedir que a decisão da segunda instância seja modificada, sob a alegação de falta de amplo direito à defesa. Também vão alegar que a segunda instância não quis ouvir testemunhas e a acusação teria feito uso de documentação imprópria,. Dependendo da decisão, há a possibilidade de recursos dentro do próprio STJ. Tudo perdido, o PT vai ao Supremo e calcula que o processo todo vá até o fim de maio, início de junho. As convenções para a escolha do candidato a presidente devem ocorrer entre 20 de julho e 5 de agosto. Até lá, a preocupação do PT será impedir a prisão de Lula, se o STF então já não houver mudado a regra segundo a qual a condenação em segunda instância basta para a prisão.

Se tudo ocorrer de acordo com o planejado, em julho-agosto o PT referenda Lula como candidato a presidente e registra seu nome no tribunal Superior Eleitoral (TSE). Só então - antes disso Lula não será candidato - o Ministério Público Eleitoral, algum candidato ou partido pode pedir a impugnação, sob o argumento de que o ex-presidente é ficha suja. O pulo do gato: há um artigo na lei eleitoral que permitirá ao PT propor uma liminar para que a candidatura seja mantida até que a impugnação seja julgada em definitivo. A Justiça, em geral, tem concedido esse tipo de liminar com a justificativa de que, se a ação de impugnação for mais tarde negada, não tem conserto.

O PT calcula que seguindo esse rito, sem nenhum atropelo, é possível levar Lula até o horário eleitoral gratuito, que vai de 31 de agosto a 4 de outubro. O objetivo é chegar ao fim do primeiro turno na frente. Como o TSE retiraria da disputa o líder da eleição? O risco é Lula vencer a disputa antes do julgamento do tribunal. O Brasil teria um presidente sub-judice. Mas o julgamento pode ser acelerado, o que é mais provável, e abater Lula em pleno horário eleitoral. O PT então vai para o Plano B. Isso tem que ser feito até 17 de setembro, 20 dias antes da eleição.

A decisão de manter Lula candidato, nesse roteiro, resolveu muitos problemas no PT, porque havia insegurança. Mas com Lula fora da disputa, mesmo depois de uma esgrima pública de meses, coloca o partido diante do dilema de escolher quem vai substituí-lo. Os nomes mais cotados são o do ex-ministro Jaques Wagner, que tem 2% nas pesquisas, e o do ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, que tem 4%. É certo que ambos têm chance de crescer com o apoio de Lula, mas nada comparável ao desempenho que o ex-presidente tem demonstrado. A opção para o PT pode ser uma aliança com o PDT de Ciro Gomes que o ajude a fazer uma bancada expressiva na Câmara dos Deputados. Não é provável, mas é o que tem à mão.

Esta seria a eleição do "com e sem Lula", capaz de embaralhar os planos dos partidos que esperam pela saída do páreo do petista para arriscar nas urnas. A ausência do nome de Lula da cédula eleitoral, por outro lado, não aponta para um cenário eleitoral mais tranquilo. Na verdade, deve acentuar as incertezas da eleição, pois aumenta a oferta de vagas no segundo turno e deve aumentar a concorrência. Até o presidente Michel Temer pode sonhar com a reeleição. Com mais candidatos em campo, menor o percentual exigido à passagem para a segunda rodada. Nas eleições de 1989, quando praticamente todas as tendências apresentaram candidatos, Lula passou para com 16,6% dos votos.

Com Lula, pelo que hoje indicam as pesquisas, uma das vagas está virtualmente bloqueada - o ex-presidente não apenas cresceu como também ampliou sua vantagem. Sem Lula, o céu é o limite. O apresentador Luciano Huck, por exemplo, desistiu de ser candidato. No entanto, bastou a Justiça Federal sinalizar que vai acelerar a tramitação dos processos de Lula para que seus correligionários voltassem a falar na sua candidatura. Quem convive com o prefeito João Doria (PSDB) afirma que ele definitivamente afastou a hipótese de concorrer ao Palácio do Planalto, mas seu nome volta com força à cogitação dos partidos. O senador José Serra, duas vezes candidatos pelo PSDB (2002 e 2010), tem recall e nunca desistiu do intento de disputar novamente a Presidência.

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