- O Globo
Tendo o ministro Marco Aurélio Mello aceitado o pedido de adiamento feito pelos novos advogados do Partido Ecológico Nacional (PEN), a questão da prisão em segunda instância provavelmente voltará à estaca zero.
Mesmo que a ação não possa ser sustada, a liminar pode, e, ao pedir esclarecimentos ao seu impetrante, o ministro Marco Aurélio demonstra que está preocupado em conhecer as razões do partido que, ao desistir da liminar, criou um fato novo neste processo.
O ministro, mesmo claramente empenhado em rever a decisão de permitir a prisão em segunda instância, está agindo com total imparcialidade ao lidar com essa questão excepcional. Quer se informar melhor para tomar a decisão de levar ou não à mesa a liminar que pede a suspensão de todas as prisões após condenação em segunda instância, até que as Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) sejam votadas.
As manobras dos advogados originais do PEN, capitaneados por Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, não surtiram efeito, pois a segunda liminar, em nome de um instituto de advogados que era parceiro na ação original, não foi admitida pelo ministro Marco Aurélio, em mais uma demonstração de que age rigorosamente dentro da lei, sem beneficiar nenhum dos lados.
Do jeito que as coisas vão, fica muito difícil votar uma liminar cujo impetrante nega ter tido a intenção de fazê-lo, mesmo que legalmente a ação seja indisponível, quer dizer, tenha que prosseguir ativa. A vontade do impetrante principal de retirar o pedido fere a credibilidade da liminar e enfraquece seu poder de convencimento dos ministros, inclusive o próprio Marco Aurélio, que não tem nada a ver com a confusão montada pelo Partido Ecológico Nacional (PEN), mas provavelmente sente-se constrangido pela situação criada.
O Supremo Tribunal Federal (STF), que já estava em situação delicada ao ser instado a tratar do mesmo tema que, seis dias antes, decidira em favor da manutenção da jurisprudência atual negando o habeas corpus a Lula, ficará mais constrangido ainda caso mantenha a análise de uma liminar rejeitada pelo próprio impetrante, sejam quais razões forem para que tenha mudado de posição.
Deu-se nesse caso um estranho desentendimento entre o advogado original e o impetrante, um a favor da mudança da jurisprudência em qualquer situação, acusado de favorecer Lula, o outro querendo suspender a discussão do tema por não desejar que interpretem seu ato como um benefício ao ex-presidente.
Pior ainda: os novos advogados do PEN agora anunciam que o partido está a favor da prisão em segunda instância, e renega a própria ADC impetrada. A base do pedido de liminar que está na berlinda é uma suposta nova maioria que já estaria formada no plenário do STF, pela anunciada mudança de posição do ministro Gilmar Mendes, que em 2016 votou pela prisão em segunda instância e declara-se já há algum tempo disposto a adotar a tese do ministro Dias Toffoli de que a prisão possa ser decretada após decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A procuradora-geral, Raquel Dodge, defendeu junto ao Supremo que não seja feita nenhuma mudança na jurisprudência, muito menos baseada em uma presunção que pode não ser confirmada. Ao mesmo tempo, na esteira da ministra Rosa Weber, parece haver um movimento no Supremo para manter a jurisprudência atual por mais tempo.
Para se ter uma ideia, quando ela foi mudada em 2009, a composição do plenário havia sido alterada radicalmente, com a nomeação de oito novos ministros entre 2002 a 2006. Mesmo assim, somente em 2009 é que o assunto foi tratado em plenário, mudando o entendimento que vigorava há muitos anos.
Agora, a única alteração que aconteceu na composição do plenário desde 2016, quando a jurisprudência voltou a permitir a prisão em segunda instância, foi a substituição por morte de Teori Zavascki pelo ministro Alexandre de Moraes, que manteve a posição a favor da prisão em segunda instância.
Depreende-se do voto da ministra Rosa Weber que, se na opinião dela e de muitos juristas, a mudança de composição não justifica a mudança de jurisprudência, muito menos uma alteração de voto anunciada por um ministro.
Correção - O eventual fim da possibilidade de prisão em segunda instância não atinge os réus que estão em prisão preventiva.
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