Por Cristian Klein e Rodrigo Carro | Valor Econômico
RIO - No dia seguinte à pesquisa Datafolha que mostrou queda das intenções de voto em sua candidatura presidencial, Marina Silva (Rede) foi contundente nas críticas. Disse, por exemplo, que o atentado contra Jair Bolsonaro desmoralizou a proposta do candidato do PSL de liberar a posse de armas. "É uma demonstração concreta de que distribuir armas para a população não funciona. A proposta do Bolsonaro não foi desmoralizada por um discurso. Foi desmoralizada pelos fatos", disse ela, usando um tom pouco habitual, durante a primeira sabatina com presidenciáveis organizada por "O Globo", Valor e "Época", no Rio.
Quanto à proposta de Ciro Gomes (PDT) de "limpar o nome" dos inadimplentes, afirmou que não fará "nenhum tipo de promessa para depois os outros pagarem". Marina foi sabatinada poucas horas antes da confirmação de Fernando Haddad como candidato do PT. Para ela, o partido estava escondendo o candidato para evitar que ele tivesse que dar explicações sobre corrupção nos governos petistas.
Queda nas pesquisas faz Marina subir o tom
Num tom acima do usual, no dia seguinte à pesquisa Datafolha que confirmou a queda de intenções de voto para a eleição ao Planalto, a ex-senadora Marina Silva (Rede) participou ontem da primeira sabatina com presidenciáveis organizada por "O Globo", Valor e "Época", no Rio. Marina foi contundente com os adversários.
Sobre o atentado contra Jair Bolsonaro (PSL), a ex-senadora disse que a facada levada pelo concorrente, durante ato de campanha em Juiz de Fora (MG), na quinta-feira, desmoralizou a proposta do deputado de liberar o porte de armas. Marina lembrou que Bolsonaro estava sob a proteção de "vários policiais federais armados", de policiais militares, de seguranças particulares, e isso não evitou a agressão. "É uma demonstração concreta de que distribuir armas para a população não funciona. Inclusive não funcionou para proteger a ele mesmo. A proposta do Bolsonaro não foi desmoralizada por um discurso. Foi desmoralizada por um ato", afirmou. Em entrevista depois da sabatina, a candidata disse que ficou "estarrecida" ao ver o parlamentar, "depois de ter passado uma situação dramática, "quase perder a sua vida", fazendo um gesto de tiro de dentro da UTI do hospital Albert Einstein, em São Paulo.
Marina foi sabatinada poucas horas antes da confirmação da substituição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad como cabeça de chapa da coligação do PT ao Planalto. Disse que o partido estava escondendo o seu candidato, para evitar que Haddad tivesse que dar explicações sobre escândalos de corrupção nos governos petistas. Afirmou que não tem relação de ódio com Haddad, mas que agora ele "vai ter que vir para a disputa". Quanto à proposta de Ciro Gomes (PDT) de limpar o nome dos brasileiros do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC), Marina disse que não fará "nenhum tipo de promessa para depois os outros pagarem". Ao sair da sabatina, afirmou que vai "debater propostas que sei que terão factibilidade", e que dependam das ações de seu eventual governo, e não de terceiros. "É uma proposta com nível de complexidade muito alto", disse.
Na pesquisa Datafolha divulgada na segunda-feira, Marina - que antes estava em segundo lugar, fora da margem de erro - apareceu com 11%, numericamente atrás de Ciro Gomes (13%), e à frente do tucano Geraldo Alckmin (10%) e de Haddad (9%), todos embolados, atrás do líder Bolsonaro, com 24%. Sua queda em relação à pesquisa anterior foi de cinco pontos percentuais. Em levantamento divulgado ontem à noite, o Ibope apontou a mesma situação de um quádruplo empate técnico.
A ex-ministra do Meio Ambiente foi à sabatina acompanhada do deputado federal e correligionário Miro Teixeira, que concorre ao Senado, do presidente do Flamengo, Eduardo Bandeira de Mello, candidato a deputado federal, e da ex-vereadora e coordenadora da campanha Andrea Gouvêa Vieira. Para a equipe, o declínio de Marina nas pesquisas tem uma explicação: a falta de estrutura partidária.
Líder de uma sigla pequena, Marina firmou aliança com o PV, também diminuto, na undécima hora do registro de candidatura, e tem enfrentado dificuldade para levar e reforçar seu nome pelo país. Falta-lhe a capilaridade de uma ampla coligação com candidatos a deputado federal e estadual, a senador e governador. "O que aconteceu é que a campanha partidária entrou na rua. Os candidatos têm os seus partidos. O Ciro, por exemplo, tem muitos acordos com os governadores nos Estados. Pode não ter obtido na aliança nacional, mas teve na estadual. Isso falta para a gente. Isso a gente sente, claramente, que quando chegou na rua está fazendo a diferença", afirmou a coordenadora de campanha.
Na sabatina, Marina citou propostas para a área de educação que atendem demandas de mães por creche e ensino de qualidade para os filhos, quando instada a comentar a perda de apoio no eleitorado feminino apontada pelo Datafolha.
A ex-senadora repetiu a máxima de candidatos em desvantagem ao dizer que "pesquisa é um retrato do momento". Questionada a descrever este momento, Marina disse que é "o momento em que o eleitor vai olhar para as propostas do candidato e procurar ter uma interação mais direta com ele". "Eu, infelizmente, não consigo ter essa interação porque só tenho 21 segundos de propaganda de TV. Mas vou andar cada vez mais nas regiões do meu país, dialogando com as pessoas", afirmou, depois da sabatina.
Marina foi a primeira entrevistada. A sabatina receberá ainda Ciro Gomes, hoje, e Geraldo Alckmin, amanhã. Convidado, Haddad ainda não havia confirmado presença até o fechamento desta edição.
Seguem os principais temas tratados pela presidenciável na sabatina:
Falta de alianças
Marina Silva negou que sua candidatura não seja competitiva por falta de aliados - a única legenda que faz parte de sua coligação é o Partido Verde (PV). Na sabatina, argumentou que, para além das estruturas partidárias, confia na escolha dos eleitores: "Vou continuar apostando na postura do brasileiro, que quer mudança, não é que não seja competitivo, é a única esperança de mudar o Brasil", disse. A Rede tentou sem sucesso fechar uma série de alianças que não se concretizaram, com PPS e PSB, por exemplo. "Infelizmente hoje, no Brasil, essa questão de ser competitiva tem muito a ver com as estruturas, o dinheiro, a possibilidade de ter marqueteiro e não com a intenção de voto", reconheceu.
Queda na pesquisa
A candidata minimizou o resultado da pesquisa divulgada na segunda-feira pelo Instituto Datafolha, que apontou queda nas intenções de voto em Marina Silva de 16% para 11%. Nas duas vezes em que abordou o tema, durante e após a sabatina, ela argumentou que a pesquisa é uma "fotografia do momento."
Perda do voto feminino
Propostas na área de educação são a melhor forma de manter e atrair os votos do eleitorado feminino, na visão de Marina. A diminuição das intenções de voto da presidenciável entre as mulheres aparece na pesquisa divulgada pelo Datafolha na segunda-feira. "Há milhares de crianças que estão fora da escola. É preciso criar educação de tempo integral, que tenhamos cobertura de creche, que 50% das crianças possam ser alcançadas. Gastamos 6% do PIB [Produto Interno Bruto] com educação. O problema não é de dinheiro mas de gestão, corrupção. Vamos implementar o Plano Nacional de Educação, a Base Comum Curricular, o plano de carreira para os professores", propôs.
Apoio ao impeachment
"Na política, temos que nos orientar por princípios e valores, e a gente paga o preço [por isso]", afirmou a candidata da Rede ao ser questionada sobre seu apoio ao impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) lhe tira votos. A ex-senadora, no entanto, disse que não se orienta pela "métrica eleitoral". "Apoiei o impeachment por convicção, houve crime de responsabilidade", justificou. Mais importante do que o impeachment, teria sido cassar a chapa Dilma/Temer, o que não aconteceu por decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), esclareceu.
Lula e corrupção
Ministra do Meio Ambiente no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Marina considera o ex-presidente um político corrupto. Lula está detido em Curitiba pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. "Sim, ele está sendo punido por crimes de corrupção", disse a candidata da Rede durante a sabatina.
Autonomia do Banco Central
A candidata ao Planalto negou que sua proposta de autonomia para o Banco Central, nas eleições deste ano, seja contraditória com a do programa de governo de 2014, quando assumiu a candidatura do PSB depois da morte de Eduardo Campos, em acidente aéreo durante a campanha. Marina contou que se opôs à proposta de Campos, mas afirmou que a ideia já constava do programa de governo. "Não tem contradição, só resgatei a minha proposta de 2010, de autonomia operacional do Banco Central, sem precisar institucionalizar na lei, como foi na Argentina", justificou.
Drogas e aborto
Para Marina, a visão do Congresso Nacional não deve prevalecer sobre a da população em questões polêmicas como a descriminalização das drogas e a liberação do aborto. Embora seja contrária a ambas as mudanças, Marina ressaltou que essas questões devem ser decididas por meio de plebiscitos e não através de votações no Congresso. "Quinhentos deputados não podem substituir 200 milhões de brasileiros", argumentou a candidata, frisando que não caberia a ela convocar os plebiscitos.
Atentado a Bolsonaro
"Do ponto de vista político, o Bolsonaro tem uma visão de segurança da qual eu discordo radicalmente. Distribuir armas para a população não funciona. Inclusive não funcionou para proteger ele mesmo. A proposta do Bolsonaro não foi desmoralizada por um discurso. Foi desmoralizada por um ato", sustentou ela. "Bolsonaro estava com vários policiais federais armados. Ele estava com PMs. Ele tinha segurança pessoal, um contingente enorme e isso não o protegeu de uma faca na mão de uma pessoa que se aproximou dele."
Segurança
Em relação ao combate à criminalidade, Marina defendeu o uso da força contra o tráfico de drogas, as milícias e o crime organizado. "Muitas vezes as pessoas querem que aqueles que defendem direitos humanos digam que não haverá força nenhuma. Deve haver força, sim, para combater o crime organizado, o tráfico de drogas, as milícias. Mas isso não pode ser feito em prejuízo da vida de inocentes", ressalvou ela, destacando a importância da implementação de políticas sociais para dar suporte a uma política de segurança pública. "Só polícia por polícia não resolve", acrescentou. "[Vamos] investir em empreendedorismo comunitário, com crédito, microcrédito e assistência técnica"
Desconcentração bancária e SPC
Associada aos banqueiros pelos adversários na campanha de 2014, Marina se mostrou favorável à desconcentração do sistema bancário no país. "Vamos precisar conter juros, e para haver juros baixos, é preciso melhorar a oferta de crédito. Não podemos ter monopólio de quatro, cinco bancos, que tomaram conta do sistema", esclareceu, defendendo ainda o cadastro positivo. Questionada sobre a proposta de Ciro Gomes (PDT) de limpar o nome dos devedores incluídos no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC), ela tergiversou: "Cada candidato apresenta suas propostas, eu tenho que zelar pelas minhas. Não vou fazer nenhum tipo de promessa para depois os outros pagarem."
Blindagem de Haddad
Na visão de Marina, a estratégia do PT foi a de esconder seu candidato à presidência da República. "O PT seguiu sua estratégia de blindar ao máximo seu candidato, para não explicar escândalos de corrupção, a Lava-Jato, que inviabilizou a candidatura de Lula. Agora não tem mais como esticar a corda, tanto pela decisão da Justiça [de impugnar a candidatura Lula] quanto para tentar fazer essa transferência [de votos]", opinou a ex-senadora.
Fraude eleitoral
A eleição presidencial de 2014, cujo segundo turno foi disputado por PT e PSDB, foi qualificada como "fraude eleitoral" pela candidata da Rede. "Tivemos, sim, aí, uma fraude eleitoral. PT e PSDB utilizaram dinheiro de caixa 2", disse. "Vamos criminalizar o caixa 2."
Déficit público
Marina citou o "fim das desonerações sem critério", a Reforma da Previdência e o término da "farra do Refis" como pontos necessários para diminuir o déficit público do governo federal. Na avaliação dela, é preciso terminar com "desonerações sem critério" e com os exageros nos parcelamentos oferecidos por meio do Programa de Recuperação Fiscal (Refis). A candidata defendeu ainda uma Reforma da Previdência "com o fim dos privilégios."
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