quarta-feira, 18 de março de 2020

Bernardo Mello Franco - O presidente isolado

- O Globo

Na cadeira destinada ao governo, sentou-se o ministro Luiz Mandetta. Bolsonaro sempre afrontou as instituições e a dignidade do cargo. Agora também se tornou uma ameaça à saúde pública, ao sabotar os esforços contra o coronavírus

Ao ignorar as normas de quarentena e sair do palácio para se juntar a uma manifestação golpista, Jair Bolsonaro tentou dar uma demonstração de força política. Na prática, mostrou-se um presidente cada vez mais débil e isolado.

O capitão sempre afrontou as instituições, a democracia e a dignidade do cargo. Agora também se tornou uma ameaça à saúde pública, ao sabotar os esforços para conter a epidemia do coronavírus. Além de deseducar a população, sua atitude expôs os próprios seguidores ao risco de contágio.

Ontem Bolsonaro mostrou duas vezes que continua alheio à gravidade da crise. De manhã, chamou as precauções com a doença de “histeria” e informou que pretende dar uma “festinha” no fim de semana. À tarde, comparou a epidemia a uma gravidez e disse que suas vítimas idosas teriam morrido se pegassem “outra gripe qualquer”.

Na segunda-feira, o ministro Paulo Guedes fez uma declaração parecida ao tratar os mortos na China como uma estatística insignificante. “Dizem que morreram só cinco mil pessoas”, afirmou.

Apesar do isolamento crescente, o presidente ainda exibe armas para acuar as cúpulas do Legislativo e do Judiciário. A forte presença de militares no governo e a ligação do clã presidencial com estratos inferiores das polícias têm servido como fatores de intimidação.

Bolsonaro comete crimes de responsabilidade todos os dias, mas líderes partidários entendem que ainda não há condições práticas para iniciar um processo de impeachment. Entre outras razões, porque a crise do coronavírus esvaziou o Congresso e inviabilizou manifestações de rua.

Diante do impasse, os Poderes buscam outras soluções para que o país não fique refém da paralisia presidencial. A reunião que juntou os presidentes da Câmara, do Senado e do Supremo para discutir a pandemia forneceu um retrato oficial desse esforço. O presidente não foi convidado para o encontro. Na cadeira destinada ao chefe do governo, sentou-se o ministro Luiz Henrique Mandetta.

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