O Globo
Não é aceitável que manifestações contra a
posse do presidente eleito continuem sendo permitidas
Georges Clemenceau, jornalista, médico e
político, primeiro-ministro da França na Primeira Guerra Mundial, definiu:
— A guerra! É uma coisa séria demais para
ser deixada por conta dos militares.
Talvez esteja na frase desse grande
estadista a explicação para que um Ministério da Defesa deva ser ocupado por um
civil, sem que isso signifique menosprezo aos militares.
O ex-ministro da Defesa Raul Jungmann
definiu como imperativo para o país, como nação soberana, “levar a sério nossa
defesa e as Forças Armadas, assumir as responsabilidades que cabem ao poder
político e às nossas elites”. O Livro Branco da Defesa Nacional de tempos em
tempos é enviado ao Congresso justamente para que os representantes do povo
aprovem as diretrizes de segurança nacional, prioridades do setor e relação do
país com o mundo, numa demonstração de que o poder civil é que determina os
objetivos do setor.
Quando participou em Brasília da 15ª Conferência de Ministros da Defesa das Américas, em julho deste ano, o secretário de Defesa dos Estados Unidos, Lloyd Austin, incluiu como a afirmação do papel dos militares numa sociedade democrática “o respeito às autoridades civis, aos processos democráticos e aos direitos humanos”. Para ele, é necessário que as Forças Armadas e as de segurança “estejam preparadas, capacitadas e sob firme controle civil”.
Os militares, como organização, estão
lenientes com as manifestações antidemocráticas e, quando não agem, a inação é
entendida como autorização para que aconteçam. Bem fizeram os tribunais de
contas do país, por meio de sua associação, em repudiar declarações do ministro
do Tribunal de Contas da União (TCU) Augusto Nardes, que, mesmo em privado,
disseminava informações golpistas. Diante da repercussão, ele desmentiu que
apoiasse ato golpista, mas o estrago estava feito.
Nunca é demais lembrar o que aconteceu nos
Estados Unidos quando, ao contestar o resultado das eleições presidenciais de
2020, o então presidente Donald Trump incentivou a invasão do Capitólio em
Washington. Por isso será investigado por um promotor independente. Durante o
período em que tentou anular a eleição de Joe Biden, acusando as eleições de
ter sido fraudadas, Trump, ainda presidente, viu-se às voltas com as Forças
Armadas, que atuaram na contenção dessa tentativa de golpe.
A principal autoridade militar dos EUA, o
chefe do Estado-Maior Conjunto, general Mark Milley, tão preocupado estava com
que Trump e seus aliados tentassem um golpe que se uniu a outras autoridades
civis com o objetivo de detê-lo. Ao contrário do que acontece entre nós, com o
Ministério da Defesa tentando de forma patética alimentar a descrença nas urnas
eletrônicas, e os comandantes das Três Armas soltando uma nota oficial dúbia, o
comandante americano fez um comunicado oficial colocando de prontidão as Forças
Armadas para defender a democracia.
Revelações de reportagens e livros mostram
que Milley e outros integrantes do Estado-Maior tomaram a decisão de renunciar
para não cumprir ordens que considerassem “ilegais, perigosas ou imprudentes”.
Segundo relatos, Milley conversou com autoridades e políticos e garantiu que
Trump e seus aliados não conseguiriam fazer nada sem os militares:
— Eles podem tentar, mas não vão conseguir.
(…) Não dá para fazer isso sem a CIA e o FBI. Nós somos os caras com as armas.
Ele acreditava que Trump fomentava uma
agitação com o intuito de invocar a Lei de Insurreição e convocar os militares.
A estratégia de Bolsonaro parece ter sido a mesma. Só não deu certo porque as
instituições civis, não as militares, reagiram. Após a insurreição de 6 de
janeiro, Milley fez teleconferências diárias com Mark Meadows, chefe de
gabinete de Trump, e com o então secretário de Estado, Mike Pompeo, assim como
com a presidente da Câmara, Nancy Pelosi.
Quando Trump demitiu o secretário de Defesa
Mark Esper em novembro, Pelosi foi um dos vários congressistas que ligaram para
o general Milley.
— Estamos todos confiando em você — disse.
Lembre-se de seu juramento.
Pelosi disse ao general que estava
preocupada com a possibilidade de Trump, que ela considerava louco, usar armas
nucleares durante seus últimos dias no cargo. Ele a tranquilizou:
—Seguiremos apenas ordens legais. Só faremos
coisas que sejam legais, éticas e morais.
Não é o que se vê aqui até agora. O
presidente eleito está montando seu governo e dentro de 40 dias tomará posse no
Palácio do Planalto. É aceitável que manifestações contra sua posse continuem
sendo permitidas?
2 comentários:
Claro que não.
E olha que lá o Trump era um 'louco varrido'...
E que aqui temos um 'louco enxotado, podre (que erisipela que nada: podridão pura!), e desvairado'!
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