quinta-feira, 15 de junho de 2023

J. B. Pontes* - Centrão entrava Governo Lula

Na eleição de 2022, o povo brasileiro elegeu o candidato Luiz Inácio Lula da Silva para presidente do Brasil. É de se presumir que os eleitores optaram por eleger Lula pelo programa de governo que ele apresentou e se comprometeu a realizar, bem como pela insatisfação com o ex-presidente Jair Bolsonaro.

Mas, de forma contraditória, o povo elegeu simultaneamente um parlamento   majoritariamente de oposição ao governo Lula. Não restam dúvidas que isso ocorreu por força da avalanche de dinheiro público colocado por Bolsonaro nas mãos de seus apoiadores, com a finalidade de angariar apoios políticos e comprar votos para garantir a sua reeleição.

Especialmente na Região Nordeste, sabedores da grande rejeição dos eleitores pelo ex-presidente Bolsonaro, os candidatos dos partidos do Centrão adotaram a estratégia de deixar os eleitores livres para votar, para presidente, no candidato de suas preferências. Raramente algum candidato dos partidos do Centrão fez campanha para Bolsonaro, no primeiro turno das eleições. E os que fizeram acabaram derrotados. Ao contrário, no segundo turno, já eleitos, todos eles mudaram de postura e passaram a se emprenhar pela reeleição de Bolsonaro, mediante um forte assédio eleitoral e de compra de votos. Apesar disso, só poucos eleitores aceitaram mudar o voto para presidente.

Isto explica o fato de a diferença entre Lula e Bolsonaro ter sido reduzida de 5,23% dos votos, no primeiro turno, para apenas 1,73%, no segundo. Em termos de quantidade de votos, a diferença entre estes candidatos diminuiu de 6,2 milhões, no primeiro turno, para 2,1 milhões, no segundo.

Apesar da pequena diferença de votos, a eleição do presidente Lula pode ser considerada um verdadeiro milagre diante de todos os recursos públicos que foram indevidamente empenhados na reeleição do ex-presidente Bolsonaro, de todos os “pacotes de bondade” por ele criados na reta final das eleições e do uso indiscriminado e irregular da máquina do Estado, colocada para trabalhar pela sua reeleição. Acrescente-se, ainda, o apoio de grande parte do empresariado, especialmente do agronegócio, para quem o ex-presidente Bolsonaro de fato governou.

Por isso, não tem fundamento o uso dessa pequena diferença de votos pró Lula como argumento para que se tente manter o retrocesso que foi o desgoverno Bolsonaro e dificultar as reformas renovadoras propostas pelo atual governo. Sem a possibilidade do uso indevido de todos esses recursos públicos, estima-se que os que o continuam apoiando não passam dos vinte por cento.

No final da presidência de Bolsonaro, a dívida pública do Brasil alcançou o valor mais alto da história do País: R$ 5,870 trilhões. Mas esta não foi a pior herança deixada por Bolsonaro. Sem dúvida a pior delas foi este Congresso Nacional desqualificado e composto majoritariamente por verdadeiros crápulas, sugadores contumazes dos recursos públicos que, como previsível, estão criando e irão criar muito mais problemas para que o presidente Lula realize o seu programa de governo.

E o Centrão, comandado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, é insaciável. Os seus integrantes só entendem a linguagem do toma-lá-dá-cá. Não se satisfizeram com o enorme valor a eles destinado por meio das emendas individuais e de bancadas, de execução obrigatória. As individuais alcançaram, no exercício de 2023, o valor astronômico de R$ 32 milhões para cada deputado e de R$ 59 milhões para cada senador. No exercício anterior de 2022, essas emendas individuais foram de R$ 17,6 milhões para cada parlamentar, que já era um valor elevado, Este enorme aumento das emendas individuais ocorreu por força de decisão do Supremo Tribunal Federal que declarou a inconstitucionalidade das emendas de Relator-Geral RP9, denominadas acertadamente de “orçamento secreto”. Como havia sido alocado no orçamento de 2023 o valor de R$ 19,4 bilhões por essas emendas, o Centrão, para não perder o controle sobre esses recursos, de imediato resolveu transferir a metade deles para as emendas individuais. A outra metade foi alocada nos orçamentos de Órgãos do Poder Executivo, cuja aplicação será controlada pelo Centrão. Ou seja, mudou-se tudo, para que tudo continuasse como antes. Uma vergonha!

E na ponta, nos municípios, os escândalos de corrupção e malversação dos recursos públicos vão continuar vindos a público. Basta que os órgãos de fiscalização, agora exercendo a sua missão com maior liberdade, atuem. O exemplo mais recente é o escândalo da corrupção das compras fraudadas dos kits robótica, envolvendo recursos das emendas do presidente da Câmara, Arthur Lira, atual comandante da tropa do Centrão. E o escândalo dos kits robótica parece ser só a ponta de um iceberg que está vindo à tona. E não é de gelo, mas sim de muita lama. Esperamos que Lira tenha, no mais curto prazo possível, para o bem do País, o mesmo destino do grande líder anterior Eduardo Cunha: a cadeia.

Arthur Lira e outros líderes do Centrão ainda têm o cinismo de vir a público afirmar que falta ao Governo Lula articulação política, quando todos sabem que “articulação política” para eles significa mais liberação de emendas e de nomeações de apadrinhados para exercerem o comando de órgãos e entidades do Poder Executivo, notadamente daqueles com grandes orçamentos.

A verdade é que a maioria dos atuais parlamentares só se empenha pelo controle de fatias cada vez maiores do orçamento público, desvirtuando o papel do Parlamento de legislador e fiscalizador das ações do Governo.

Desconhecem as principais atribuições do Poder Legislativo – legislar, controlar e fiscalizar as ações do Poder Executivo - e se fixam naquela que seria secundária - a alocação de recursos públicos para a realização das políticas públicas, programas e projetos, de acordo com o Plano de Governo do presidente eleito. Para essa missão tão relevante – fiscalização e controle das ações governamentais -, a Constituição Federal concedeu até mesmo um órgão auxiliar do Parlamento - o Tribunal de Contas da União.

Mas o Centrão quer muito mais: almeja participar da execução dos orçamentos, por meio de apadrinhados colocados em postos chaves da Administração Pública, papel atribuído pela Constituição Federal ao Poder Executivo.

Arthur Lira assume, cada vez mais, ares de primeiro ministro. Mas se esquece que o sistema ainda é presidencialista e que ele não foi eleito para presidente, mas para compor o parlamento. Nas recentes votações, no comando do Centrão, em desrespeito à vontade da maioria do povo brasileiro que optou pelo programa proposto pelo presidente Lula, Lira e sua tropa vem impondo a este sérios retrocessos. Querem que o presidente Lula seja impedido de governar de acordo com o plano de governo sufragado pelo povo e continue com aquele do ex-presidente derrotado.

*Geólogo, advogado e escritor

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