O Globo
Continuo achando que o banheiro de uso
individual pode ser usado tanto por homens quanto por mulheres
Volta e meia, o tema do banheiro unissex vem
à tona. Na campanha, os adversários atribuíram a Lula a intenção de implantá-lo
no Brasil. Ele reagiu dizendo que era pai e avô e não faria essa loucura. Mesmo
ele, para se defender, comprou a ideia do banheiro unissex com as tintas
pavorosas que a extrema direita a pintou.
Na verdade, o tema interessa a políticos que
usam perucas para falar de transgêneros porque é uma forma clássica de assustar
e aglutinar pelo medo. Imaginem suas filhas em banheiros frequentados por
homens…
Quando se vê essa discussão pelo mundo, sobretudo no governo Obama e em Nova York, a ideia de utilizar banheiros para homens e mulheres era exclusivamente em espaços para uso individual. Se pensarmos bem, é isso que acontece em quase todas as famílias. Os banheiros são usados por uma pessoa de cada vez, que tranca a porta enquanto faz uso.
A universalização desse modelo, em lugares
públicos, talvez não seja um tema importante no Brasil. O adequado mesmo é
constatar que temos cerca de 5 milhões de pessoas sem banheiro no país. Isso é
uma prioridade. Essas pessoas estão completamente fora da conversa sobre
banheiros unissex: o que querem e precisam é apenas um banheiro.
Vejo uma dificuldade em banheiros unissex
para uso individual no Brasil. Minha experiência pelos postos de gasolina e
outros lugares públicos por onde cotidianamente trabalho no país é que os
homens às vezes são descuidados e têm má pontaria.
Soube por meio de um amigo que voltou dos
Estados Unidos que o aeroporto de Los Angeles encontrou uma solução
satisfatória. Há três tipos de banheiros: homens, mulheres e um terceiro com o
cartaz “gender”. Esse banheiro serve para todos os que não se identificam com
os dois outros e ficam constrangidos em usá-los. Acho que esse tipo de saída
rapidamente se expandirá no mundo, sobretudo em aeroportos internacionais,
espaços cosmopolitas.
Não tenho experiência direta de como os
passageiros a encaram em Los Angeles. Creio que muitas pessoas que às vezes
deixam de fazer suas necessidades físicas por constrangimento ganham uma
alternativa. E não há chance de a extrema direita fantasiar sobre crimes
sexuais em banheiros. Na verdade, esse grupo político fantasia sobre crimes
sexuais em banheiros para escapar da terrível realidade de que a maioria dos
crimes sexuais acontece no seio da família, precisamente a entidade que querem
santificar.
Continuo achando que o banheiro de uso
individual pode ser usado tanto por homens quanto por mulheres. Aliás, já tinha
visto em alguns lugares da Suécia ainda no fim do século passado. O único
problema é este: os homens precisam ser educados, e só uma poderosa estrutura
de limpeza poderia viabilizar a ideia.
Mas completando: tudo isso é supérfluo diante
dos milhares sem banheiro e também de nosso cotidiano nas estradas do interior,
por onde viajamos dezenas de quilômetros sem achar nada. Não se trata da
banheiros unissex, mas sim de banheiros compartilhados com os mais variados
insetos. Outro dia, encontrei uma enorme aranha numa estrada perto de São José
do Xingu.
Mas quem pensará nos sem banheiro e água
potável, mesmo no desconforto das estradas secundárias e até das grandes
metrópoles brasileiras, tão precárias em oferecer instalações dignas para os
transeuntes necessitados?
Há muitas dimensões do problema, soluções
para todas elas; mas, infelizmente, muitos se recusam a buscá-las porque, de um
lado, querem manter cativas as pessoas que amedrontam e, de outro, gostam de
cultivar seus fantasmas.
2 comentários:
Muito boas reflexões do colunista!
A maioria dos bares é assim,lavabo unissex,e ninguém reclama.
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