Folha de S. Paulo
No país que não lê, deputados lançam livros
que silenciam sobre seus problemas na Justiça
Pesquisa da
Câmara Brasileira do Livro aponta que apenas 16% da população
consome livros, e o principal motivo para motivar a compra é o preço. Na classe
com maior poder aquisitivo, há quase um desprezo pela leitura: 66% não
compraram nenhum livro nos últimos 12 meses. Mesmo assim, dois deputados, entre
os mais influentes e midiáticos do país, resolveram publicar brochuras
culturais neste fim de ano.
Nikolas
Ferreira lançou "O Cristão e a Política: Descubra Como
Vencer a Guerra Cultural". O autor, de acordo com a resenha de
Anna Virginia Balloussier, investe contra o feminismo, o movimento
LGBT e as universidades: "Sobra também para Paulo Freire, Karl Marx,
Antonio Gramsci e a Escola de Frankfurt". Obrigado, mas eu passo.
Com enfado, li "Janonismo Cultural: O Uso das Redes Sociais e a Batalha Pela Democracia no Brasil". Ao longo de 172 páginas, André Janones faz de tudo para se colocar num pedestal de herói da pátria. Um herói dos tempos atuais: "Afinal, sei como as redes funcionam". Só faltou dizer que, se não fosse pelo seu desempenho digital, Lula teria fracassado nas eleições de 2022.
Nikolas
Ferreira foi condenado por transfobia, mas parece pouco se importar
ou fazer disso uma estratégia de exposição política. O Conselho de
Ética da Câmara instaurou processo de cassação contra André Janones,
suspeito de ter promovido um esquema de rachadinha em seu gabinete. Ele também
é investigado no âmbito do STF.
O maior interessado na punição de Janones é o
PL, partido de Bolsonaro e do filho 01, ligados a escândalos de peculato que se
arrastam na Justiça. Um levantamento do jornal O Globo mostra que, dos 52
políticos, de esquerda ou de direita, investigados por rachadinha nos últimos
cinco anos, só dois foram condenados criminalmente.
Eis bons temas para futuras obras dos
literatos Nikolas e Janones: masculinidade frágil e desvio de verbas.
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