Folha de S. Paulo
A divisão da sociedade que marcou as eleições
continua a mesma
Ao se aproximar a virada do ano, com o rastro
de novos tempos, o otimismo se torna galopante e supera o pessimismo. Sete em
cada dez brasileiros esperam um 2024 melhor que 2023, segundo o Datafolha. Ao
tomar conhecimento da pesquisa, na hora me veio à cabeça a frase de Carlos
Heitor Cony, um pessimista da linha Machado de Assis: "O otimista é
basicamente um sujeito mal-informado".
Mas os panglossianos têm certa razão. Há sinais de que as coisas podem ou estão melhorando. Na área da saúde, 2023 termina com notícia surpreendentemente boa: a reversão da tendência de queda na vacinação. Oito imunizantes recomendados para o calendário infantil apresentaram aumento nas coberturas. Viva o Zé Gotinha!
Na política não se pode dizer o mesmo. A
divisão da sociedade que marcou as eleições continua imutável. Um livro
recém-lançado —"Biografia do Abismo", de Felipe Nunes e Thomas
Traumann— revela o tamanho de nosso buraco civilizatório. São amizades
desfeitas, relações familiares cortadas, cancelamentos nas redes, boicotes a
artistas, a filmes e até a chocolates e perus de Natal. O espírito das festas
passa longe.
O Datafolha mostrou que nove em cada dez
eleitores afirmam não se arrepender do voto no segundo turno. O índice daqueles
que se declaram petistas convictos é de 30%, enquanto os bolsonaristas da mesma
extração são 25%. Apesar da tentativa do governo de reconstruir o cenário
político e dos escândalos envolvendo o ex-presidente, o país está empacado na
discórdia.
Entre tapas e celulares, o Congresso faz o
quer para pilhar mais e mais dinheiro. A relação de Lula com Arthur Lira é
frágil. Para não dizer que é, por forças das circunstâncias, subserviente.
Aprovou a reforma tributária, mas levou um cascudo com a derrubada do veto ao
marco temporal das terras indígenas. De novo, o STF será chamado a entrar em
cena e, de novo, será atacado. Um moto-contínuo.
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