sexta-feira, 7 de junho de 2024

Eliane Cantanhêde - Do escaninho de Arthur Lira

O Estado de S. Paulo

O interesse em derrubar as delações premiadas, antes do PT, hoje é do PL

Os extremos não apenas se atraem como, muitas vezes, têm interesses e métodos comuns. É o que ocorre agora entre PT de Lula e PL e aliados de Bolsonaro, adversários ferozes que atuaram firmemente contra a Lava Jato, tentaram juntos a cassação do mandato do senador Sérgio Moro, ex-juiz e ex-ministro, e, neste exato momento, invertem posições numa empreitada muito estranha, que pode ter um efeito devastador: o veto a delações premiadas de presos.

Do nada, o presidente da Câmara, Arthur Lira, reúne o conselho de líderes e a Câmara tira da gaveta e põe em votação a urgência para um antigo projeto acabando com as delações, de autoria do petista, advogado e sindicalista Wadih Damous, que nem deputado é mais. A quem interessa?

Em 2016, no auge da Lava Jato, o grande alvo das delações eram Lula, o PT e aliados, metidos até o último fio de cabelo nos desvios bilionários da Petrobras. Hoje, com a Lava Jato agonizando, os beneficiários estão na outra ponta: Bolsonaro, em primeiro lugar de uma fila de generais, coronéis, majores, políticos, hackers e empresários.

Direto ao ponto: a delação mais demolidora atualmente é a do tenente-coronel Mauro Cid, pivô de todas as confusões da era Bolsonaro, ou melhor, do próprio Bolsonaro. Ele contou muito do que viu, ouviu e fez na tentativa de golpe de Estado, na busca de joias das Arábias, na venda de joias no exterior, na falsificação de atestados de vacinas e da atuação do então governo na pandemia de covid.

Está também em jogo a delação do assassino confesso Ronnie Lessa, fundamental para as investigações sobre a morte de Marielle Franco e Anderson Gomes e, portanto, contra os irmãos Brazão, Domingos e Chiquinho, presos como mandantes. Chiquinho é deputado.

STF, PF e Senado foram pegos de surpresa. Uns avaliam que o projeto de Damous é capaz, sim, de derrubar delações já homologadas, como as de Cid e Lessa. Outros dizem o oposto: que delação é meio de obtenção de prova, ou seja, matéria processual penal, e não há retroatividade na obtenção de provas.

No mundo político, inverteu-se o jogo. Em 2016, quem tinha interesse em derrubar delações eram PT e Lula. Agora, quem tem tudo para defender o projeto petista contra delações são PL e aliados de Bolsonaro.

Quando era o PT, ministros do STF consideravam “tortura” manter suspeitos presos como forma de forçar delações. E agora? O mundo dá voltas e a política dá voltas é na cabeça da gente. E Lira com isso? Ele tem um escaninho em que guarda torpedos, que vai disparando, ora contra o governo, ora contra o Senado, ora contra adversários. Nesse caso, contra Lula e o PT?

 

2 comentários:

Daniel disse...

Muito bom! O coronel Lira quer continuar mandando no seu latifúndio eleitoral, manejando a sua boiada de terneiros mamadores das tetas públicas.

ADEMAR AMANCIO disse...

A direita piorou o que já era ruim.