Folha de S. Paulo
Decisão unânime de manter a Selic pode ser o
começo de uma contraofensiva contra o tumulto
A direção do Banco Central tomou
a tal decisão
unânime de manter a Selic em 10,5%. Se baixasse a taxa básica
de juros ou
votasse dividida, teria puxado o pino de uma granada amarrada na testa, que
explodiria nesta quinta-feira e por semanas a seguir.
As supostas alas "campista" e
"lulista" querem acalmar o tumulto. Se assim não for, o próximo
presidente do BC, a ser nomeado pelo presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, vai assumir o cargo com uma situação ingovernável.
Fazendo o arroz com feijão ora inevitável, BC e governo podem organizar uma contraofensiva. Se o supremo senhor do dinheiro, o BC dos EUA, também ajudar, talvez até dê para talhar a Selic neste ano.
No momento, o mais importante é induzir uma baixa de taxas de juros mais longas no mercado e tirar o dólar do patamar de combustível para a inflação.
É mais importante do que baixar logo a Selic
na marra de murros em ponta de faca. Sim, deste modo também o governo vai pagar
juros menores aos rentistas. Não vai ser fácil.
O BC apresenta duas estimativas de inflação
no comunicado em que anuncia sua decisão sobre a Selic. Numa delas, estima que
o IPCA baixará a 3,1% em 2025, na meta de 3%, na prática.
Porém, os modelos do BC cospem esse número
quase na meta apenas se a Selic ficar nos atuais 10,5% a perder de vista, até
fins do ano que vem, tudo mais constante.
Caso a estimativa se baseie em uma Selic em
10,5% no final deste ano e de 9,5% no final de 2025 (projeções atuais de
"o mercado"), o IPCA desce a 3,4% no ano que vem.
Nas projeções da reunião do BC de janeiro,
com Selic a 9% no final deste ano e 8,5% no final de 2025, a inflação baixaria
a 3,2% no ano que vem, praticamente na meta.
É fácil perceber como o cenário piorou.
A leitora pode não gostar dessa conversa, mas
é com tais números na cabeça que a direção do BC vai mastigar esse osso duro de
roer. Qualquer direção do BC, por convicção ou mero pragmatismo, deve agir
assim nos próximos meses.
Como?
Primeiro, mantendo a Selic nas alturas, sem
previsão de corte.
Segundo, com melhoras a respeito de contas do
governo, expectativas de inflação, dólar e juros na praça.
Para citar o comunicado do BC: "O Comitê
reafirma que uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade
da dívida contribui para a ancoragem das expectativas de inflação e para a
redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente
impactando a política monetária".
É também óbvio que não pode haver piora no
entorno. Isto é, deve haver perspectiva de queda das taxas de juros nos EUA;
não pode haver sinal de que o ritmo da atividade econômica (PIB, emprego) no
Brasil afete preços; preços de energia têm de ficar comportados.
É o de sempre. Lula 3 deve apresentar novo
plano de contenção de déficit ("política fiscal crível"). O BC vai
ter de fazer fama de mau por meses, infelizmente.
O dólar
chegou a R$ 5,44. Ficara em torno de R$ 4,93 de novembro de 2023 a
março de 2024. Subiu a R$ 5,13 em abril e maio, na média de cada mês. Na média
de junho, está em R$ 5,35. Boa parte da piora é efeito de juros altos por mais
tempo nos EUA. Outra parte é resultado de conversas malucas de política
econômica no Brasil.
O dólar tem de sair dessas alturas, para não
injetar mais inflação na veia da economia. As taxas de juros
"básicas" no mercado, de prazo maior que dois anos, estão entre 1
ponto e 1,6 ponto acima do nível que estavam em agosto de 2023, quando o BC
começou a talhar a Selic. É claro que não basta apenas talhar a Selic.
Dada a baderna doidivanas, a confiança no BC
e, mais ainda, na política econômica baixou muito. Vamos perder tempo tomando
calmantes. Mas o estresse pode passar, se também as ações de governo e a
realidade forem mais palatáveis.
Um comentário:
Haja Lexotan!
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