Folha de S. Paulo
Governo faz bem de cortar privilégios, mas
seu plano é fraco e não tem força política
Luiz Inácio Lula da
Silva e Fernando
Haddad enfrentam uma revolta
contra o aumento de impostos. A mais recente medida para elevar a
arrecadação, baixada na terça, bateu também em um setor econômico em que o
governo é malvisto ou odiado, o agronegócio, ora em fúria.
A revolta se espraia para outros
(supostamente) afetados. Vai servir de mote para uma campanha contra o aumento
da carga tributária. Por que "supostamente afetados"?
A medida provisória que exige mais pagamento de impostos mexe com a legislação do PIS/Cofins, que é alucinadamente confusa, o que suscita espertezas de contribuintes e governos, além de conflito no tribunal da Receita e na Justiça.
A irritação com mais impostos fervia baixo.
Deve explodir em momento politicamente ruim para o governo. Lula 3 não apenas
apanha mais no Congresso. É pressionado por outra ofensiva de aumento de poder
parlamentar, como também a de Arthur Lira (PP-AL), presidente da
Câmara.
Lira criou um sistema que vai lhe dar grande
poder sobre o que entra na regulamentação
da reforma tributária. Vai ser o grande interlocutor entre setor
privado e governo, o grande mediador dos lobbies.
Chamou ainda para si a negociação de crises e
despautérios dos planos de saúde. Definiu com empresas que haveria "imposto
das blusinhas". Deu bronca na Fazenda, que não o informou sobre
a medida do PIS/Cofins.
A revolta empresarial contra a medida foi
logo ao Senado,
que pode devolver (recusar) de pronto a medida provisória ao governo. Mas Lira
já está no alto da conversa, no núcleo da mediação e por cima da carne seca,
com mais um meio de pressionar o governo.
Lula 3 precisa aumentar a arrecadação de
impostos de modo urgente a fim de conter o déficit e evitar desmoralização
maior das metas do seu "arcabouço fiscal".
Como não tem tempo ou meios políticos ou
técnicos de planejar mudança de regras mais ordenada (como na reforma dos
impostos sobre consumo), usa o plano de combate da Receita Federal para caçar
dinheiros, caso a caso, de modo pontual, se não surpreendente.
A Fazenda mexeu no PIS/Cofins porque precisa
cobrir o dinheiro que empresas e prefeituras deixam de pagar para a Previdência
("desoneração"), que Haddad queria reaver neste ano. Perdeu a
batalha.
Mas a lei determina que essa perda de receita
seja coberta, providência que o Congresso não tomou. Se não puder recolher mais
dinheiro com a MP do PIS/Cofins, Lula 3 pode voltar à Justiça pelo dinheiro
perdido. O rolo se instala.
Desde que tomou posse, Haddad diz que quer
caçar "jabutis" tributários. Isto é, reduções indevidas de impostos
para certas pessoas, empresas, setores ou regiões. Algumas dessas reduções são
favores escandalosos, outras são incentivos tributários ineficientes, outras
são invenções criativas de advogados etc.
Quase todas são resultado de um sistema
tributário lunático e decrépito. Como a legislação é enorme e confusa,
malandragens abundam, de lado a lado, do governo e do contribuinte.
Haddad quer principalmente diminuir gastos
tributários (em suma, isenções de impostos), R$ 600 bilhões anuais que
empresas, pessoas físicas e instituições deixam de recolher à Receita, segundo
a conta da própria Receita (que está provavelmente exagerada, pois não é
estimativa econômica, mas contábil, de resto imprecisa).
Além disso, quer acabar com gambiarras, como
algumas que existem no caso do uso de créditos do PIS/Cofins (imposto pago ou
presumidamente pago a mais e que as empresas podem receber de volta ou usar
para abater o pagamento de outros impostos).
Embora existam injustiças sociais e
ineficiências enormes nesses puxadinhos, parece que o sistema Haddad de caçar
jabutis vai se esgotar, politicamente.
Um comentário:
Pode ser.
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