domingo, 1 de dezembro de 2024

Programa de Haddad vai na direção certa - Celso Rocha de Barros

Folha de S. Paulo

Torço para que o Congresso só o mude se for para melhor

Lula surpreendeu o mercado anunciando o pacote fiscal e a reforma do Imposto de Renda no mesmo dia. Do ponto de vista econômico, criou ruído em um momento em que o quadro internacional é instável. Do ponto de vista político, faz sentido.

O pacote fiscal trouxe medidas que sacrificam o eleitorado pobre que venceu as últimas eleições presidenciais com Lula e, ao fazê-lo, livrou o Brasil do autoritarismo.

Pelas novas regras, o salário mínimo vai continuar tendo crescimento acima da inflação (só no governo Bolsonaro não teve), mas crescerá mais lentamente. O abono salarial, atualmente disponível para trabalhadores que ganham até dois salários mínimos, será pago apenas para os que, após um período de transição, ganharem 1,5 salário mínimo.

Foi muito, muito difícil vender essas medidas dentro de um governo liderado pelo partido dos sindicatos.

Era importante, portanto, mostrar para o eleitorado de Lula que o ajuste não seria feito apenas em cima dele. A proposta de isenção para os que ganham menos que R$ 5.000 e de mais imposto para os que recebem acima de R$ 50 mil foi a maneira de transmitir essa mensagem.

Afinal o Congresso não deixou que Lula tivesse muitos sacrifícios de rico para mostrar. Se os legisladores tivessem aprovado o fim dos subsídios empresariais, como Haddad propôs, a conta fecharia muito mais fácil.

Por exemplo: os deputados Kim Kataguiri (União Brasil-SP), Pedro Paulo (PSD-RJ) e Júlio Lopes (PP-RJ) apresentaram uma proposta de emenda constitucional que faria um ajuste fiscal bem mais duro que o de Haddad. Estão no seu direito.

Mas, em 23 de abril deste ano, o mesmo Kataguiri foi ao X comemorar a manutenção do Perse, um programa que Haddad tentou extinguir. O Perse foi feito para que os empresários do setor de eventos não pagassem impostos durante a pandemia. Sim, a pandemia que acabou faz alguns anos. Custa bilhões.

A princípio, a reforma do Imposto de Renda não deve afetar o ajuste fiscal, nem para melhor nem para pior.

Os cálculos do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades (Made) da USP sugerem que o aumento do Imposto de Renda sobre os ricos (na verdade, uma alíquota efetiva mínima para quem ganha mais de R$ 50 mil por mês) deve compensar a perda de arrecadação com o aumento da isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5.000.

Haddad disse, na entrevista em que anunciou o plano, que a isenção para os com renda de até R$ 5.000 só passa se também passar o aumento de imposto para os que ganham acima de R$ 50 mil. Mas o mercado teme, com uma certa razão, que o Congresso mande o governo pastar, aprove a isenção, mas não o aumento de imposto.

Ouvi de gente inteligente que talvez fosse melhor aumentar menos a faixa de isenção e, ao mesmo tempo, colocar uma alíquota mínima para os ricos ainda maior do que a proposta por Haddad. Suspeito que estejam certos, mas que a proposta de Haddad seja o compromisso possível entre o presidente que quer isentar mais de um lado e o Congresso que quer taxar menos do outro.

Junto com cadeia para golpistas, ajuste fiscal com imposto para ricos é uma das bandeiras preferidas desta coluna. As críticas são legítimas, mas o programa de Haddad vai na direção certa. Torço para que o Congresso só o mude se for para melhor.

 

Um comentário:

Anônimo disse...

Depois de dois anos de gastos desenfreados, onde totalmente a contragosto Lula finalmente resolveu cortar alguma coisa, naturalmente do lombo do povo, senão ele não se elege de maneira nenhuma.daqui a dois anos, o sociólogo diz que se algo der errado a culpa não são deles, é do congresso, do qual esse mesmo colunista já esculhambou dezena de vezes, é são eles mesmo que a daqui a dois anos vão vir pedir nossos voto, vão esperando pra ver o resultado.....