Folha de S. Paulo
Magistrados e tribunais exibiram
contorcionismo para descumprir regra do teto salarial
Nos dias finais de 2024, os tribunais
brasileiros encenaram mais um espetáculo de exibição de privilégios. Em três
atos, magistrados da primeira à última instância, mostraram o contorcionismo
que fazem todos os anos para preservar auxílios,
gratificações e indenizações que se somam a seus salários.
A abertura ficou por conta do presidente do STF. Quando a questão dos supersalários tomou forma na discussão sobre o ajuste fiscal, Luís Roberto Barroso reagiu a uma proposta que não deveria ofender ninguém: seguir o que está na Constituição e limitar o valor pago a qualquer servidor público, incluindo juízes.
Como representante da corporação, Barroso
declarou que "o Judiciário não tem participação
nem responsabilidade sobre a crise fiscal". Acrescentou que o
aumento de despesas dos tribunais nos últimos anos foi modesto e indicou que é
preciso furar o teto salarial para que os cargos sejam atrativos. Não se pode
culpar o ministro por vícios que existem há décadas, mas ele também não precisa
enfeitá-los.
Por trás da cortina, lobistas dos tribunais
já trabalhavam para desfigurar no Congresso a proposta do
governo que deveria dificultar o pagamento de benefícios acima
do teto. Em pouco tempo, entidades que representam juízes, procuradores e
defensores conseguiram emplacar uma versão do texto que praticamente
garante os penduricalhos.
A apresentação terminou com o auto do
vale-peru, protagonizado pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso. Nas últimas
semanas do ano, a corte determinou o pagamento de um auxílio-alimentação
especial de R$ 10 mil para juízes e servidores. O Conselho Nacional de Justiça
não engoliu o atrevimento e mandou suspender o mimo dois dias depois.
O tribunal prolongou o vexame e pagou o
vale-peru, com o argumento de que a decisão do CNJ não foi informada a tempo. A
presidente da corte teve que pedir a
devolução do dinheiro e lembrou que o TJ-MT vive um
"momento desafiador". A magistrada não precisou dizer com todas as
letras que o tribunal, que paga em média R$ 116 mil por mês para cada
desembargador, tem três integrantes investigados pela venda de
sentenças judiciais.
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