Folha de S. Paulo
Auditorias e PF mostram baderna, desperdício
e bandalheira; buraco deve ser mais fundo
Ainda que não se furte ou se desperdice o dinheiro
das emendas parlamentares, sabe-se que o modo pelo qual senadores e
deputados modificam o Orçamento muita vez não tem planejamento, cálculo de
eficiência, de prioridade ou picota recursos escassos em investimentos que
podem até ser um campo de futebol society.
Sim, mas se furta. A comissão pode ser de 12%, segundo conversas captadas pela Polícia Federal, relatadas pela revista piauí. O resultado do trabalho da PF, de auditorias da Controladoria-Geral da União e, mais recentemente, do ministro Flávio Dino, do STF, são amostras de um buraco profundo, que começa com desperdício e ineficiência.
Faz parte das atribuições parlamentares
emendar o Orçamento. Transformá-lo em colcha de retalhos miúdos é outra coisa.
Pode ser que uma cidade pobre ou necessitada por outro motivo recorra a
dinheiro federal a fim de resolver um problema municipal. Mas qual instância de
governo terá recursos e capacidade de coordenação bastante para executar
grandes obras de impacto regional ou nacional ou investimentos de fundo e de
peso em pesquisa e ciência?
Esse problema parece quase luxuoso quando se
faz uma pequena verificação do destino das emendas, como a
auditoria que a CGU publicou em novembro, por exigência de Dino, do STF.
Quase 40% de 256 obras analisadas não haviam
começado. Em parte das 30 cidades investigadas, não se sabia que fim se dera a
equipamentos comprados. Das dez ONGs que mais haviam recebido dinheiro de
emendas, sete não teriam capacidade técnica ou pessoal adequado para realizar o
projeto bancado pelas emendas. Haveria superfaturamento. Etc.
Além do uso ineficiente de tanto dinheiro e
da roubança já descoberta, o dinheiro das emendas é um modo de criar feudos.
Note-se que os recursos das emendas equivalem mais ou menos a um quarto daquela
parte do Orçamento que se chama de "livre" (que não é destinado a
gastos obrigatórios, por leis, pela Constituição ou pela mera necessidade de
funcionamento da máquina administrativa).
Os barões do Orçamento, lideranças
partidárias e seus agregados, se tornam donos de um pedaço dos dinheiros
federais, por lei ou pressão política. Donos. Vide a luta de quem pretende ao
menos esclarecer quem manda no dinheiro, para onde vai e com que fim. A redução
do butim é ora combate inglório, um problema também para a organização das
contas federais.
O feudo que criaram e conquistaram nos anos
de enfraquecimento caótico do Executivo (desde 2015) alimenta feudos eleitorais
regionais, currais eleitorais e ração para políticos locais agregados. Além de
distorcer a destinação de recursos, os barões do Orçamento criam dinastias
políticas —distorcem a competição eleitoral.
O que fazer? A PF não pode dar batidas a
torto e a direito. O trabalho da CGU indicou que, mesmo em pequena amostra, se
puxa uma pena e vem uma galinha. O inquérito da PF para investigar o processo
de liberação das emendas, determinado em dezembro por Dino, deve descobrir mais
bichos gordos. Mas é preciso mais auditoria.
O governo vai fazer? Gente graúda do
Congresso já diz que Dino e Lula estão mancomunados. Se o governo investigar
mais, é possível que barões e gangues se revoltem, como fizeram com Dilma
Rousseff, de quem queriam ajuda para fugir da polícia.
De onde pode sair um movimento nacional de
pressão?
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