sexta-feira, 3 de janeiro de 2025

Violência policial expõe direita tosca - Marcos Augusto Gonçalves

Folha de S. Paulo

Melhor fariam governadores do Sudeste, a começar por Tarcísio de Freitas, se contivessem abusos e matança

A reação de governadores de direita ao decreto do governo federal sobre uso da força pela polícia é mais um atestado da estupidez que vem ganhando projeção num país cada vez mais ignaro, violento e abandidado.

Em São Paulo, Tarcísio de Freitas, o preferido do bolsonarismo, das finanças e do ruralismo para disputar a Presidência em 2026, insiste em dar provas de truculência. Não apenas na segurança pública, embora com especial afinco nesta área.

Nomeou como seu secretário um ex-policial que se orgulha de ter matado "vagabundos" e gosta de repetir, em seu chocante despreparo, a retórica do apologista da tortura que o inspira, o famigerado Jair Bolsonaro.

Em simetria com a escalada da letalidade policial incentivada pelo governo estadual, casos macabros de abuso da força por parte de agentes policiais têm aparecido na mídia, graças a câmeras de segurança e smartphones. O contribuinte pode ver seus impostos aplicados em iniciativas públicas ilegais e racistas.

O padrão se repete em outros estados, mesmo governados pela esquerda ou por partidos de centro. E também é sustentado pelas Forças Armadas, cujo tribunal absolveu recentemente oito militares que, em 2019, fizeram 257 disparos contra um automóvel guiado pelo músico Evaldo Rosa.

Ele estava em companhia de sua mulher, filho, sogro e uma amiga. Desse total, 62 projéteis acertaram o carro e 9 o corpo da vítima. Como explicar tal decisão?

Casos análogos são recorrentes.

Por mais que se trate de uma parcela minoritária de agentes do Estado, a repetição de ocorrências como tiros pelas costas e assassinatos covardes é assustadora e clama por medidas. Note-se que o descaso em geral atinge os mais pobres, gente cuja vida parece não valer nada em seu país.

O decreto veio em resposta a este estado de coisas insustentável. Suas recomendações já se inscrevem em convenções internacionais assinadas pelo Brasil, em legislação vigente e em programas de treinamento policial.

A intenção é detalhar a regulamentação legal e gerar incentivos para que as regras sejam aplicadas, condicionando à sua observação o acesso a fundos públicos nacionais.

As normas são básicas: a prerrogativa de uso da força pelo Estado deve respeitar proporcionalidade, numa escala em que uso de arma de fogo é um último recurso, só admissível quando outros de "menor intensidade não forem suficientes para atingir os objetivos legais pretendidos".

Policiais não devem atirar contra pessoas desarmadas, disparar pelas costas ou alvejar veículos às cegas.

Não há nada de extraordinário ou inovador nisso. Em que pese a reação política e ideológica de Tarcísios, Zemas e Ratinhos, outros governadores apoiaram o dispositivo, bem como um grupo significativo de ex-secretários de segurança.

A alegação de que seria uma interferência indevida da esfera federal numa atribuição dos estados não tem nenhum fundamento.

O Brasil não de hoje vive uma situação dramática nas políticas de controle da criminalidade, com abusos em série, corrupção e infiltração de facções nas instituições republicanas.

Para piorar, setores da população —senão a maioria ao menos parcela rude e ignorante— apoia a truculência, as investidas contra bairros pobres e o lema bandido bom é bandido morto.

 

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