Folha de S. Paulo
Projeto diminui punição de condenados por
ataques do 8 de Janeiro
Presidente da República indicou a aliados que
barrará texto integralmente
O Senado aprovou
nesta quarta-feira (17) o projeto que reduz as penas dos condenados pelos
ataques às sedes dos três Poderes em 8 de janeiro
de 2023 e beneficia o ex-presidente Jair
Bolsonaro. O resultado é uma vitória do grupo político bolsonarista
e uma derrota do governo de Luiz Inácio Lula da
Silva (PT).
As investigações sobre o 8 de Janeiro expuseram uma trama para desrespeitar o resultado da eleição de 2022, vencida por Lula, e manter Bolsonaro no poder. Autoridades identificaram, por exemplo, um plano para matar Lula; seu vice, Geraldo Alckmin; e o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes.
O placar no plenário do Senado foi de 48 votos
a favor do projeto e 25 contra. Como a Câmara já aprovou a
proposta, ela segue para sanção presidencial. Lula deve vetar o
texto integralmente, como mostrou a Folha.
O petista e seus aliados são contra o
projeto, já a direita bolsonarista passou a apoiá-lo nas últimas semanas. A
redução de penas é discutida no Congresso há meses, mas só andou depois de os
apoiadores de Bolsonaro aceitarem votá-lo no lugar de uma anistia total.
"Não é o que queríamos, mas, no jogo de
relação de forças, era o possível", disse o líder da oposição no
Senado, Rogério
Marinho (PL-RN). Ele deu a
declaração durante a discussão
preliminar do texto na CCJ (Comissão de Constituição e
Justiça), mais cedo nesta quarta.
O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA),
fez um acordo com a oposição para permitir que o projeto fosse votado nesta
quarta, mas ainda assim se declarou contra a redução de penas.
"Eu não fiz nenhum acordo de mérito.
Continuo contra e acho um absurdo o projeto. A única diferença é que se poderia
empurrar com a barriga para fevereiro ou votar hoje. Se o presidente vai vetar,
agora ou fevereiro dá no mesmo", disse ele a jornalistas.
O movimento de Wagner irritou diversos
aliados do Planalto. O senador Renan
Calheiros (MDB-AL), por
exemplo, protestou e disse que o acordo feito pelo líder do governo era para
viabilizar a aprovação de um projeto que aumenta a arrecadação do Executivo.
O trecho do projeto que mais beneficia
Bolsonaro é o que permite uma espécie de unificação dos crimes de golpe de
Estado e abolição violenta do Estado democrático de Direito.
O ex-presidente foi condenado a 8 anos e 2
meses por golpe e 6 anos e 6 meses por abolição do Estado democrático. Pelas
regras atuais, as duas penas são somadas. O projeto permite que seja
considerada apenas a maior, com um acréscimo de um sexto até a metade,
dependendo do caso.
Além disso, o projeto permite que os
condenados pelo 8 de Janeiro tenham progressão de regime depois de um sexto da
pena ser cumprida. Pelas regras atuais, a progresão vem depois de um quarto da
pena cumprida.
Se entrar em vigor, o projeto poderá, em
tese, reduzir o tempo que Bolsonaro passará no regime fechado de cumprimento de
pena dos atuais 6 a 8 anos para algo entre 2 anos e 4
meses e 4 anos e 2
meses, dependendo da interpretação.
Também influenciará na redução das penas o
tempo que Bolsonaro dedicar a trabalho ou estudo, atividades que podem ser
usadas para diminuir o período na prisão. A condenação
total foi a 27 anos e 3 meses de reclusão.
Senadores constataram, ao longo da
tramitação, que o projeto aprovado pela Câmara abria margem para condenados
por crimes diferentes daqueles relacionados ao 8 de janeiro também serem
beneficiados.
O relator do projeto, Esperidião Amin
(PP-SC), fez uma alteração no projeto para fechar essa brecha ainda durante a
tramitação na CCJ. O colegiado decidiu que a alteração era de redação.
Essa tecnicalidade é importante porque
ajustes de redação não forçam projetos a voltar para a Câmara. Uma nova análise
da proposta pelos deputados dificilmente seria feita ainda neste ano, já que o
recesso do Legislativo começa na a semana que vem.
Senadores governistas se colocaram
publicamente contra o projeto. "O maior crime que um homem público pode
cometer é atentar contra a democracia", disse Marcelo Castro (MDB-PI).
"Esse projeto aqui alivia para os comandantes do golpe, evidentemente não
podemos concordar com isso", declarou.
"O motivo [da defesa do projeto pela
oposição] é esconder a tentativa de golpe que houve, sim, no Brasil, e que não
se restringe ao vandalismo do 8 de Janeiro", declarou Teresa Leitão
(PT-PE). "O que pacifica o país é golpista cumprir pena", disse Renan
Calheiros.
Aliados de Bolsonaro afirmam que o projeto
tira da prisão pessoas que cometeram crimes menores, como vandalismo.
"Iremos reparar injustiças graves,
cometidas com muitos que estão presas e que tiveram pena na minha opinião
abusivas. O Congresso está corrigindo o excesso do Judiciário", declarou a
líder do PP no Senado, Tereza
Cristina (MS).
"Precisamos votar essa matéria para
virar essa página e tirar essas pessoas [da prisão]. O pipoqueiro, o vendedor
de bala", disse o senador Izalci Lucas (PL-DF). "Queremos anistia
ampla geral e irrestrita para pacificar, reconciliar a nação", disse Eduardo Girão (Novo-CE).
O presidente do Senado, Davi
Alcolumbre (União-AP), queria que o projeto fosse votado logo
após a deliberação da Câmara, pulando etapas na Casa Alta. O projeto só passou
pela CCJ por causa de um movimento liderado pelo presidente do colegiado, Otto Alencar (PSD-BA).
Alcolumbre queria que o projeto fosse votado
rapidamente por causa de um compromisso firmado com o presidente da
Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB),
seu aliado.

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