sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Representação e interesse nas eleições - Argelina Cheibub Figueiredo

Na próxima eleição municipal, cerca de 4,5 milhões de eleitores votarão na cidade do Rio. As leis eleitorais brasileiras e o papel da Justiça eleitoral garantem grande peso às camadas mais pobres da população. O voto obrigatório e a Justiça eleitoral contribuem para que essas camadas tenham peso nas urnas proporcional ao seu tamanho. O acesso cada vez mais fácil ao voto, a maior lisura das eleições e, consequentemente, maior confiança nos resultados eleitorais incentivam a participação e diminuem os custos de votar, aumentando a influência desses segmentos nas políticas públicas. Não é por acaso a ênfase de partidos das mais diversas colorações ideológicas em políticas que os beneficiam.

O retorno eleitoral da população mais pobre é frequentemente visto como uma forma de clientelismo. A eleição para o Legislativo municipal seria campo fértil onde brota e prospera o paroquialismo. Vereadores com redutos eleitorais localizados seriam defensores de interesses espúrios de suas clientelas, distorcendo a representação. Não há lugar para representantes de correntes de opinião e ideologias ou mesmo para aqueles que visam ao interesse geral dos moradores da cidade. Mas não precisa ser assim e, na verdade, nem sempre é.

Vamos primeiro aos fatos. Na ciência política, um dos principais indicadores de paroquialismo é a concentração de votos, no caso das cidades, em um ou mais bairros contíguos. Vereadores com votação concentrada seriam paroquiais ou clientelistas, enquanto a votação dispersa caracterizaria o voto de opinião, ideológico. Os resultados das últimas eleições municipais mostram que partidos e/ou vereadores “ideológicos” foram campeões em votos localizados em um conjunto compacto de bairros, enquanto partidos e/ou vereadores sabidamente clientelistas ou fisiológicos obtiveram votação mais dispersa.

A representação política abarca tanto o interesse geral como o específico, especialmente quando as carências atingem amplas camadas. Como vimos em artigos anteriores desta série, o município é o principal responsável pela educação fundamental, a educação é fator determinante da qualidade do emprego que as crianças terão daqui a dez, 20 anos, e a concentração de negros se dá nos bairros mais pobres e, portanto, mais dependentes da educação pública. A prefeitura tem, sim, papel a desempenhar nas políticas raciais, de educação e de emprego. Vereadores têm muito a fazer para melhorar as escolas, criar programas de emprego, de qualificação de mão de obra e medidas para diminuir as desigualdades raciais. Podem fazer isso tanto por meio de legislação como de sua participação no Orçamento municipal. Ao representar os eleitores de seus redutos eleitorais, podem funcionar como um instrumento de informação sobre suas carências e de pressão para a implementação de políticas e recursos para combatê-las. Por que não deveriam buscar recursos para seus redutos eleitorais? Se as carências não existissem, não haveria por que fazer isso. Se fazem, e sua ação produz efeito, serão recompensados com votos. Cabe à disputa política e, em parte, à Justiça eleitoral continuar a agir para evitar que, por meio de “obras sociais” e outros recursos espúrios, candidatos tentem prover serviços precários para “comprar” voto. Apenas por meio da participação eleitoral, a população distinguirá o joio do trigo.

Argelina Cheibub Figueiredo, professora e pesquisadora do Iesp-Uerj

FONTE: O GLOBO

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