sexta-feira, 31 de maio de 2013

País vive risco de estagflação

Baixo crescimento do PIB e inflação elevada ameaçam levar a economia à situação já vivida no fim da década de 1980

Pressão cada vez maior

Risco de estagflação - fenômeno temido, caracterizado pela combinação de inflação alta e paralisia da atividade - torna mais difíceis os desafios da política econômica

Diego Amorim, Rosana Hessel e Sílvio Ribas

RIO DE JANEIRO e BRASÍLIA — A frustração com o desempenho pífio do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre (0,6%), em boa parte afetado pela perda de poder de compra do consumidor para a inflação, tornou 2013 um desafio ainda mais complexo para a presidente Dilma Rousseff, às vésperas de um ano eleitoral. O medo da volta da estagflação — o pior dos pesadelos econômicos, formado pela combinação de inflação persistente com baixo crescimento do PIB — ficou sugerido na avaliação de especialistas e na própria decisão do Banco Central (BC) de elevar a taxa básica de juros (Selic) de 7,5% para 8% ao ano para puxar os índices de preços para abaixo da meta oficial de 6,5%.

Os fatos acabaram ajudando a autoridade monetária a dar uma resposta parcial ao dilema entre impedir um esfriamento maior da atividade e atiçar ainda mais o dragão inflacionário. “O bolso do brasileiro já está sentindo perdas acima dos índices oficiais de inflação, agravadas com sustos nos supermercados e o encarecimento dos serviços”, observou Simão Silber, professor de economia da Universidade de São Paulo (USP). A carestia, acrescenta ele, se tornou o obstáculo politicamente mais complexo para Dilma, por mexer com a vida da maioria da população. “O grande inimigo da presidente é o descontrole inflacionário, porque ele é traiçoeiro”, resumiu.

Desorganização

Guardadas as devidas proporções entre os números astronômicos da hiperinflação dos anos 1980, a década perdida, e os índices mais civilizados desde a estabilização pelo Plano Real (1994), a possibilidade de uma convivência de PIB estagnado com uma alta generalizada de preços remete ao momento de maior desorganização da história econômica do país, no período final do governo José Sarney (1985-1990). Somente em março de 1990, último mês da gestão do derradeiro presidente da República eleito indiretamente, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), indicador oficial de inflação, bateu em 82%. No ano anterior, o indicador havia acumulado alta de 1.972,91%.

Naquela época, os brasileiros viveram o raro fenômeno da estagflação, mais perversa que inflação alta simplesmente, porque o capital produtivo preferia se refugiar na especulação financeira a ampliar a oferta de mercadorias. Eram dias em que consumidores corriam aos supermercados de manhã para evitar reajustes gerais de produtos à tarde. Desde a última década do século passado, a última vez em que o Brasil assistiu a uma inflação anual de dois dígitos foi em 2002 (12,5%), puxada pelas tensões em torno da eleição de Lula.

Desde ontem, quando foi anunciado o PIB do primeiro trimestre, consultorias nacionais e estrangeiras vêm tratando de reavaliar para baixo suas previsões para o país, com crescimento anual bem menor do que 3% (última projeção do Fundo Monetário Internacional) e inflação acima de 6%. Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados, teme que as respostas do Planalto ao drama de baixa expansão do PIB e IPCA estourando a meta continuem no rumo do intervencionismo. “O excesso de controles, verificado nos dois primeiros anos do governo Dilma, afastou investimentos e gerou incertezas para o futuro. Se essa tendência se prolongar, poderemos atingir uma rigidez na economia difícil de mudar, como as angústias encontradas nos anos 1980”, alertou.

Saídas

As dificuldades enfrentadas pelo país não se restringem ao cenário doméstico. Para as exportações brasileiras, o receio está no fim do ciclo de alta nos preços dos produtos básicos, sobretudo os carros-chefes, minérios e soja. “O ritmo acelerado das vendas para a China está diminuindo, e o Brasil não poderá fazer nada contra isso. É só assistir e rezar”, sublinhou José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). O economista Júlio Miragaya, presidente da Companhia de Planejamento do Distrito Federal, também acredita que o PIB de 2013 “só chegará perto de 3% se a balança comercial apresentar números robustos e a retomada dos investimentos se consolidar”.

Newton Marques, do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal (Corecon-DF), observou que todos os incentivos do governo ao consumo foram insuficientes para impedir a decepção com o crescimento do país no primeiro trimestre. O “esvaziamento” da capacidade de consumo das famílias apontado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) pode ter feito de 2013 um “ano perdido”, ameaçando colocar em risco a reeleição de Dilma.

Os sinais mais preocupantes para a atividade econômica estão vindo, contudo, da indústria. José Luís Oreiro, professor da Universidade de Brasília (UnB), teme que a crescente perda de competitividade do setor esteja colocando em xeque as iniciativas do governo para estimular a produção. No lugar das atuais políticas de incentivo — como desoneração da folha de pagamento —, o economista aposta na desvalorização do câmbio e em investimentos agressivos na infraestrutura para salvar o parque fabril. “De toda forma, pelo andar da carruagem, o PIB de 2013 será inferior a 2%, bem abaixo da meta estipulada pelo governo, de 3,5%”, sentenciou.

Fonte: Correio Braziliense

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