- O Globo
Há magros, miúdos, motivos de ânimo nos dados da economia no terceiro trimestre. A feia palavra recessão saiu de cena, já que o PIB ficou em 0,1%. Indústria e investimento subiram um pouco. No geral, o quadro é desolador. A taxa de poupança é a mais baixa em 14 anos. O consumo das família provou que o modelo de crescer incentivando o endividamento se esgotou.
Trocando em miúdos: o país parou no ano de 2014. Não é culpa do mundo. É resultado das escolhas da política econômica que persistiu no erro com uma insistência que não se curvava nem aos fatos da vida. O ministro Guido Mantega, que ainda está no exercício de suas funções, achou que o país cresceria pelo consumo das famílias estimulado pelo endividamento. Ontem mesmo ele repetiu que um dos problemas é a baixa concessão de crédito por parte do sistema financeiro. Mas a verdade é que as famílias tomaram empréstimos, comprometeram seus orçamentos e agora pagam as contas. Orçamento não é elástico e, felizmente, as famílias sabem.
Em tempos de mudança de lógica no Ministério da Fazenda, o magro 0,1% positivo se soma ao novo ânimo de que se possa encontrar, em algum momento, a saída para a estagnação. Pelo menos daqui para diante haverá ministros falando algo que faça sentido em Brasília. A definição da consultoria Rosenberg Associados para o número de ontem foi: “parou de piorar, mas também não melhorou muito.”
O investimento cresceu depois de quatro trimestres seguidos de queda. Mas o recuo acumulado nesse período foi de 11,1%, enquanto a alta foi de apenas 1,3%. Nem de longe recupera as perdas. A taxa de investimento como proporção do PIB caiu para 17,4%, o número mais baixo desde 2007, e muito distante da meta estipulada pelo próprio governo, de subir acima de 20% do PIB.
A taxa de poupança, por sua vez, caiu para 14% do PIB, o número mais baixo para um terceiro trimestre desde o ano 2000. O déficit em conta-corrente na ordem de 4% do PIB — sinônimo de poupança externa — mostra que esse é um dos principais gargalos da economia brasileira atualmente. Somando as duas poupanças (interna e externa) chega-se a um número de 18% do PIB para financiar os investimentos. Muito baixo.
Por isso, a sinalização do novo ministro da Fazenda Joaquim Levy de aumentar o superávit primário é positiva e ajuda a melhorar as expectativas. O primário, além de combater a inflação e controlar a dívida pública, também fortalece a taxa de poupança. Ao invés de o governo gastar com custeio e pessoal, como vem acontecendo nos últimos anos, ele poupará recursos para investir.
É verdade que isso pode deixar a economia mais fraca em um primeiro momento, e esse é um dos motivos pelos quais as previsões para o PIB de 2015 estão baixas, em torno de 1%. Mas ter metas fiscais que se possa acreditar ajudará a mudança das expectativas.
O consumo das famílias recuou pelo segundo trimestre consecutivo, algo que não acontecia há 11 anos. A inflação e o endividamento limitam o orçamento doméstico. A subida dos juros para conter a inflação piora esse quadro num primeiro momento, mas deixar a inflação nesse patamar seria insensato. O IPCA terá que ceder, para depois o ritmo de crescimento voltar a ficar mais forte.
A taxa acumulada de crescimento nos últimos quatro trimestres desacelerou de 1,4% para 0,7%. A expectativa do mercado é que chegue ao final do ano com um crescimento de apenas 0,2%. Ao mesmo tempo, a inflação ficará em torno de 6,4%.
A nova matriz macroeconômica falhou: derrubou o crescimento e alimentou a inflação. A comemoração do miúdo 0,1% é seu melancólico final.
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