O embargo econômico a Cuba se tornou tão anacrônico quanto a ditadura decadente dos irmãos Castro. O presidente americano Barack Obama deu grandes passos ontem para colocar a ilha de volta ao mapa geopolítico e econômico do século XXI, ao reatar relações diplomáticas, ampliar relações econômicas e tentar tornar irreversível o fim do cerco cinquentenário ao país - uma decisão que compete apenas ao Congresso americano tomar. Os republicanos agora dominam Câmara e Senado na próxima legislatura e têm ideias bastante diferentes das de Obama sobre o futuro do regime cubano.
O embargo americano a Cuba passou a ter um peso esmagador sobre a economia da ilha depois que baixou a maré do "comunismo", com o apodrecimento dos regimes stalinistas no Leste Europeu e a queda do Muro de Berlim. Uma economia monocultora pôde sobreviver dentro de seu casulo ideológico enquanto encontrou parceiros que lhes suprissem a carência de divisas fortes, mas Cuba perdeu, um após o outro, seus patrocinadores. A União Soviética desapareceu e a ajuda que a Rússia hoje dá ao regime dos Castro é uma pálida sombra da que concedia desde o início dos anos 1960.
Agora, com a queda do petróleo e o desastre econômico manufaturado pelo chavismo, Cuba está em vias de perder o combustível subsidiado da Venezuela.
A apenas 150 km da costa americana, Cuba foi isolada das maiores economias do mundo e passou a viver como pária internacional. Há escassez de bens básicos para a maioria da população e regalias para sua burocracia, embora menos ostensivas que as dos burocratas da URSS e seus satélites, mais avançados que Cuba quando foram tragados para a órbita soviética.
Cuba também perdeu um de seus principais itens de exportação, a ideologia. Depois dos fracassos da guerrilha na América Latina e África, o regime cubano confinou-se ao pequeno reino doméstico, onde a estatização total dos meios de produção congelou no tempo sua economia e suas cidades.
O regime castrista não vivia tão mal durante a Guerra Fria, mas tornou-se inviável após seu fim. A insatisfação com a ditadura encontrou a porta de saída no êxodo de uma minoria numerosa, enquanto que dissidentes tiveram de conviver com a repressão policial, dentro de um ambiente marcado pela ausência de liberdades. O Estado era, até bem pouco, o único patrão em Cuba e, em uma ditadura, essa é uma arma muito poderosa contra os descontentes.
As reformas feitas por Raúl Castro, que aos poucos permitiu a emergência de pequenos negócios privados e propriedade de imóveis, encontrou seus limites no baixo dinamismo da economia. O país deverá crescer 1,4% este ano, depois de anos seguidos com taxas superiores a 2%. Com o embargo, Cuba talvez ficasse parada no tempo indefinidamente, ou até que os Castro morressem e uma crise sucessória acabasse por sepultar o regime.
O presidente Obama fez menção em seu discurso ao fim do colonialismo, um ponto central para caracterizar o embargo econômico como uma das armas poderosas de retaliação. O embargo, que veio na sequência de uma desastrada tentativa de invasão a Cuba em 1962, foi a continuação da política americana por outros meios. Como "quintal" dos EUA, a América Latina foi vítima das intervenções armadas, das ações da CIA e do apoio clandestino à derrubada de regimes que não se submetessem a Washington, fiador de ditaduras como a brasileira.
Para Obama, a melhor forma de virar essa página da história foi usar a arma do comércio, depois que o regime cubano tornou-se politicamente inofensivo. Para Raúl Castro, as boas frestas que se abriram com o gesto de Obama propiciam uma lufada de ar fresco em um sistema já sem fôlego. Coloca para ele também a difícil tarefa de manter a extrema centralização política do regime e permitir que as forças de mercado ganhem impulso com o reatamento de relações comerciais com a maior economia do mundo. Ao que tudo indica, o regime cubano não tem vocação, nem condições econômicas e físicas, para criar uma economia "socialista de mercado", como a China.
Dessa forma, a iniciativa histórica de Obama, ao mesmo tempo em que pode ajudar a corrigir a herança colonialista dos EUA, traz desafios importantes para o futuro de Cuba. As perspectivas econômicas da ilha vão melhorar, mas elas podem ser incompatíveis com o velho regime.
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