quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Dora Kramer - A vida de cada um

- O Estado de S. Paulo

Vista assim do alto, a renúncia da presidente e mais cinco diretores da Petrobras horas depois de ter sido acertado um cronograma com a Presidência da República que previa a saída para daqui a um mês pode parecer ato de retaliação.

Algo como um troco à proposta de Dilma Rousseff de estender a fritura de cada um dos executivos, de Graça Foster em particular, e ainda adequá-la à sua conveniência de encontrar uma saída o menos traumática possível para nomear nova diretoria e ainda acertar os números do balanço trimestral da companhia.

O gesto não deixa de dar margem a essa interpretação. Inclusive porque, guardadas todas as proporções, lembraria a atitude da ex-ministra da Cultura Marta Suplicy, não obstante as diferenças abissais entre ambas. De propósitos e temperamentos. Algo, no entanto, une as duas: o limiar da desmoralização. Em Marta pesou a política; para Graça, de acordo gente próxima a ela, a fronteira de inadmissível ultrapassagem é a família.

Depois de tentar se demitir várias vezes e ter os pedidos recusados pela presidente, Marta tomou a decisão unilateral quando viu o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, sugerir a renúncia coletiva do ministério numa tentativa, segundo ela, de transformá-la de demissionária em demitida.

Ciente de seu desgaste, Graça Foster pediu para sair no meio da crise. Ela chegou a combinar com Dilma Rousseff duas datas: uma logo após as eleições, outra logo após a posse no segundo mandato. Ambas adiadas por solicitação da presidente.

Até que ocorreu o episódio da divulgação do balanço não auditado da Petrobras com aquele dado sobre a perda de R$ 88 bilhões em ativos. Os cálculos não estariam completos e Graça teria se precipitado ao autorizar a divulgação e Dilma, “furiosa”, decidiu demiti-la.

Seja como for, a executiva que aceitara atender aos apelos de amizade, na hora de ser descartada, não recebeu apreço em contrapartida. Ficou mal na história. Com pecha de incompetente e precipitada, para todos os efeitos imposta pela amiga. Mas, ainda assim, aceitou frequentar o limbo por mais um mês. Para resolver um problema da presidente.

Ali no ambiente do Palácio do Planalto deve ter-lhe parecido que 30 dias a mais ou a menos talvez não fizessem diferença. Brasília não é seu habitat. Mas o Rio de Janeiro é. Enquanto Graça Foster pegava o avião de volta para a cidade, um grupo de manifestantes fazia um “panelaço” nas proximidades de sua residência, em Copacabana.

Numericamente insignificantes, cerca de 30 pessoas. Simbolicamente, suficientes para criar constrangimento a quem, tendo feito carreira como servidora e não no embate duro da política, não está acostumada a ouvir frases como “Ô Graça Foster [...], o seu vizinho tem vergonha de você” nem a se expor a processos de desmoralização pública.

No entender de quem entende de Graça Foster, a preservação pessoal e o resguardo familiar pesaram mais na decisão que o acordo da lealdade de mão única da presidente Dilma.

Todos juntos, A explicação para cinco dos seis diretores da Petrobras terem acompanhado a presidente na renúncia é um acordo anterior de que ninguém ficaria ou sairia isoladamente. Fossem quais fossem os motivos.

Fábula. Ao governo interessará, quem sabe, construir a narrativa de que a renúncia de Graça Foster estava combinada com a presidente Dilma. O problema é que para que essa versão seja verossímil, o Planalto já deveria ter na manhã de ontem um nome escolhido para substituí-la na presidência da Petrobras.

O prejuízo político é do Planalto. Mais um.

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