- Folha de S. Paulo
• Em questão de horas, mudam o destino possível do governo e de seu pacote fiscal salva-vidas
O destino de Dilma Rousseff varia como o tempo paulistano, onde se acorda sob um céu de Londres e se dorme no Rio. O sucesso do impeachment e do pacote salva-vidas esquentou e esfriou em dois dias.
Considere-se.
Um. O PMDB está dividido. Em parte declara-se contra o impeachment, vide ontem o líder na Câmara, Leonardo Picciani, antes cunhista. Renan Calheiros amacia.
Dois. Dilma distribui carapuças de golpistas em discursos e promete luta feroz até na Justiça a fim de manter o cargo. A disposição de combate prenuncia ao menos risco de tumulto, o que pode dissuadir desafetos do conflito político e social aberto, como certa elite das classes conservadoras.
Três. Lula dava sinais de que desembarcaria do governo a fim de militar com a base social do PT, abrindo a campanha de 2018. Porém, ontem foi a Brasília reorganizar as últimas tropas, ajudar na "reforma ministerial" e a entregar mais cargos para o PMDB.
Quatro. O pacote fiscal ora parece desenganado, ora parece que sobreviverá com sequelas, não se sabe quão graves. O desmanche do pacote realimentaria a crise financeira (juros e dólar em alta), o que daria em recessão mais profunda e longa, provável fim de linha para Dilma.
Na segunda, Calheiros acolheu o pacote, que ontem porém passou a lhe parecer mais pestilento, dada a reação empresarial. Michel Temer mandou avisar da Polônia que apenas na segunda dá seu veredito.
Mas a equipe econômica defende seu plano bravamente. A maioria do PT ao menos deixou de avacalhá-lo, mas "movimentos sociais" vão espinafrá-lo na rua, um modo indireto de tocar fogo na cadeira de Dilma.
Cinco. O PSDB continua tripartido: Aécio, Alckmin e Serra mantêm estratégias incompatíveis. FHC leciona as condições do impeachment, ainda insatisfeitas : a) Perda da capacidade de governar; b) Acusação criminal contra Dilma; c) Liderança organizada para o pós-Dilma.
Isto posto, o cronograma da deposição legal continua a correr.
O plano de abertura do processo de impeachment caminha na Câmara, embora possa ser travado a qualquer momento.
Em outubro, o TCU envia ao Congresso o relatório que condena como criminosas as contas do governo Dilma 2014.
A partir de terça, o TSE pode abrir inquérito sobre a campanha Dilma 2014, acusada de abuso de poder. É o caminho da cassação da chapa, Dilma e Temer, improvável, mas bastante para criar tumulto grave.
A enchente da crise econômica continua a subir. O consumo de varejo por cabeça declina sem parar desde maio de 2014. Não é um desastre, pois até agora se regrediu ao nível ainda alto de 2013. Mas a piora é veloz. A confiança do consumidor continua na baixa recorde. Oferta e demanda de crédito declinavam ainda mais rapidamente ao final do segundo trimestre; não devem ter melhorado agora, ao contrário.
Dada a degradação financeira, a inflação alta baixará bem devagar, contribuindo ainda para a perda de renda real e para a manutenção dos juros na órbita da lua: sem alívio até ao menos meados de 2016. A alta do desemprego vai longe. Natal de 2016?
Não se sabe o quanto o povo furioso contribuiria para a queda de Dilma. Mas é ingrediente no forno, esquentando.
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