sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Miriam Leitão - Dimensões da crise

- O Globo

Crise pode eliminar quase 5 milhões de empregos entre 2014 e 2016. No período de dois anos, entre 2014 e 2016, estão entrando no grupo dos desempregados 4,7 milhões de brasileiros. A conta é do Ibre, da Fundação Getúlio Vargas. A crise bate nas famílias e nas empresas. Ontem, a Vale anunciou o prejuízo recorde de R$ 6,6 bilhões apenas no terceiro trimestre. O Banco Central avisou que a inflação vai demorar mais a chegar ao centro da meta.

Os tornados das crises política e econômica se misturaram definitivamente. O rombo das contas públicas aumentou com a necessidade de eliminar as pedaladas. Mas, mesmo sem isso, a Casa Civil já estima um déficit primário de R$ 50 bilhões este ano. Os atrasos no pagamento aos bancos públicos são o argumento para o novo pedido de impeachment. A inflação encosta em 10%. Isso eleva a insatisfação popular com o governo, mas o BC, paralisado pela conjuntura, deixa a meta para depois.

É o que temos no momento, avisa o Banco Central. Por um tempo “suficientemente prolongado” a inflação ficará acima do teto da meta e se aproximando dos dois dígitos em 2015. O Banco Central avisou que a convergência para o centro não ocorrerá mais em 2016, mas sim no “horizonte relevante para a política monetária”. Ou seja, ficou para 2017.

O desemprego medido pela PME ficou em 7,6%, estável em relação ao mês anterior, mas 2,7 pontos percentuais acima de um ano atrás. Este é um indicador parcial, coletado apenas em seis capitais, e vai deixar de existir em fevereiro, sendo substituído pela Pnad Contínua. O novo indicador é mais preciso e tem dado um número mais alto. Em entrevista concedida ontem no meu programa na Globonews, o economista Márcio Garcia, da PUC do Rio, chamou a atenção para o aumento do contingente de desempregados nas previsões da FGV.

O economista Rodrigo Leandro Moura, da equipe que fez a estimativa na Fundação, explicou que em números absolutos a projeção é de alta de 6,7 milhões de desempregados, em 2014, para 11,4 milhões, em 2016. Atualmente, está em 8,6 milhões, pela Pnad. Isso significa que quase 3 milhões podem entrar no grupo dos sem emprego.

— Ao contrário de anos anteriores, o desemprego vai subir no final deste ano, contrariando a sazonalidade, que geralmente é favorável nessa época. Para o ano que vem, projetamos uma taxa de 11,3% de desemprego — disse.

Para melhorar a situação econômica é necessário que o quadro político fique mais claro e desanuviado, e isso não temos no momento. O cientista político Carlos Pereira, da FGV, disse que, por enquanto, a chefe do executivo e o presidente da Câmara continuarão vivendo suas lutas pela sobrevivência, o que manterá o legislativo incapaz de analisar qualquer medida que encaminhe soluções para o quadro econômico.

Segundo Carlos Pereira, o regimento da Câmara dá um poder decisivo ao presidente da Casa sobre seu próprio destino: mesmo que o Conselho de Ética condene o deputado Eduardo Cunha, ele continuaria no cargo, porque decide a pauta e não colocaria o processo em andamento. Isso faz com que Cunha tenha poder para iniciar um processo de impeachment contra a presidente da República e para barrar o dele.

Na incerteza, o dólar permanece volátil e essa volatilidade vai fragilizando as empresas. A Vale enfrentou a queda do preço do minério de ferro, mas o que produziu a maior parte do prejuízo foi a instabilidade do dólar, que elevou o custo da sua dívida.

A presidente Dilma lutará pelo seu mandato diante de um quadro econômico que se deteriora rapidamente. O presidente da Câmara jogará com o poder que tem para neutralizar governo e oposição e assim salvar seu mandato. A economia continuará precisando de medidas legislativas para ter um horizonte de maior equilíbrio fiscal. Sem esse equilíbrio, a dívida continuará subindo.

Para recuperar a popularidade, a presidente necessita de melhoras econômicas. E isso, lembrou Márcio Garcia, depende de um ambiente mais favorável no Congresso. Ele disse que nesse impasse ninguém toma decisões de investimento ou consumo, nem são feitas as reformas de que o país precisa. O BC informou nas entrelinhas do seu comunicado que 2016 continuará sendo um ano difícil, e que a chance de sucesso só em 2017. Enquanto isso, a economia afunda, os trabalhadores perdem emprego, e as empresas se encolhem.

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