domingo, 15 de novembro de 2015

Em poucos minutos, noite em Paris passa da perplexidade ao horror

Lucas Neves – Folha de S. Paulo

PARIS - Às 21h20 de sexta-feira, 13 de novembro, no horário de Paris (18h20 de Brasília), quando a primeira explosão foi ouvida no Stade de France, em Saint-Denis (região metropolitana), três grupos de brasileiros jantavam ou passeavam em diferentes pontos da cidade, alheios aos acontecimentos.

Numa mesa na calçada diante do restaurante Le Petit Cambodge, no 10° distrito, uma turma de oito amigos, que incluía arquitetos, estudantes e psicanalistas, terminava de comer e aproveitava o ar "alegre, descontraído, juvenil" dessa região parisiense, nas palavras de um deles, o professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP José Lira.

Um pouco a sul, nos arredores da praça da Bastilha (11º distrito), o estudante de administração e negócios João Pedro Lima, 20, se preparava para sair do hotel com a mãe, a advogada Monica Lima, 50, rumo à rua Oberkampf, que concentra bares, restaurantes e casas noturnas muito frequentadas pelos parisienses na mesma área.

Dia seguinte aos atentados em Paris
Do outro lado do rio Sena, a fotógrafa brasileira Claudia Jaguaribe era a cicerone de um jantar para um grupo de cerca de 30 colegas de ofício vindos à cidade para uma grande feira de arte.

Às 21h25, o restaurante cambojano em que estavam os oito amigos foi alvejado por disparos de fuzil Kalachnikov disparados de dentro de um carro.

Quinze pessoas morreram. Na mesa brasileira, o arquiteto Gabriel Sepe, que viera à Europa apresentar um trabalho num congresso, levou três tiros nas costas e, na confusão, feriu a perna.

Já a mestranda em psicanálise Camila Issa foi atingida por sete tiros de raspão, segundo Lira, que conseguiu se abrigar num supermercado vizinho e, dez minutos depois, ao ser resgatado do esconderijo por bombeiros e policiais, avistou os amigos no chão, ensanguentados.

Estádio
A essa altura, já tinham ocorrido pelo menos mais três episódios de violência: uma segunda explosão no entorno do Stade de France (onde logo seria achado o corpo de um terrorista); um tiroteio a três quadras do Le Petit Cambodge, no bar Bonne Bière (cinco mortes); e um ataque a bala na rua de Charonne, no 11º distrito (19 mortos).

A polícia começava a bloquear ruas e avenidas, os primeiros relatos pipocavam nas redes sociais e na TV, o metrô passou a não parar nas estações próximas aos locais visados pelos terroristas –provocando resmungos de usuários que não sabiam do ocorrido na superfície.

Daí em diante, a perplexidade e as informações desencontradas nas ruas, na mídia e nas redes sociais evoluíam juntas, em progressão geométrica.

Por volta das 21h40, deu-se o ataque mais sanguinário: três homens invadiram a casa de shows Bataclan (num grande bulevard do 11º distrito) atirando. Foram confirmadas 89 mortes no local até a noite deste sábado (14).

A notícia então passou a se espalhar como rastilho de pólvora, e boatos proliferaram. Há quem diga que os terroristas saíram do alto de Belleville (no 20º distrito, extremo leste da cidade) fazendo uma razia, com vítimas na praça da República, no grande centro comercial e de lazer Les Halles (no 3º distrito).

E até no Trocadero, esplanada com vista privilegiada para a Torre Eiffel, do outro lado da cidade. Os rumores dão conta também de que havia quatro policiais mortos –no fim das contas, um policial de folga perdeu a vida.

Madrugada
O nervosismo dos agentes de segurança e das pessoas impedidas de circular ou simplesmente voltar para casa aumentava exponencialmente.

Numa rua perto do Le Petit Cambodge, policiais buscam explosivos embaixo de carros estacionados.



A um quarteirão dali, ao se aproximar de um grupo de jovens transtornados, a reportagem é firmemente repelida.

Isso é uma conversa de irmãos. Tire suas orelhas de perto. Não é o momento."

Restaurantes então fecharam as portas e, fosse o caso, levaram a clientela para caves e depósitos no subsolo.

Na internet, apareciam as primeiras hashtags de solidariedade: Portas Abertas, em que pessoas oferecem suas casas para quem está sem rumo na rua, será usada mais de um milhão de vezes na madrugada, segundo o "Figaro".

Por volta das 22h30, a notícia chegava ao jantar da fotógrafa Claudia Jaguaribe.

O galerista Paulo Kassab mandou a um dos convivas uma mensagem de voz dizendo que estava no Petit Cambodge na hora do ataque e que se protegeu atrás do balcão. Ao levantar, deparou com vários corpos.

A fotógrafa Betina Samaia, que veio lançar um livro na feira Paris Photo (suspensa desde então), ficou no apartamento até 0h30. Ontem, dizia não saber se adiantava o voo de volta para o Brasil, previsto para quinta.

"É uma coisa horrível. Aeroporto é visado. A gente não sabe onde mora o perigo."

Também às 22h30, João Pedro Lima e sua mãe chegavam ao bar brasileiro Barracão, na rua Oberkampf, de onde só conseguiriam sair às 2h.

As portas do estabelecimento foram baixadas quando funcionárias começaram a receber telefonemas de parentes contando o ocorrido.

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