- O Globo
A por enquanto incipiente manobra de aliados governistas em torno de um acordo para que a própria presidente Dilma convoque eleição presidencial antecipada — a se realizar juntamente com as eleições municipais em outubro deste ano — depende de duas coisas: que o processo de impeachment que já tramita no Congresso seja sustado, e que o vice Michel Temer aceite renunciar também.
Como se vê, há na proposta um golpe embutido, da mesma qualidade que a ideia de implantar-se o parlamentarismo ou o semiparlamentarismo, em meio ao mandato em curso. Não, não vai ter golpe. O que esses engenhosos políticos estão articulando é dar um fôlego à presidente Dilma até outubro, para que ela tente empinar seu governo para que o PT, provavelmente com Lula de candidato se ele não for condenado antes pelo juiz Moro, tenha alguma chance de reverter a situação atual.
E vai que, no meio do caminho, Lula recupera sua antiga verve e carisma, e convença a maioria dos brasileiros de que tudo o que a Operação Lava- Jato desvendou é uma grossa mentira. Nada indica que isso poderia acontecer, mas a esperança é a última que morre.
A Rede de Marina Silva, por exemplo, se sente atraída pela ideia de eleições presidenciais já, que em tese parece ser a melhor saída mesmo. Mas não há soluções legais para que isso aconteça, a não ser que se espere a decisão do Tribunal Superior Eleitoral sobre a campanha presidencial de 2014.
A questão do tempo decorrido pode não ser obstáculo legal, pois uma alteração no Código Eleitoral, feita em 2015, diz que a qualquer momento, menos a seis meses do fim do mandato, a substituição será por eleição direta: “Art. 224, parágrafos 3 e 4 do Código Eleitoral.
§3 º A decisão da Justiça Eleitoral que importe o indeferimento do registro, a cassação do diploma ou a perda do mandato de candidato eleito em pleito majoritário acarreta, após o trânsito em julgado, a realização de novas eleições, independentemente do número de votos anulados.
Parágrafo 3 º acrescido pelo art. 4 º da Lei n º 13.165/ 2015.
§4 º A eleição a que se refere o§ 3 º correrá a expensas da Justiça Eleitoral e será:
I – Indireta, se a vacância do cargo ocorrer a menos de seis meses do final do mandato;
II – Direta, nos demais casos. Parágrafo 4 º e incisos I e II acrescidos pelo art. 4 º da Lei n º 13.165/ 2015.”
Embora essa alteração no Código Eleitoral possa ser contestada no Supremo, já que a Constituição determina que a eleição seja indireta a partir do terceiro ano do mandato do presidente impedido, até agora isso não foi feito. E é difícil imaginar quem será a favor de uma eleição indireta pelo Congresso. Não vale pensar em Eduardo Cunha ou Renan Calheiros e similares, pois não terão força eleitoral para fazer vingar esse golpe.
A dificuldade aí parece ser a certeza de que o país não aguenta mais muito tempo sem direção. O impeachment é a saída constitucional mais eficaz e rápida para resolver um problema institucional sério. Não há mais dúvida de que existem motivos de sobra para o impedimento da presidente, falando-se apenas de crimes de responsabilidade.
Além das pedaladas, há no pedido da Ordem dos Advogados do Brasil ( OAB) dois outros crimes de responsabilidade cometidos pela presidente: as tentativas de obstruir a Justiça com a nomeação de Lula para seu Ministério, em vias de ser reconhecida pelo STF, e a pressão sobre um ministro do Superior Tribunal de Justiça ( STJ), relatada pelo senador Delcídio Amaral em sua delação premiada, para soltar empreiteiros presos na Operação Lava- Jato.
Mas, assim como o processo de impeachment não pode ser parado, também o do Tribunal Superior Eleitoral ( TSE) tem que continuar, com o perigo de que, com a impugnação da eleição de 2014, também Michel Temer perca seu lugar no Palácio do Planalto. Ou que a Operação Lava- Jato faça uma surpresa ao PMDB.
Se assim for, teremos novas eleições presidenciais e, por caminhos tortuosos, chegaremos a uma solução bem mais palatável sem recorrermos a atalhos que parecem bons dependendo de quem os defende, mas são na verdade tentativas de burlar a Constituição. No momento, no pós- impeachment cada vez mais provável, Temer será empossado presidente. Sem golpes.
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