- O Globo
Maria Silvia viveu este último ano entre vários fogos. Grande parte dos funcionários resistia às mudanças que ela tentava implantar no BNDES. Empresários diziam que o banco emperrava o crédito e isso dificultava a recuperação econômica. Moreira Franco dentro do Palácio repetia esses empresários. É isso que o governo acha que resolverá com o novo presidente. Foi então que a Lava-Jato se aproximou do banco.
O novo presidente, pelo perfil que tem, tentará se aproximar dos empresários e estimular o crédito. Dependendo de como fizer, será uma volta ao passado, mas não resolverá o problema da crise de confiança que leva ao subinvestimento. O grande problema continua sendo o que ronda o BNDES.
O BNDES entrou no centro da Lava-Jato nas últimas semanas. Houve a operação Bullish, que investiga supostas vantagens dadas ao grupo JBS e que questiona cláusulas dos empréstimos e de compras de debêntures e de ações do grupo. A delação de Joesley Batista escancarou. Ele disse com todas as letras que pagou propina em todas as operações feitas com o banco desde 2005, inicialmente a um emissário do ministro Guido Mantega, depois diretamente ao ex-ministro. Era 4% do valor da operação, depois passou a ser uma propina variável discutida caso a caso. Ele deu inúmeros detalhes.
Joesley disse que os funcionários não eram responsáveis pelos desvios, mas mesmo assim o corpo técnico passou a exigir da direção a defesa da instituição, e eles achavam que isso passava pela sustentação de que não houve erro nos empréstimos ou operações de equities. E claramente não se pode garantir isso. Até porque o próprio Joesley disse que as operações só saíam graças a Guido Mantega.
Ela sofreu resistência interna tão logo chegou. Quase 70% dos funcionários têm menos de 10 anos de casa, isso significa que só haviam trabalhado sob um presidente, Luciano Coutinho. Na gestão passada a ideologia dos campeões nacionais e do desenvolvimentismo dominava as mentes. Luciano fez sucessivos PDVs, reduziu o grupo mais velho que vinha de outras administrações e fez concursos para renovar o corpo de funcionários.
Maria Silvia chegou com outro discurso e outras propostas. Quis acabar com os departamentos e criar um novo desenho organizacional. Quis implantar variáveis como o retorno para a sociedade, ou a sustentabilidade como parte das pré-condições para os empréstimos. Tomou várias decisões modernizantes. Para começo de conversa, reduziu o espaço físico ocupado pela diretoria e acabou com as salas separadas de cada diretor. Ela e toda a diretoria ficavam num mesmo salão como acontece nas instituições financeiras modernas. Teve total liberdade para fazer a diretoria e levou vários diretores que não eram do quadro do banco.
Defendeu a proposta do governo de que o banco precisava devolver aos poucos os empréstimos gigantescos concedidos pelo Tesouro ao BNDES durante as gestões Lula e Dilma. E conseguiu devolver R$ 100 bilhões, dos R$ 500 bilhões que foram emprestados pelo Tesouro. Isso não foi bem recebido internamente, porque era entendido como se ela quisesse diminuir o tamanho do banco. Na verdade esse meio trilhão de reais transferidos à instituição foi um dos muitos absurdos da política econômica do primeiro mandato de Dilma.
Ela enfrentava também problemas externos. Empresários alegavam que os empréstimos estavam emperrados. Ela explicava que a demanda por financiamento caiu naturalmente com a recessão. Em entrevista ao “Valor”, em fevereiro, ela perguntou: “Estou travando crédito para quem?” Grandes tomadores do passado foram as empreiteiras, que agora, por estarem envolvidas na Lava-Jato, não podem ter empréstimos por razões legais. Na conversa entre Joesley e o presidente Temer no Jaburu, ele se queixa dela e diz que ela não estava conversando com os empresários.
A gestão Maria Silvia deu a Temer um grande argumento que ele tem usado em sua defesa. Foi da diretoria que ela presidiu que saiu a decisão de não aceitar a transferência do domicílio fiscal e da sede do grupo J&F para Irlanda e Reino Unido. Isso atrapalhou os planos do grupo. A defesa de Temer tem dito que tanto ele não favoreceu os irmãos Batista que os planos de transferência de ativos para o exterior foram frustrados.
A gestão de Paulo Rabello de Castro pode ser curta, se tiver como horizonte o governo Temer e como norte voltar à concessão de empréstimos favorecidos.
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