Em discurso durante cerimônia no Congresso para celebrar os 30 anos da Carta Magna, procuradora-geral da República, Raquel Dodge, diz que ‘não basta reverenciar’ o texto constitucional, é ‘preciso cumpri-lo’
Amanda Almeida, Catarina Alencastro, Eduardo Bresciani e Mateus Coutinho | O Globo
BRASÍLIA - Em solenidade no Congresso Nacional que celebrou os 30 anos da Constituição, o presidente eleito, Jair Bolsonaro, destacou em discurso que o cumprimento da Carta Magna será um “norte” a ser seguido em seu governo. Presidente do Supremo Tribunal Federal, o ministro Dias Toffoli, sentado ao lado de Bolsonaro na sessão, conclamou a sociedade, as instituições e os Poderes da República a se unirem. Presente à cerimônia, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, também saudou a homenageada do dia, enfatizando o papel do texto no reconhecimento da pluralidade “de crença e de opinião” e no “respeito às minorias”.
O presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), defendeu ontem, em solenidade no Congresso, o cumprimento da Constituição como um “norte” a ser seguido no futuro governo. O evento, com a participação de diversas autoridades, aconteceu em comemoração aos 30 anos da Carta Magna. Foi a primeira viagem dele depois da vitória na eleição, em 28 de outubro.
— Na democracia, só há um norte: o da nossa Constituição. Juntos, vamos continuar construindo o Brasil que nosso povo merece. Temos tudo para sermos uma grande nação. Alguns de nós podemos mudar o destino dessa grande nação. Acredito em Deus, acredito em nosso potencial —afirmou Bolsonaro, em discurso que durou cerca de tês minutos.
O presidente eleito também agradeceu a Deus por ter “salvo” a sua vida, em referência ao atentado a faca que sofreu em Juiz de Fora (MG), quando participava de um ato de campanha no início de setembro. Bolsonaro ouviu declarações em defesa da Constituição de todas as autoridades presentes.
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, destacou que celebrar a Carta é importante, mas não suficiente. Segundo ela, é necessário “guardá-la”.
— Não basta reverenciá-la em uma atitude contemplativa: é preciso cumpri-la à luz da crença de que os países que custodiaram escrupulosamente suas constituições identificam-se como aqueles à frente do processo civilizador e irradiadores de exemplaridade em favor das demais nações que hesitaram ou desdenharam em fazê-lo.
Para Dodge, a conduta frente à Carta se reflete na imagem das instituições:
—Os frutos deste comportamento estatal em relação à Constituição são colhidos diretamente pelo povo, que se orgulha ou se envergonha de suas instituições.
‘RESPEITO ÀS MINORIAS’
A procuradora-geral também defendeu a liberdade de imprensa e a autonomia das universidades.
— A Constituição garante autonomia universitária para que a inovação, o saber e o aprendizado desenvolvam-se sem amarras. O governo de leis promove paz e estimula a concórdia. Numa nação de imigrantes e nativos, a Constituição reconhece a pluralidade étnica, linguística, de crença e de opinião, a equidade no tratamento e o respeito às minorias. Garante liberdade de imprensa para que a informação e a transparência saneiem o conluio e revelem os males contra os indivíduos pelo bem comum.
Antes do discurso de Bolsonaro, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, afirmou que, passado o período eleitoral, o Brasil “precisa encontrar um ponto de união em meio às diferenças, como é próprio do estado democrático de direito”.
— A sociedade, suas instituições e os Poderes da República devem voltar a se unir para pensar no desenvolvimento do país. É o momento de a política voltar a liderar as grandes questões da nação para podermos voltar à clássica divisão dos Poderes: cabe ao Executivo cuidar do futuro, o Legislativo do presente e ao Judiciário dirimir conflitos do passado —afirmou.
O ministro defendeu a necessidade de reformas:
— O grande desafio que a Constituição Federal tem hoje é o de se renovar em aspectos que permitam o crescimento econômico e a responsabilidade fiscal. Esse é o desafio diante da nação. Precisamos de uma reforma da Previdência para fazer frente ao aumento da expectativa de vida no país e uma reforma que promova simplicidade e eficiência no sistema tributário e fiscal.
Toffoli ficou sentado ao lado de Bolsonaro durante o discurso. Na reta final da campanha, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente eleito, teve que se explicar por ter dito que bastava um cabo e um soldado para fechar o STF.
A cerimônia foi aberta pelo presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDBCE), que não conseguiu a reeleição. O senador se dirigiu a Bolsonaro durante o discurso ao afirmar que, dentro do texto constitucional, é possível encontrar todas as saídas necessárias para levar o país ao caminho do crescimento.
— Nela (Constituição), presidente eleito, Jair Bolsonaro, vossa excelência encontrará o enquadramento jurídico necessário para o Brasil encaminhar o círculo virtuoso de desenvolvimento sustentável. Este não é apena o meu sonho: é o sonho de todos nós — disse Eunício.
Eunício também criticou a tentativa da equipe de Bolsonaro de barrar a entrada de jornalistas na cerimônia e disse que a imprensa poderá circular livremente na posse do presidente eleito:
— Enquanto eu for presidente, nem Trump, Bush, Hillary, Zezinho, Manoelzinho... (barram a imprensa). Essa aqui é a casa da democracia. A Constituição libertou o Brasil. Os constituintes trabalharam muito para libertar o Brasil de um outro momento.
Já o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEMRJ), disse que a Constituição tem se mostrado mais forte e resistente às críticas e aproveitou para defender a necessidade de uma reforma da Previdência, o que só pode ser feito via emenda constitucional:
— O fato de não querermos uma nova Constituição não é uma forma de negar a necessidade de reformas. Mudam seu texto para ela possa permanecer, alteram seu texto para fortalecer seus princípios.
O presidente Michel Temer defendeu que haja encontros periódicos entre os chefes dos Três Poderes. O presidente disse ainda que o Executivo, Legislativo e Judiciário são independentes, mas devem ser harmônicos. E ressaltou que “não há caminho fora da Constituição”.
— Somos autoridades constituídas. Não somos titulares do Poder. Titular do Poder é o povo. Mas é preciso, como somos órgãos exercentes do Poder, fazer aquilo que nosso ministro (Dias) Toffoli está dizendo: encontros entre os Poderes do estado —disse Temer.
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