- O Estado de S.Paulo
Não há um momento de trégua entre o governo e os líderes do Congresso
É inacreditável que depois de a pandemia do coronavírus mostrar a sua cara no Brasil, ameaçando a população e derrubando o Produto Interno Bruto (PIB) do País, ainda se veja uma sequência de bate e apanha entre governo e Congresso.
Não há um momento de trégua entre as duas partes para, juntas, traçarem uma estratégia de votação de projetos importantes para o País segurar o tranco enquanto os efeitos da pandemia estiverem por aí.
Dane-se a população.
Um plano de contingência para as próximas votações já deveria estar sendo traçado. E não só para avançar nas ditas reformas, mas também para a votação dos créditos extraordinários e as medidas de curto prazo que o governo deverá enviar ao Congresso para atender as necessidades mais urgentes do combate do vírus em várias frentes.
De um lado, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), cobra de Paulo Guedes responsabilidade para anunciar um plano organizado e eficiente. Em seguida, Guedes responde a Maia cobrando do Congresso avanço das reformas.
Assim, os dias estão se passando sem que nada aconteça de fato. Só elencamos até agora frases de efeito de cada lado, que alimentam os cliques das redes sociais.
Alguém já se perguntou como ficará o quadro se o presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (DEM-AP), tiver que suspender as sessões?
Parlamentares com mais idade, preocupados com o risco de contaminação, já pediram ao presidente Alcolumbre que tome essa decisão.
Mesmo de forma precária e desorganizada, a equipe econômica, que conta na sua retaguarda com técnicos de carreira experientes (muitos já passaram pelas últimas grandes crises em vários governos do PSDB, PT a Bolsonaro), começou a organizar a sua reação. E a Câmara e o Senado? Em outros países o Parlamento está ajudando. A responsabilidade é de todos.
Quem viveu a crise financeira internacional de 2008, que abalou os alicerces do mercado financeiro mundial, lembra que a reação brasileira à crise não foi assim tão imediata. As medidas foram surgindo. É um processo, mesmo. Cheio de trancos.
Apesar da urgência do momento, não se tira medidas de socorro, com implicações diversas na economia, da noite para o dia.
As primeiras medidas já foram anunciadas. O mais importante nesse primeiro momento é garantir todo dinheiro necessário para que população tenha acesso a tratamento eficiente nos hospitais públicos; que, caso haja uma expansão do coronavírus, com a necessidade de maior isolamento das pessoas, não falte comida e produtos de primeira necessidade.
Crédito, socorro e subvenções temporárias vão aparecer no cardápio, se a crise piorar. Que ninguém se engane disso. Mas precisa ser de forma organizada.
É bem verdade que o presidente Jair Bolsonaro atrapalha o avanço da agenda econômica. Isso não é novidade. Assinou um projeto que selaria um acordo com o Congresso para o impasse em torno das novas regras do Orçamento, que dão mais poder ao relator, Domingos Neto (PSD-CE), e depois voltou atrás.
Dar mais poder ao relator do Orçamento, mesmo diminuído as suas emendas de R$ 30 bilhões para R$ 15 bilhões, significa dar mais poder a Maia, Alcolumbre e aos seus líderes e retirar dos parlamentares que são opositores a eles no Congresso.
É preciso ficar claro que a guerra pelo poder de mando do dinheiro do Orçamento não é só entre Bolsonaro-Guedes versus Congresso. É uma briga também entre o alto e o baixo clero.
À medida que as regras do Orçamento impositivo foram sendo construídas ao longo dos últimos anos (vale muito a pena a leitura do material especial produzido pelo portal do Estado na internet sobre a linha do tempo desde a sua semente em 2009), os mecanismos de controle dos líderes por meio das emendas também diminuíram.
Com um governo medíocre na articulação política, o alto clero abocanhou para si uma fatia maior do Orçamento por meio das emendas de relator. O relator representa o alto clero. É, por isso, que a briga continua. Bolsonaro, Guedes, Maia, Alcolumbre, baixo clero. Já estamos na metade de março. Até quando?
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