2021
pede sabedoria tática, que passa por denunciar a política destrutiva de
Bolsonaro
A
virada do ano confirmou, para mim, as prioridades que me parecem óbvias no
Brasil de 2021: vacinação em massa e retomada da economia com ênfase em
sustentabilidade e responsabilidade social. Uma retomada verde.
No
entanto, não adianta muito pura e simplesmente repetir prioridades. Em primeiro
lugar, não significam tudo e, em segundo, não resolvem as emergências.
A
pandemia voltou a se agravar, com o aumento de casos em dezembro. A expectativa
de alguns cientistas é de que tenhamos um dos mais tristes janeiros da
História.
Respondendo
a uma pergunta do deputado Ivan Valente (PSOL-SP), a comissão do governo
encarregada do tema afirmou que não havia previsão de uma segunda onda de
coronavírus no País. Isso significa que a existência real de uma segunda onda, agravada
pelos excessos das festas de fim de ano, vai se desenrolar diante da
indiferença do governo em Brasília.
Nessas circunstâncias, a vacina e a retomada verde não produzem um milagre. O caso da Inglaterra revela como o processo de vacinação, sobretudo na fase inicial, não transforma a realidade.
Os
ingleses já estão usando dois tipos de vacina, Pfizer e Oxford, mas foram
obrigados a decretar de novo um lockdown.
De certa forma, tudo se paralisa de novo. Pesou na decisão inglesa a existência
de uma nova cepa do coronavírus com capacidade de contaminação, segundo os
cientistas, 70% maior que as outras.
No
Brasil, por falta de recursos, há menos pesquisas genéticas sobre os tipos de
corona que circulam entre nós. Mas, de qualquer maneira, os ingleses reagiram
não somente porque havia uma nova cepa, e sim porque havia um aumento
substancial de casos.
É
o que acontece no Brasil, um aumento de casos. Ao negar a existência de uma
nova onda, o governo prossegue na sua posição inicial de negar a importância da
pandemia, justamente quando chegamos ao patamar de 200 mil mortos.
Assim
como sua inércia pode enfraquecer o estímulo que a imunização nos trará, a
incompetência mais ampla transformou o processo de vacinação brasileiro num
drama patético. Os órgãos de imprensa no Brasil conseguiram criar um consórcio
que informa o número diário de mortos e contaminados. Ainda não é possível,
todavia, mostrar com clareza todos os meandros desse labirinto que é o futuro
processo de vacinação no Brasil.
O
presidente Bolsonaro é o único estadista no mundo a ter uma visão negativa da
vacina. Sua posição, revelada inúmeras vezes, é a de investir em remédios. Ele
também é o único a suspeitar que a vacina traga efeitos adversos, até mesmo
transfigurando a pessoa em jacaré.
Ele
não tem força para negar totalmente a vacina. Contenta-se em empurrar com a
barriga. Isso nos coloca diante de uma encruzilhada. Será preciso
simultaneamente realizar o processo de vacinação e cobrar de Bolsonaro sua
responsabilidade histórica.
Para
que isso se concretize de forma mais eficaz é preciso uma aproximação da
sociedade, do Parlamento, da Justiça, todos com uma visão clara de como
pressionar e, simultaneamente, colher as peças de acusação.
Se
Bolsonaro é o principal adversário da prioridade número um, o que dizer da
outra, a retomada verde?
Nunca
houve na História recente tamanha disponibilidade de capitais, uma conjunção de
políticas públicas tão favoráveis ao desenvolvimento sustentável. Trilhões
estão à espera de boas oportunidades para investimento em recursos naturais.
Vê-se hoje nos jornais algo que era difícil no passado. O interesse de Wall
Street pelo Rio Colorado, por exemplo.
Os
recursos naturais, que ontem eram vistos apenas como um acessório da produção,
passam a ser considerados importantes fontes de riqueza. E apesar de suas
dificuldades momentâneas, o Brasil, assumindo-se como potência ambiental, tem
diante de si um tipo de futuro muito mais promissor do que os constantes voos
de galinha.
Mas
esbarramos de novo no grande obstáculo: Bolsonaro. Ele tem uma visão de
crescimento econômico típica do século passado. Na verdade, talvez não a tenha
muito articulada, mas reage às aspirações imediatistas de alguns produtores
rurais que o apoiam.
Esse
é o quadro do conflito em 2021. Bolsonaro segue negando a emergência na
pandemia, arrasta o processo de vacinação e fecha o Brasil para as imensas
oportunidades de investimento externo.
Portanto,
é um ano que pede muita sabedoria tática. Ela implica pressão para que as
prioridades nacionais sejam cumpridas e, ao mesmo tempo, confronto com o grande
obstáculo. Como são questões de vida ou morte, até determinando nosso nível de
mobilidade, de associação, de presença física, não é possível dissociá-las.
A
campanha pela vacina é, ao mesmo tempo, uma campanha contra a indiferença de
Bolsonaro. A tentativa de preservar nossos recursos naturais e transformá-los
em nossa máxima riqueza passa por denunciar a política destrutiva de Bolsonaro.
Quando existe um obstáculo tão nítido diante de nós, é possível que exista também a possibilidade de ignorar pequenas diferenças, ressentimentos, vaidades. Que a força da vida nos guie a todos em 2021.
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