quinta-feira, 1 de abril de 2021

Bruno Boghossian – O caos de Bolsonaro

- Folha de S. Paulo

Sirenes soam apenas quando presidente quer fazer propaganda do risco de desordem

Em um ano, Jair Bolsonaro falou uma dezena de vezes na ameaça de caos social na pandemia. Para torpedear medidas de distanciamento, o presidente repetiu que o país pode ter uma onda de violência e saques a supermercados. Nesse período, ele escolheu o lado do "caos" e deixou o "social" em segundo plano.

As sirenes de Bolsonaro soam apenas quando ele quer fazer uso político do risco de desordem. No início da pandemia, o presidente fez corpo mole na compra de vacinas que poderiam garantir uma volta segura ao trabalho. Agora, na pior fase da crise, o governo levou três meses para pagar uma nova rodada do auxílio emergencial e proteger quem foi afetado pelo isolamento.

Bolsonaro se lembrou da miséria nesta quarta (31), ao atacar o lockdown. Ele afirmou que "a fome está batendo cada vez mais forte" e disse temer "problemas sociais gravíssimos". Em vez de apresentar soluções, ele agiu como espectador: "Se a pobreza continuar avançando, não sei onde poderemos parar".

O governo tem um problema de ordem prática, que é a falta de dinheiro para lançar um programa robusto de socorro a quem precisa ficar em casa. Mas Bolsonaro se recusa a enfrentar a emergência econômica porque está concentrado em transferir as responsabilidades da pandemia para seus adversários políticos.

A propaganda do caos faz parte dessa campanha. O Brasil tinha 59 mortos por Covid-19 quando Bolsonaro lançou o perigo de saques a supermercados, em março do ano passado. Dias depois, ele publicou um vídeo que mostrava um falso desabastecimento de comida numa central de Minas Gerais. Há três semanas, ele citou o risco de "fogo em ônibus, greves, piquetes, paralisações".

O caos é também o ambiente ideal para as aventuras autoritárias com que Bolsonaro sonha. Quando fala dos brasileiros que ficaram sem trabalhar e desenha o risco de desordem, ele costuma citar medidas duras que podem ser tomadas contra o isolamento. A principal oferta do presidente nessa hora é a repressão.

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