Folha de S. Paulo
Recusa obstinada deve ser vista como
autossacrifício pela melhoria da espécie
O Brasil está atrasado, mas vários países
de renda alta e média já vão batendo no teto da vacinação contra a Covid, isto
é, aquele ponto em que a cobertura deixa de avançar, embora haja doses
disponíveis para quem deseje tomá-las. Características culturais fazem toda
diferença. Israel, que saiu na frente na imunização, estacionou na casa dos 60%
da população totalmente imunizada. A cobertura é alta para os idosos, mas entre
os jovens a hesitação vacinal é grande.
Algo parecido vale para os EUA, que também largaram bem, mas pararam nos 55%. O que chama a atenção ali é a diferença de cobertura entre estados, que parece obedecer a padrões geográficos e políticos. A Europa ocidental, que, como o Brasil, começou mal, agora se encontra numa situação bem mais confortável. O destaque positivo é Portugal, que já vacinou mais de 80%. Mesmo a França, onde se temia forte resistência à vacinação, já ultrapassou os 60%.
O problema é que taxas de 60% e de 70% de
totalmente imunizados ainda são insuficientes para
que se atinja a tão almejada imunidade coletiva. Estima-se que, para
alcançá-la, teríamos de vacinar mais de 95% da população. Difícil acontecer.
O mais provável, portanto, é que tenhamos
de nos conformar com uma realidade pós-pandêmica em que o vírus ainda
circulará, embora com menos intensidade e causando muito menos destruição. Para
que isso ocorra o quanto antes, porém, os países precisam avançar mais na
imunização. Na minha opinião, quase todas as armas são válidas: campanhas
educativas, prêmios, exigência de atestado para frequentar certos lugares e até
a demissão
por justa causa em algumas funções. Eu só descartaria mandar a polícia
pegar os recalcitrantes a laço.
O Estado deve oferecer e convencer. Na
emergência, pode pressionar. Mas, a partir de certo ponto, a recusa obstinada
deve ser interpretada como um autossacrifício darwiniano pela melhoria da
espécie.
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