sexta-feira, 22 de outubro de 2021

Bruno Boghossian - A turma 'eu votei no Guedes'

Folha de S. Paulo

Investidores e simpatizantes terão que decidir até onde vão carregar a defunta agenda ultraliberal

A turma que dizia "eu votei no Paulo Guedes" e tentava camuflar o apoio a Jair Bolsonaro em 2018 parece ter entrado numa fria. Depois que o ministro aceitou profanar um dos principais dogmas da cartilha ultraliberal, alguns investidores, empresários e simpatizantes terão que decidir até que ponto aceitam carregar o caixão em que essa agenda repousa.

Bolsonaro e o núcleo político do governo instalaram uma chaminé no teto de gastos. A ideia é escapar da regra que limita o aumento de despesas e ampliar o Bolsa Família até o fim do mandato. Guedes repetia que desrespeitar o mecanismo seria irresponsável e ameaçou ir para casa se o governo recorresse a estripulias. Agora, ele endossa a confusão.

Gente endinheirada e uma parcela do eleitorado celebravam Guedes como uma âncora que estabilizaria o governo Bolsonaro. O economista neutralizaria um capitão que fez carreira em defesa do intervencionismo, defende a ditadura militar e governa a favor do morticínio.

O ministro implantou sua agenda, mas acabou anulado. Ele se tornou uma peça supérflua desde que Bolsonaro se agarrou ao centrão. Se o presidente realizar a façanha de despejar gastos, recuperar popularidade e conseguir mais um mandato, o cenário estará consolidado. O Congresso dará as cartas e Guedes ficará fora da Esplanada dos Ministérios.

O rompimento inevitável deveria embaraçar uma parte dos defensores da plataforma econômica liberal. Com a exceção de devotos que erguem estátuas do economista na Faria Lima, quem controla o dinheiro agora trabalha para fabricar um candidato da chamada terceira via que possa herdar essa bandeira.

Há sinais, no entanto, de que muitos desse grupo estão dispostos a repetir a dose. O presidente ainda é o candidato favorito dos mais ricos (42% dos votos no primeiro turno), enquanto os nomes da centro-direita não têm votos de ricos nem de pobres. Num segundo turno contra Lula, os tais eleitores de Guedes deverão ter a oportunidade de, finalmente, votar em Bolsonaro.

 

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