Folha de S. Paulo
Investidores e simpatizantes terão que
decidir até onde vão carregar a defunta agenda ultraliberal
A turma que dizia "eu votei no Paulo
Guedes" e tentava camuflar o apoio a Jair Bolsonaro em 2018 parece ter
entrado numa fria. Depois que o ministro aceitou profanar um dos principais
dogmas da cartilha ultraliberal, alguns investidores,
empresários e simpatizantes terão que decidir até que ponto aceitam
carregar o caixão em que essa agenda repousa.
Bolsonaro e o núcleo político do governo instalaram uma chaminé no teto de gastos. A ideia é escapar da regra que limita o aumento de despesas e ampliar o Bolsa Família até o fim do mandato. Guedes repetia que desrespeitar o mecanismo seria irresponsável e ameaçou ir para casa se o governo recorresse a estripulias. Agora, ele endossa a confusão.
Gente endinheirada e uma parcela do
eleitorado celebravam Guedes como uma âncora que estabilizaria o governo
Bolsonaro. O economista neutralizaria um capitão que fez carreira em defesa do
intervencionismo, defende a ditadura militar e governa a favor do morticínio.
O ministro implantou sua agenda, mas acabou
anulado. Ele se tornou uma peça supérflua desde que Bolsonaro se agarrou ao
centrão. Se o presidente realizar a façanha de despejar gastos, recuperar
popularidade e conseguir mais um mandato, o cenário estará consolidado. O
Congresso dará as cartas e Guedes
ficará fora da Esplanada dos Ministérios.
O rompimento inevitável deveria embaraçar
uma parte dos defensores da plataforma econômica liberal. Com a exceção de
devotos que erguem estátuas do economista na Faria Lima, quem controla o
dinheiro agora trabalha para fabricar
um candidato da chamada terceira via que possa herdar essa bandeira.
Há sinais, no entanto, de que muitos desse
grupo estão dispostos a repetir a dose. O presidente ainda é o candidato
favorito dos mais ricos (42% dos votos no primeiro turno), enquanto os nomes da
centro-direita não têm votos de ricos nem de pobres. Num segundo turno contra
Lula, os tais eleitores de Guedes deverão ter a oportunidade de, finalmente,
votar em Bolsonaro.
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