Folha de S. Paulo
Corte de lucro sugerido pelo presidente é
uma espécie de doação de campanha descontada no caixa
Quando a cesta básica bateu R$ 560 em São
Paulo, no primeiro ano da pandemia, Jair Bolsonaro sugeriu aos donos de
supermercados que tivessem
lucro "próximo de zero" na venda de alimentos. Desde então, os
preços subiram outros R$ 200, e o presidente teve uma ideia inovadora: nesta
quinta-feira (9), ele pediu ao setor que tivesse o "menor lucro
possível" nesses produtos.
Bolsonaro não fez muito mistério sobre o
que estava por trás do apelo. Num
evento com empresários, ele disse que era preciso dar uma satisfação à
população mais pobre. Aproveitou para apresentar sua plataforma eleitoral,
tentou se contrapor ao que chamou de "o outro lado" e disse que a
ajuda fazia parte de um esforço para "continuar o governo".
A interpretação é simples: o presidente quer que os donos de supermercados cortem os próprios lucros para melhorar o ambiente político a favor de sua reeleição. Na prática, ele pediu uma espécie de doação de campanha, descontada diretamente do caixa das empresas.
O plano recebeu o endosso do ultraliberal
Paulo Guedes. O ministro foi ainda mais explícito em relação aos propósitos do
governo. Afirmou que "é hora de dar um freio nessa alta de preços" e
acrescentou que os empresários deveriam se sentir livres para fazer novos
aumentos a partir de 2023 —ou seja, depois da eleição.
Por três anos e meio, o governo encarou a
agenda econômica como um projeto ideológico, tratando os itens que afetam os
mais pobres com uma atitude que oscilava entre a má vontade e o puro improviso.
Foi assim nas
primeiras discussões sobre a criação do auxílio emergencial na
pandemia e é assim agora, com uma dose extra de desespero e um apelo ao
represamento de preços.
Bolsonaro sabe que a defesa das armas, o discurso preconceituoso e as constantes ameaças autoritárias são úteis para manter sua base política coesa. Mas já percebeu também que, num país em que 33 milhões de pessoas passam fome todos os dias, a bandeira do liberalismo não vale meia dúzia de votos.
Um comentário:
É claro que passar fome no verão é muito ruim,mas no inverno o apetite aumenta.
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