Correio Braziliense
O Brasil debate a necessidade de
federalizar a segurança no Distrito Federal, mas continua resistindo em debater
a necessidade de federalizar a educação das crianças brasileiras. Com o
vandalismo golpista em 8 de janeiro, percebeu-se o risco de deixar a segurança
da capital de 210 milhões de brasileiros nas mãos de um governador eleito
apenas por 2 milhões de brasilienses.
O Brasil desperta para o risco de deixar a segurança da República nas mãos de um governador eleito apenas pelos brasilienses, mas não percebe os riscos de deixar a educação de suas crianças nas mãos de prefeitos sem recursos suficientes, nem vontade para implantar um sistema municipal de máxima qualidade e equidade, independentemente da renda e do endereço da criança. Sem isso, os destroços sociais continuarão sendo provocados permanentemente. No lugar do vandalismo golpista terrorista de prédios públicos, móveis e obras de arte, que desrespeita as instituições, os destroços sociais da pobreza, desigualdade, ineficiência e injustiças destroem a cara e o futuro do país. Da mesma maneira que se defende a federalização da segurança no DF para evitar novos ataques aos prédios públicos, o Brasil precisa defender a federalização da educação que deixa o país vandalizado pelo analfabetismo, a educação de base inconclusa ou de má qualidade, deixando uma população despreparada para o mundo contemporâneo.
Os municípios não dispõem de recursos para
oferecer educação de qualidade a todas as suas crianças e suas receitas são
desiguais, o que faz impossível a equidade nacional, se depender de cada
cidade. Só a federalização será capaz de levar o Brasil a dar o necessário
salto na qualidade e na equidade da educação em todo o território nacional.
Essa proposta tem sido identificada nacionalmente com Brasília. Sua concepção e
defesa têm sido feitas por um político eleito pelo DF. O primeiro passo
concreto nesse sentido foi a Lei nº 11.738 de 2008, de minha autoria,
determinando o Piso Nacional para o salário do professor, nenhum deles ganhando
menos do que o valor nacional, estipulado pelo Congresso para toda a República.
Com base na lei, todo janeiro, o piso é
elevado para o Brasil, independentemente da unidade federal onde o professor
atua. Desde então, todos os presidentes cumpriram o que está determinado.
Nesses 15 anos, o piso salarial do professor subiu de R$ 950,00 para R$
4.420,55, conforme decreto do ministro Camilo Santana. Isso representa 365,3%
de diferença, enquanto a inflação no período foi de 114,6%, o que demonstra
que, embora ainda seja menor do que deveria, houve valorização nacional do
magistério, que não ocorreria sem uma lei federal, originada no DF e sancionada
pelo então presidente Lula, na gestão de Fernando Haddad no Ministério da
Educação.
Mas estamos longe do que é preciso.
Primeiro, porque centenas de municípios não
têm condições de pagar o valor determinado pelo governo federal. Isso ocorre
porque o Congresso não deu continuidade à Proposta de Emenda à Constituição PEC
32/2013, também de minha autoria quando senador, que daria ao governo federal a
obrigação de pagar o valor do piso a cada professor, liberando a
responsabilidade do prefeito e do governador, e dando-lhes a possibilidade de
ampliar o valor do salário, com recursos de sua receita.
Segundo, para dar o salto educacional e
levar a educação aos padrões das melhores do mundo, será preciso uma estratégia
para, em 20 a 30 anos, irmos além da unificação nacional do Piso Salarial e
definirmos uma Carreira Nacional Única para todos os professores. Cada um seria
funcionário do Brasil, e não apenas da prefeitura onde trabalha. Fazer com
todos eles o que já fazemos com as professores das universidades, dos
institutos tecnológicos e das escolas federais.
Sem esses passos, o Brasil continuará tendo
seu futuro vandalizado pelo terrorismo educacional: o descuido com a educação
de nossas crianças. Ao olhar as consequências do vandalismo do dia 8 de
janeiro, o Brasil despertou para a necessidade de federalizar a
responsabilidade com a segurança pública em Brasília. Basta olhar para as
consequências do vandalismo educacional de décadas sobre o intelecto de nossa
população para percebermos a necessidade de o Brasil seguir a sugestão nascida
em Brasília e federalizar a educação de base de nossas crianças.
*Cristovam Buarque - Professor emérito da Universidade de Brasília (UnB)
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