terça-feira, 24 de janeiro de 2023

George Gurgel* - Os desafios da sustentabilidade antes e além de Davos

Na última sexta-feira, dia 20 de janeiro, aconteceu mais uma edição do Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça, que teve como tema “Cooperação em um mundo fragmentado”.

Durante os debates realizados, constatou-se, de maneira inequívoca, o aumento de concentração da riqueza mundial nos últimos dois anos, desde o início da pandemia, ampliando de maneira preocupante a distância entre os mais pobres e os mais ricos do mundo, desnudando a insustentabilidade da sociedade contemporânea. 

Estamos vivendo uma situação mundial de crises econômica, social e ambiental, a exemplo da crise climática, do aumento da fome, do desemprego, ampliando de maneira preocupante os impactos sociais, econômicos e ambientais da população mundial e brasileira.

Coloca-se como nunca o imperativo de defesa e ampliação da democracia como caminho de novas relações políticas, econômicas e sociais a favor da vida e da preservação do planeta. A possibilidade desta construção alternativa tem como fundamentos a valorização de cada ser humano, do próprio planeta, colocando para esse século XXI, de uma maneira inadiável, a superação das fragilidades dos nossos sistemas político, econômico, social e ambiental no Brasil e no mundo.

Os aumentos de concentração da pobreza e da riqueza, nos últimos dois anos, anunciados na reunião de Davos, impõem uma necessária reflexão e ação individual e coletiva da sociedade brasileira e mundial sobre os desafios a serem enfrentados em uma perspectiva sustentável. Como nos colocamos? O que temos a dizer como sociedade brasileira e mundial?

Neste contexto, no Brasil, o que anuncia o atual governo federal e as forças políticas que construíram a vitória eleitoral de Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno das eleições presidenciais? Qual é o espaço de participação efetiva da sociedade e da cidadania neste processo.

Ainda, o que cabe e o que não cabe na Agenda para a almejada sustentabilidade política, econômica, social e ambiental brasileira?

As discussões e as declarações de Davos deveriam considerar e apontar soluções para a superação das crises política, econômica, social e militar internacional em função da guerra Rússia-Ucrânia, que se arrasta por mais de um ano. A Ucrânia vem sendo apoiada militarmente pelos Estados Unidos e a OTAN, sinalizando para uma guerra de longa duração. São centenas de milhares de pessoas mortas, causando a destruição de cidades, patrimônios naturais, culturais e materiais, ampliando as crises política, econômica, social e ambiental da Europa, com reflexos preocupantes a nível mundial.

As relações conflituosas entre o Ocidente e o Oriente, os EUA e a Europa com a Rússia e a China, a própria guerra Rússia-Ucrânia e dezenas de outros conflitos regionais, assim como o anacrônico bloqueio a Cuba, refletem e colocam em evidência a necessidade de um reordenamento do cenário político internacional, a ser pautado pela multipolaridade, respeito à diversidade política, econômica, cultural e espiritual da humanidade.

Portanto, a atualização das  agendas das organizações multilaterais, a exemplo da ONU, FMI, Banco Mundial, OIT, são fundamentos na perspectiva de resolução dos atuais problemas da humanidade: a exclusão de bilhões de pessoas da vida política, econômica e social, o direito à vida, moradia, alimentação, trabalho, renda, saúde, mobilidade; no caminho de uma agenda propositiva que enfrente com a urgência diagnosticada em Davos, os problemas econômicos, sociais e ambientais que excluem  uma boa parte da humanidade, e, ao mesmo tempo, ampliar ações, já conhecidas há décadas, para a melhoria climática do planeta e a  conservação dos seus ecossistemas, a exemplo da Amazônia,  cujo desmatamento  acelerado, nos últimos anos, tem colaborado para o aumento da temperatura regional e planetária.    

E o day after

A reunião em Davos realizou debates e fez declarações alarmantes e preocupantes: a taxação da riqueza das grandes fortunas vai ser para valer, inclusive com a concordância e a sinalização de alguns bilionários do mundo, segundo informações do próprio Fórum, sem adesão de nenhum brasileiro.  Como vai ser a gestão destes fundos bilionários? Quais são as efetivas medidas mitigadoras a serem implementadas em prol da sustentabilidade do planeta no caminho do enfrentamento da excludente realidade econômica, social e ambiental de uma boa parte da humanidade, nos continentes africano, asiático e na América.

Antes e além de Davos, a sociedade mundial e nacional estão desafiadas ao enfrentamento dos reais problemas cotidianos, de superação da nossa difícil realidade social, econômica e ambiental que exclui a maioria da população das conquistas sociais modernas. O cotidiano das ruas e das redes apresentam a tragédia social de bilhões de pessoas em todo o planeta, excluídas do direito ao trabalho, alimentação, moradia, saúde-saneamento, educação, cultura e mobilidade urbana.

A sustentabilidade como possibilidade

Há inadiáveis demandas cotidianas a favor da cooperação, da solidariedade, da luta pela igualdade, liberdade, fraternidade e na relação do ser humano com a própria natureza – a casa de toda a humanidade. A realidade grita a favor dos excluídos, nos agride com as cotidianas contradições econômicas e sociais da sociedade contemporânea, desnudadas com a pandemia.

A ciência, aliada ao conhecimento ancestral, de uma maneira diversa e complementar, são os fundamentos e o caminho da sustentabilidade humana e planetária. São elementos estratégicos para a sobrevivência do planeta e da própria humanidade. Imprescindíveis, frente aos negacionismos e aos populismos, que constroem suas realidades paralelas e se retroalimentam. Há espaço para as amplas avenidas da democracia e da diversidade, no caminho de novas relações políticas, econômicas e sociais, culturais e ambientais nos planos nacional e internacional, nos blocos continentais e regionais existentes envolvendo países e organizações governamentais e não governamentais, democratizando as relações internacionais em prol desta almejada sustentabilidade mundial e nacional, tendo a democracia e a paz como fundamentos estruturantes desta construção.

A tecelagem de uma alternativa democrática às crises política, econômica, social a nível internacional e em cada sociedade nacional é o desafio de trabalhar a unidade das forças democráticas, dialogando com a cidadania, com o mundo do trabalho e da cultura no caminho da sustentabilidade política, econômica, social e ambiental almejada.            

Assim, as opções entre a democracia e a barbárie continuam postas nos desafios e dilemas enfrentados atualmente pela sociedade brasileira e mundial.  A questão democrática se impõe como um valor para as sociedades nacionais e a nível mundial nas relações estabelecidas entre a própria sociedade e com a natureza.

Estão na berlinda as condições políticas, econômicas, sociais e culturais construídas desde a primeira revolução industrial e a insustentabilidade da sociedade contemporânea. A almejada sustentabilidade é um processo em curso e em disputa no dia a dia da sociedade, no cotidiano de cada um de nós. A participação da Cidadania é o fundamento desta sustentabilidade almejada e proclamada em Davos.

Portanto, o futuro da Sociedade e da Democracia deve ser trabalhado com uma visão que nos leve à almejada sustentabilidade da humanidade, modificando as atuais relações políticas, econômicas e sociais nos planos nacional e internacional. 

São desafios históricos que continuam atuais na sociedade brasileira e mundial.

*Da Oficina da Cátedra da UNESCO em Sustentabilidade da UFBA e do Conselho do Instituto Politécnico da Bahia

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