Valor Econômico
Metade Centrão, parte bolsonarista e com
DNA do velho PFL, não dá para esperar fidelidade do União Brasil
Na onda de reposicionamento de marcas que
ocorreu na última década entre os partidos brasileiros, saiu a sopa de
letrinhas das siglas que não diziam nada para entrar nomes bonitos que, na
prática, dizem menos ainda. Avante, Cidadania, Novo, Patriota, Podemos,
Progressistas, Rede, Republicanos, Solidariedade, União Brasil: na maioria das
vezes, a postura e a conduta do partido contradizem totalmente a sua
denominação.
Ocupando os noticiários com as negociações
em torno da primeira reforma ministerial de Lula, o União Brasil é símbolo
desses contrassensos entre o nome e sua composição.
Fundado no final de 2021 pela fusão do Democratas (antigo PFL) com o PSL, o União Brasil conta atualmente com 59 deputados (só perde para o PL e o PT) e 9 senadores (atrás apenas de PSD, PL e MDB). Trata-se de uma das maiores forças no Congresso; logo, é natural que tenha sido cortejado por Lula para integrar a sua base desde a promulgação do resultado das urnas.
De olho nos votos mais de 10% dos plenários
da Câmara e do Senado, Lula cedeu ao União Brasil três ministérios na montagem
do primeiro escalão de seu governo. O partido, entretanto, não tem entregue os
votos esperados e pressiona o presidente por mais poder.
Acontece, porém, que o perfil do União
Brasil é muito heterogêneo. E isso dificulta muito as coisas para o governo.
Para começar, apesar de ser resultante da
integração entre DEM e PSL, dos 59 deputados atuais do partido apenas 22
disputaram eleições no ciclo 2018-2020 por esses dois partidos – 16 são
provenientes do DEM e 6 vieram do PSL.
A maioria dos integrantes atuais do União
Brasil migrou para o partido em 2022 atraídos pelo fundo eleitoral – o maior da
disputa passada, turbinado pela expressiva votação de bolsonaristas em 2018,
ano em o ex-presidente concorreu pelo PSL.
Entre os 43
deputados recém-chegados ao União Brasil tem ex-integrantes de 12 partidos, do
PTB ao PC do B. Logo, não dá para esperar coerência ideológica de um partido
tão diverso.
Sob o ponto de vista da senioridade, o
partido tem alguns membros com larga experiência política – raposas como
Mendonça Filho e José Rocha (do velho PFL), Arthur Maia, Fernando Coelho Filho,
Elmar Nascimento e o próprio Luciano Bivar, antigo “dono” do PSL. Nem todos,
porém, têm afinidades com Lula e com o PT.
O União Brasil também conta com 12
deputados que nunca exerceram um mandato político antes, sendo que dez deles
disputaram em 2022 a sua primeira eleição na vida – como é o caso de Rosângela
Moro e de Dayany Bittencourt, esposas, respectivamente, do senador e ex-juiz
Sérgio Moro e do Capitão Wagner, candidato derrotado ao governo do Ceará. São
deputados sem experiência e traquejo com o jogo político.
A análise do perfil dos integrantes do
União Brasil permite enquadrar boa parte de seus membros no Centrão. Assim,
pela sua natureza fisiológica, faz sentido a expectativa do governo de obter um
grau razoável de adesão nas votações mais importantes, mesmo que ao custo da distribuição
de cargos e de verbas públicas.
Essa fidelidade, porém, nunca será total e,
a depender da matéria em votação, tende a ser incerta e em muitos casos,
mínima.
Em primeiro lugar, o União Brasil nunca
oferecerá a Lula 100% de seus votos porque abriga em seus quadros uma
quantidade não razoável de bolsonaristas e antipetistas. Computando todos as votações ocorridas entre 2019 e 2022 na
Câmara, 18 deputados reeleitos do União Bolsonaro seguiram a orientação do
governo Bolsonaro em mais de 90% dos casos. José Rocha, Fábio
Schiochet, Felipe Francischini e Delegado Marcelo Freitas são os líderes neste
quesito, com índices superiores a 95%. Entre os antipetistas, destacam-se Kim
Kataguiri e Mendonça Filho, além das já citadas Rosângela Moro e Dayanny do Capitão.
No âmbito do União Brasil também estão
representadas forças conservadoras que dificilmente se alinharão a Lula em
votações muito progressistas. A frente religiosa no
partido conta com David e Marcos Soares, filhos do pastor RR Soares, além dos
deputados Pastor Diniz e Juninho do Pneu.
Já a bancada da
segurança pública é ainda mais numerosa no União Brasil, destacando-se os
coronéis PM Assis e Ulysses, o promotor Alfredo Gaspar, três policiais civis
(Delegado Matheus Loiola, Dr. Fernando Máximo e Felipe Becari) e do já citado
Nicoletti, policial rodoviário federal.
Como se pode perceber pela composição dos quadros do União Brasil, nem que Lula ceda ao partido o controle de toda a Esplanada dos Ministérios é de se esperar fidelidade de seus integrantes à agenda do governo.
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