Folha de S. Paulo
Autocrata russo tem admiradores tanto na
esquerda como na direita, incluindo Lula e Bolsonaro
Demorou um pouco, mas Lula cumprimentou Vladimir
Putin por sua vitória no
pleito presidencial do último domingo (17), no qual obteve mais de
87% dos votos. O PT foi
além e classificou a eleição como "feito histórico". Outros países
que parabenizaram o autocrata russo são Irã, Venezuela e Coreia do Norte. EUA,
Reino Unido e Alemanha preferiram questionar a lisura do processo eleitoral,
que não foi nem livre nem justo.
Não acho que o Brasil deva se comportar como um vingador justiceiro nas relações internacionais. Esse é um campo em que os interesses do país devem dar a tônica. O Brasil não precisa romper com todas as ditaduras do planeta porque são ditaduras, mas tampouco precisa bajular líderes com amplo histórico de violações de direitos humanos. O pleito russo teria sido uma ótima ocasião para o Brasil permanecer calado.
O que eu gostaria de discutir hoje, porém, é
o caráter meio quântico de Putin. Do mesmo modo que a luz se comporta como onda
e como partícula, o líder russo consegue agradar à direita e à esquerda. Outro
fã de Putin é Jair
Bolsonaro. E o apoio ao ex-espião da KGB é possivelmente o único
ponto de concórdia entre o ex e o atual presidentes do Brasil.
Não tenho dificuldade em entender por que a
direita gosta de Putin que, afinal, é claramente de direita: autoritário,
chauvinista e antiglobalista, com pitadas de religião. O amor da esquerda pelo
autocrata é mais intrigante. Moscou desafia os EUA e, para muitos na esquerda,
isso é razão suficiente para aplausos.
Talvez haja também um elemento inercial, pois
há quem veja a Rússia como
sucessora da URSS. Mas é preciso muita miopia para não perceber que Putin é não
só um arquiconservador como também um que, ao lançar-se numa guerra de
agressão contra a Ucrânia, reduziu a pó os avanços no
multilateralismo obtidos após o fim da Guerra Fria.
É a esquerda, e não a direita, que precisa
atualizar suas crenças.
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