Correio Braziliense
Segundo as normas do TSE, o uso de
inteligência artificial deve estar explicitado nas campanhas políticas. A lei
proíbe o uso de IA para a criação de conteúdo falso
Com objetivo de debater a regulamentação do uso de inteligência artificial (IA) nas eleições de 2026, o Cidadania exibiu, nestas terça e quarta-feiras, em cadeia nacional de tevê, o programa oficial do partido editado 100% com uso de IA, o que chamou a atenção e causou controvérsia nas redes sociais. A inserção exibe pessoas pedindo trabalho digno, educação e saúde de qualidade e um país mais justo e democrático. Todos os personagens que aparecem na propaganda são fictícios, mas correspondem ao mosaico étnico, social e etário da população. Não fosse o uso de IA assumido pelo partido no próprio vídeo exibido, isso passaria praticamente despercebido.
"Nosso objetivo é propor o debate sobre
a necessidade de regulamentar o uso de inteligência artificial (IA) pelos
partidos políticos no processo eleitoral de 2026. O uso desse recurso já está
se generalizando na disputa política pelas redes sociais, mas de maneira muito
negativa, porque está sendo empregada para a produção de fake news e
disseminação da narrativa do ódio. O que quisemos mostrar é que a IA pode ser
usada para o bem e não para o mal", disse o presidente do Cidadania, Comte
Bittencourt.
A equipe de marketing que concebeu e produziu
o programa utilizou diversas ferramentas de inteligência artificial, entre as
quais, o Midjourney, o Runway, o HeyGen, o Suno e o ElevenLabs. Segundo o
presidente do Cidadania, já houve avanços na regulamentação pelo Tribunal
Superior Eleitoral (TSE), "mas é um tema que precisa ser mais
regulamentado e discutido pelas instâncias que decidem a matéria. Não é
cerceamento, é o devido cuidado", completou.
Segundo as normas do TSE, o uso de
inteligência artificial deve estar explicitado nas campanhas políticas. A lei
proíbe o uso de IA para a criação de conteúdo falso, os chamados deep fake. Com
a tecnologia disponível, é possível até mesmo exibir a propaganda de todos os
candidatos sem que eles tenham feito gravações. Nas redes sociais, houve
questionamentos à decisão do Cidadania, o primeiro partido a fazer um programa
100% com inteligência artificial e assumir essa responsabilidade.
O Cidadania é o antigo Partido Popular
Socialista (PPS), que mudou de nome em 2019. A legenda busca reconstruir sua
identidade após romper a federação com o PSDB, mas somente poderá formalizar
essa decisão em maio de 2026, segundo a legislação vigente. Para se posicionar
como "partido da democracia", a legenda promoveu, no último dia 15 de
março, no Panteão da Pátria, na Praça dos Três Poderes, em Brasília, um grande
seminário sobre conquistas, dívidas e desafios desses 40 anos de democratização.
Na ocasião, o ex-presidente José Sarney e alguns constituintes foram
homenageados. O Correio Braziliense apoiou e deu ampla cobertura ao evento.
Combate às fake news
O uso de inteligência artificial é um campo
da ciência da computação que desenvolve sistemas capazes de simular a
inteligência humana e cumprir tarefas como o aprendizado, por meio de dados e
experiências; o raciocínio, com resolução de problemas e tomada de decisões; a
percepção e a interpretação de imagens, sons e textos; e a interação pessoal:
conversar e desenvolver a linguagem natural.
O uso de inteligência artificial em campanhas
eleitorais está se generalizando. Segmenta o eleitorado a partir da
identificação de padrões de comportamento, preferências e preocupações dos
eleitores, o que possibilita criar mensagens personalizadas para diferentes
grupos (microtargeting). Também pode gerar textos, imagens, vídeos e discursos
personalizados nas redes sociais, com produção em massa, em tempo real, de
peças de propaganda sob medida para os diferentes públicos.
Ferramentas com IA rastreiam o que os
eleitores estão dizendo nas redes, identificam crises, analisam sentimento
(positivo/negativo) e ajudam na estratégia de reação rápida. Com isso, é
possível simular diferentes cenários de campanha, prever resultados com base em
dados históricos e pesquisas e ajustar estratégias em tempo real. Entretanto,
toda essa tecnologia também está sendo usada para espalhar fake news, criar
deepfake (vídeos falsos realistas), manipular imagens e disseminar boatos com
aparência de verdade.
No Brasil, o Partido dos Trabalhadores (PT)
utilizou inteligência artificial na campanha do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, para análise de dados, monitoramento de redes sociais, chatbots e
sistemas automatizados para interagir com o público e rebater fake news. Também
houve uso de geração de conteúdo automatizado para posts segmentados nas redes.
O Partido Liberal (PL) fez a mesma coisa na
campanha do ex-presidente Jair Bolsonaro, porém, sem o impacto avassalador que
o uso de redes sociais teve nas eleições de 2018. Houve utilização intensa de
redes sociais e vídeos virais, com apoio de softwares de monitoramento e
distribuição automatizada de conteúdo. Entretanto, as suspeitas de uso de IA e
robôs para impulsionar mensagens e manipular algoritmos de plataformas não
foram comprovadas.
O divisor de águas do uso de inteligência artificial nas eleições foi a campanha de Donald Trump de 2016, na qual a empresa Cambridge Analytica analisou perfis de milhões de eleitores. Na Índia, o Partido Bharatiya Janata (BJP) utilizou IA na campanha de Narendra Modi, assim como, no Reino Unido, o Partido Conservador recorreu a essa tecnologia na campanha do Brexit (a saída da União Europeia).
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