DEU NA FOLHA DE S. PAULO
Ao criticar a criação de uma comissão da verdade, FHC pede que se esqueça o que ele fez
A expressão "vivandeira" veio do marechal Humberto Castello Branco, há 45 anos, no alvorecer da anarquia militar que baixou sobre o Brasil a treva de 21 anos de ditadura. Referindo-se aos políticos civis que iam aos quartéis para buscar conchavos com a oficialidade, ele disse:
"Eu os identifico a todos. São muitos deles os mesmos que, desde 1930, como vivandeiras alvoroçadas, vêm aos bivaques bolir com os granadeiros e provocar extravagâncias ao Poder Militar".
Desde o início da controvérsia provocada pelo Programa Nacional de Direitos Humanos, sentia-se o perfume da sedução tucana pelo flerte com a figura abstrata dos militares aborrecidos com a ideia de esclarecer a responsabilidade por crimes praticados durante a ditadura. Uma palavrinha aqui, outra ali, coisa cautelosa para uma corrente política que pretende levar à Presidência da República o governador José Serra, que pagou com 15 anos de exílio o crime de ter presidido a UNE. Serra e os grão-tucanos conhecem um documento de 1973, preparado pela meganha enquanto ele estava preso ou asilado no Chile. A peça vale por uma anotação manuscrita: "Esta é a súmula do que existe sobre o fulano. Como vês, trata-se de "boa gente" que bem merece ser "tratado" pelos chilenos". A rubrica do autor parece ter três letras. (Ao menos cinco brasileiros foram "tratados" pelos chilenos nas semanas seguintes ao golpe do general Pinochet.) Será que Serra não tem curiosidade de saber quem queria "tratá-lo"?
A vivandagem tucana explicitou-se numa entrevista do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso ao repórter Gary Duffy. No seu melhor estilo, disse a coisa e seu contrário.
Referindo-se aos itens do programa de direitos humanos que cuidam do estabelecimento de uma comissão da verdade, o ex-presidente afirmou o seguinte:
"Este não é um assunto político no Brasil, mas uma questão de direitos humanos, o que para mim é importante, mas o perigo é transformar isso em um assunto político".
Assunto político, o desaparecimento de pessoas jamais deixará de ser. Não há como dizer que seja um tema climático. O ex-presidente foi adiante e viu na iniciativa de investigar os crimes do Estado um fator de "intranquilidade entre as Forças Armadas".
Pode vir a ser um fator de indisciplina. "Intranquilidade entre as Forças Armadas", só se fosse uma ameaça às fronteiras nacionais ou às reservas de petróleo do mar territorial. Fernando Henrique Cardoso já sentiu o gosto amargo da vivandagem quando ampliou a Lei da Anistia e reconheceu a prática, pelo Estado, dos crimes da ditadura. Nesse sentido, na busca da verdade e da compensação das vítimas (reais) da ditadura, deve-se mais a ele e a tucanos como José Gregori do que a Lula e a organizadores de eventos como Tarso Genro e Paulo Vannuchi.
Não se reconhece em Fernando Henrique Cardoso do ano eleitoral de 2010 o presidente de 1995 a 2002. Muito menos o militante das causas democráticas, visto pela tigrada como um "marxista violentíssimo". Felizmente, pode-se garantir que FHC não sentou praça na tropa da ditadura.
Ao criticar a criação de uma comissão da verdade, FHC pede que se esqueça o que ele fez
A expressão "vivandeira" veio do marechal Humberto Castello Branco, há 45 anos, no alvorecer da anarquia militar que baixou sobre o Brasil a treva de 21 anos de ditadura. Referindo-se aos políticos civis que iam aos quartéis para buscar conchavos com a oficialidade, ele disse:
"Eu os identifico a todos. São muitos deles os mesmos que, desde 1930, como vivandeiras alvoroçadas, vêm aos bivaques bolir com os granadeiros e provocar extravagâncias ao Poder Militar".
Desde o início da controvérsia provocada pelo Programa Nacional de Direitos Humanos, sentia-se o perfume da sedução tucana pelo flerte com a figura abstrata dos militares aborrecidos com a ideia de esclarecer a responsabilidade por crimes praticados durante a ditadura. Uma palavrinha aqui, outra ali, coisa cautelosa para uma corrente política que pretende levar à Presidência da República o governador José Serra, que pagou com 15 anos de exílio o crime de ter presidido a UNE. Serra e os grão-tucanos conhecem um documento de 1973, preparado pela meganha enquanto ele estava preso ou asilado no Chile. A peça vale por uma anotação manuscrita: "Esta é a súmula do que existe sobre o fulano. Como vês, trata-se de "boa gente" que bem merece ser "tratado" pelos chilenos". A rubrica do autor parece ter três letras. (Ao menos cinco brasileiros foram "tratados" pelos chilenos nas semanas seguintes ao golpe do general Pinochet.) Será que Serra não tem curiosidade de saber quem queria "tratá-lo"?
A vivandagem tucana explicitou-se numa entrevista do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso ao repórter Gary Duffy. No seu melhor estilo, disse a coisa e seu contrário.
Referindo-se aos itens do programa de direitos humanos que cuidam do estabelecimento de uma comissão da verdade, o ex-presidente afirmou o seguinte:
"Este não é um assunto político no Brasil, mas uma questão de direitos humanos, o que para mim é importante, mas o perigo é transformar isso em um assunto político".
Assunto político, o desaparecimento de pessoas jamais deixará de ser. Não há como dizer que seja um tema climático. O ex-presidente foi adiante e viu na iniciativa de investigar os crimes do Estado um fator de "intranquilidade entre as Forças Armadas".
Pode vir a ser um fator de indisciplina. "Intranquilidade entre as Forças Armadas", só se fosse uma ameaça às fronteiras nacionais ou às reservas de petróleo do mar territorial. Fernando Henrique Cardoso já sentiu o gosto amargo da vivandagem quando ampliou a Lei da Anistia e reconheceu a prática, pelo Estado, dos crimes da ditadura. Nesse sentido, na busca da verdade e da compensação das vítimas (reais) da ditadura, deve-se mais a ele e a tucanos como José Gregori do que a Lula e a organizadores de eventos como Tarso Genro e Paulo Vannuchi.
Não se reconhece em Fernando Henrique Cardoso do ano eleitoral de 2010 o presidente de 1995 a 2002. Muito menos o militante das causas democráticas, visto pela tigrada como um "marxista violentíssimo". Felizmente, pode-se garantir que FHC não sentou praça na tropa da ditadura.
Infelizmente, podendo mostrar pelo exemplo que há uma diferença entre os tucanos e as vivandeiras, escolheu o cálice do oportunismo.
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